Homilia do Padre Matheus Pigozzo – Solenidade do Natal do Senhor – 2023

“O povo que andava nas trevas viu uma grande luz.” (Is 9,1). Assim inicia a Liturgia da Palavra da Missa da noite de Natal. O Natal, a solenidade do nascimento de Jesus, o Salvador, é a festa da luz! Ele mesmo, na sua pregação dirá “Eu sou a luz do mundo!” (Jo 8,12). Os enfeites luminosos de Natal com os quais enfeitamos, por costume, nossas casas também são um símbolo disso – a luz veio ao mundo.

Para entendermos a grandiosidade da luz precisamos ver o terror da escuridão. Só sentimos a importância da lâmpada acesa quando a energia acaba, não é verdade? O profeta diz que essa escuridão é algo trágico: “para os que habitavam na sombra da morte, uma luz resplandeceu.” (Is 9,1). Trevas são morte. Essa escuridão, e é isso que precisamos compreender, não é um fato exterior ao homem. Jesus não vem como uma luz de um poste da praça, Ele vem como luz do ser humano. A humanidade sem Deus habita na região da morte! A situação que o pecado colocou o homem é de oposição à luz. A oração do início da Missa faz o padre dizer ao Pai do céu: “Ó Deus que fizeste resplandecer esta noite santíssima…” Queridos irmãos, esta noite não significa só o céu escuro, mas, de algum modo, nós, humanidade sem comunhão com Deus. O estado da humanidade antes de Cristo era de escuridão e morte, esse também é o estado da alma em pecado. Sem Deus o fim é morte, sem Deus, sem estar em comunhão com sua luz, somos trevas, somos maus e sem rumo, e mesmo que materialmente pareça tudo bem e estável, divertido e cômodo, estamos sem rumo e sem vida verdadeira. A falta da consciência do horror que é o pecado e a escuridão interior que é a ausência de Deus, podem fazer com que o homem não valorize a luz. Nossa época é marcada pela falta de senso do pecado. O mal tem sido exaltado, aplaudido e ensinado, as trevas parecem dominar e ganhar espaço, parecem intransponíveis e insuperáveis. A versão do homem em sua maldade e orgulho parece ser a vitoriosa e justa.

Mas, queridos irmãos, se olhamos para as trevas não é para desanimarmos, é para nos maravilharmos com a luz! O povo que andava nas trevas viu uma grande luz! Deus não deixou o homem entregue ao mal. O Evangelho da Missa do dia de Natal diz que “a luz veio para os seus, mas os seus não o acolheram.” (Cf. Jo 1,11). Apesar do poder das trevas e do fechamento dos corações, Deus que não nos trata como exigem nossas faltas, e nos ama, rompe o aparente poder do mal, atravessa a suposta onipotência da sombra da morte e vem nos abrir a possibilidade de ver a luz, de comungar a luz! Como é interessante ver na cena do Natal, narrada pelos Evangelhos, que frente aos exércitos de Herodes, às fechaduras esnobes das hospedarias lotadas e às condições desfavoráveis de clima, tempo e espaço, Deus reina, o Príncipe da Paz chega (Cf. Is 9), Ele vem frágil precisado de colo, seus mantos reais são faixais que trouxe Maria, sua guarda é José, sua corte os pobres pastores e os estrangeiros Magos. Deus desce manso, afável, pequeno para convidar-nos a seu amor salvador. Ele vence nossa escuridão e orgulho, nossa ilusão de sermos poderosos e autossuficientes com sua pobreza, humildade e frágil dependência. Ele não quer nos deixar nas sombras da morte. Mesmo que não percebamos a escuridão que nos metemos, Ele, nos amou por primeiro (Cf. 1Jo 4,19).

“Ah! Se rompesses os céus e descesses! As montanhas se desmanchariam diante de ti.” (Is 63,19b). A profecia escutada no início do Advento se cumpriu. Ele rompeu o céu, atravessou nossa escuridão para nos encontrar! Desmanchemos as montanhas, o orgulho, para O acolhermos. São Paulo na segunda leitura da Missa da noite santa parece dar-nos o caminho para acolhermos a luz, diz que Jesus Cristo, “nos ensinou a abandonar a impiedade e as paixões mundanas” (Cf. Tt 2). O abaixamento de Deus, o seu esvaziamento para chegar até nós, para nos comunicar sua luz, é um convite do Rei a sairmos da podridão, do vazio e do escuro para adentrar em sua luz restauradora e impressionante. Deixar a luz entrar é, consequentemente, fazer a escuridão sair. O menino singelo, da manjedoura, ergue os braços para que O acolhamos, “um menino nos foi dado.” (Is 9), nasceu, para nós, um Salvador, como diz o responsório da Missa do dia de Natal. Abramo-nos à luz, não nos acostumemos com as trevas! Deus vem para nos resgatar, não achemos que estamos seguros sem Ele, sem unidade verdadeira com sua doutrina. Entremos em sua luz!

Hoje, ao olhamos de modo mais fixo o presépio, deve nos chamar atenção as figuras de Maria e José, eles são modelos de abertura total a Deus. N. Senhora e S. José mostram sua docilidade sendo entregues à providência, se deixando conduzir, confiando, obedecendo. Fé é obediência! Por estarmos acostumados com as trevas, muitas vezes se abrir à luz parece mais inseguro, menos sensato e garantido, mas se obedecermos ao Rei da manjedoura, sentiremos seu afago e, um dia, envoltos em sua luz, viveremos no Reino eterno onde qualquer sombra da morte já foi superada e a fragilidade foi mudada em onipotência.

Que N. Senhora e S. José nos ajudem a nos aproximarmos da gruta, e escutarmos acolhendo o convite de Jesus – “vinde, eu sou a luz do mundo.” Amém!

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