Homilia de D. Anselmo Chagas de Paiva, OSB – Assunção de Nossa Senhora

ASSUNÇÃO DE NOSSA SENHORA

Lc 1,39-56

Caros irmãos e irmãs

Celebramos neste domingo a Solenidade da Assunção da Virgem Maria em corpo e alma à glória do Paraíso. Este também é o destino que todos nós almejamos, é o destino dos filhos adotivos de Deus e membros do Corpo de Cristo. Assim como Maria, nós também somos chamados a participar plenamente na vitória do Senhor sobre o pecado e a morte e a reinar com Ele no seu Reino eterno.

O dogma da Assunção da Virgem Maria foi proclamado pelo Papa Pio XII no dia 1º de novembro de 1950, sendo instituída esta celebração para o dia 15 de agosto, mas, por razões pastorais, no Brasil esta Solenidade é transferida para o domingo seguinte. Na sua Constituição Apostólica “Munificientissimus Deus”, o Papa Pio XII proclamava como dogma que a Virgem Maria, “concluindo o curso da vida terrena, foi elevada à glória celeste em alma e corpo”. Esta verdade de fé era conhecida pela Tradição, afirmada pelos Padres da Igreja, e representava um aspecto relevante do culto prestado à Mãe de Cristo.  Com esta proclamação, temos, de forma dogmática, aquilo que já tinha sido celebrado no culto e na devoção do Povo de Deus, como a mais elevada e estável glorificação de Maria.

Assim como aconteceu com o Cristo, Maria venceu a morte e já triunfa na glória celeste, na totalidade do seu ser, “de corpo e alma”.  É preciso lembrar, aqui, que somente Jesus e Maria subiram ao céu, de corpo e alma. Os santos estão lá apenas com suas almas, pois os corpos estão na terra, aguardando a ressurreição do último dia. Maria, ao contrário, foi elevada ao céu também com seu corpo já ressuscitado.

Como Maria não teve na alma a mancha do pecado original, ficou isenta da dura sentença dada aos demais: “És pó e ao pó hás de retornar” (Gn 3,19). A nós que herdamos o pecado original, é preciso voltar ao pó da terra de onde saímos, para que na ressurreição do último dia, o Senhor nos refaça sem as sequelas do mal. Maria não esteve sujeita ao poder do pecado para poder ser a Mãe de Deus, também não podia ficar sob o império da morte; pois, como disse São Paulo, “o salário do pecado é a morte” (Rm 6,23).

Assim, Maria não experimentou a corrupção da carne, mas foi glorificada em sua alma e seu corpo. Jesus tem a mesma carne de Maria, por isto, ela devia ter a mesma glória do seu divino Filho. Era necessário, como afirmam os Padres da Igreja, que aquela que no parto havia conservado íntegra a sua virgindade, conservasse o seu corpo sem corrupção, também após a morte.

Com a Assunção da Virgem Maria aos céus, temos o êxito final daqueles “que escutam a Palavra de Deus e a colocam em prática” (Lc 11,28). Nesta perspectiva, a solenidade da Assunção de Maria, constitui um estímulo providencial para meditar sobre a altíssima dignidade de cada ser humano, também na sua dimensão corpórea. Trata-se de uma reflexão que se insere muito bem na vida de cada cristão. 

Por lei natural, os corpos de seres humanos se decompõem após a morte e só no último dia cada corpo irá juntar-se com sua própria alma. Todos serão ressuscitados, tanto aqueles que praticaram o mal, como aqueles que fizeram o bem. Será a “ressurreição da carne”, como rezamos no Credo. Contudo, alguns virão para uma ressurreição de vida e outros ressuscitados para a condenação (cf. Jo 5,29). Nossos corpos ressuscitados serão nossos próprios corpos, mas em um novo estado: imortal, sem defeito, não mais corrupto, nem doente, sem envelhecer, pois estaremos na dimensão gloriosa.  É o que chamamos de imortalidade.

A Assunção de Maria é um acontecimento que nos interessa de perto, precisamente porque cada homem é destinado a morrer. Todavia, a morte não é a última palavra, pois, como ressalta São Paulo: “O último inimigo a ser destruído será a morte” (1Cor 15,26). A morte torna-se uma passagem para a vida, é a passagem para a bem-aventurança celestial, reservada a quantos se empenham em prol da verdade e da justiça, esforçando-se por seguir a Cristo.

Lançando um olhar para a liturgia da Palavra, somos chamados a contemplar a Mulher revestida de sol, resplandecente de luz, tendo a lua debaixo dos pés e sobre a cabeça uma coroa de doze estrelas. Nela resplandece a vitória de Cristo sobre o maligno, representado na linguagem apocalíptica como um “grande dragão vermelho” (Ap 12,1.3), conforme nos diz a primeira leitura. 

O Evangelho, por sua vez, nos convida a estar no limiar da casa de Zacarias, onde chega Maria para estar com a sua prima Isabel, levando consigo o mistério de Deus que se fez homem no seu seio e vem para partilhar com ela a sua própria alegria.  E, nesse instante, do fundo da intimidade de Maria, do fundo do seu silêncio, brota aquele cântico que exprime toda a verdade do grande Mistério. É o cântico do Magnificat que anuncia a história da salvação e manifesta o coração da Mãe: “A minha alma glorifica ao Senhor…” (Lc 1,46). 

E nesta poesia, a Virgem Maria, inspirada pelo Espírito Santo, ainda diz profeticamente: “Doravante, todas as gerações me chamarão bem-aventurada” (Lc 1,48). Trata-se de uma profecia para toda a história da Igreja. Esta expressão do Magnificat, mencionada pelo evangelista São Lucas, indica que o louvor à Virgem Santa, Mãe de Deus, intimamente unida a Cristo seu Filho, diz respeito à Igreja de todos os tempos e de todos os lugares. Isto também pressupõe que a glorificação de Maria já estava presente desde os tempos mais remotos. As palavras de Maria expressam o dever da Igreja de recordar a sua grandeza e, por conseguinte, esta solenidade é um convite a louvar o Senhor e a contemplar a importância de Nossa Senhora na História da Salvação, porque, através dela o verbo de Deus se fez carne e veio habitar entre nós (cf. Jo 1,14).

As palavras do Magnificat são como o testamento espiritual da Virgem Mãe. Com razão, portanto, elas constituem a herança daqueles que, ao reconhecerem-se seus filhos, decidem acolhê-la na própria casa, como fez o apóstolo João, que a recebeu como Mãe diretamente de Jesus, aos pés da cruz (cf. Jo 19,27). 

Nesta solenidade da Assunção, lancemos o nosso olhar para Maria, pois ela nos abre à esperança, a um futuro cheio de alegria e nos ensina o caminho para acolher o seu Filho na fé, sem nunca perder a amizade com Ele, sendo sempre iluminados e orientados pela Sua palavra. Maria nos convida a segui-lo todos os dias, mesmo nos momentos em que sentirmos que as nossas cruzes se tornam pesadas. 

Que a Virgem da Glória interceda sempre por nós e nos ajude a viver no caminho do bem, sendo quotidianamente fortalecidos na fé e na esperança da vida eterna.  Assim seja.

Anselmo Chagas de Paiva, OSB

Mosteiro de São Bento/RJ

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