Escutar no silêncio
“Vejam se vocês são as suas ovelhas, vejam se o conhecem”. Assim exortava São Gregório Magno numa homilia. Depois o mesmo Papa e Santo continuava dizendo que há duas maneiras de conhecer: pela fé e pelo amor, pela inteligência iluminada pela fé e pelo coração aquecido pela caridade.
O conhecimento que vem da fé diz respeito a verdades como a existência de um só Deus em três Pessoas realmente distintas: Pai e Filho e Espírito Santo; a encarnação do Filho de Deus, ou seja, o fato do Filho, a segunda Pessoa da Santíssima Trindade, ter se tornado homem por obra do Espírito Santo nas entranhas puríssimas da Virgem Maria para a nossa salvação; a vinda gloriosa de Jesus Cristo na consumação dos tempos, chamada Parusia; entre outras verdades. Mais a fé não é só um conhecimento intelectual, em primeiro lugar ela é uma entrega amorosa de todo nosso ser a Deus porque ele se mostra como é, Amor, porque a sua Palavra arrebatou o nosso coração, porque percebemos que não podemos ser felizes longe dele. A fé e o amor são virtudes que vão, portanto, juntas.
No entanto, enquanto o conhecimento que vem da fé se encontra mais relacionado com a nossa inteligência, o conhecimento que vem do amor eleva a nossa vontade, o nosso querer. Humanamente falando, quando nós sentimos alguma simpatia por uma determinada pessoa é muito mais fácil conhecê-la e saber por intuição aquilo que ela deseja. Uma mãe, por exemplo, sem estudar medicina, é capaz de detectar uma dor de ouvido do seu filhinho de poucos meses que não fala e apenas chora. As mães têm um amor que intui, elas sabem que quando a criança chora ou quer comer ou mamar ou tem alguma dor. Nós também, quando amamos a Deus, temos-lhe simpatia, sabemos por co-naturalidade o que ele quer de nós, qual é a sua vontade para a nossa vida. Nós também intuímos aquilo que Deus quer que façamos.
Agora podemos voltar às palavras de São Gregório: Será que nós somos, de fato, as suas ovelhas? Nós escutamos na passagem do Evangelho de hoje: “As minhas ovelhas ouvem a minha voz, eu as conheço e elas me seguem” (Jo 10, 27). Jesus Cristo, Bom Pastor, conhece a cada um de nós pelo nome, ele sabe o que há de mais íntimo em cada um de nós e que nem nós mesmos chegamos a conhecer. O conhecimento que Jesus tem de cada um de nós é perfeito. Nós, ao contrário, não o conhecemos perfeitamente. O que fazer? Ouvir a voz do Pastor e segui-lo!
É preciso ouvir! Mas, há tanto barulho ao nosso redor! Por outro lado, por mais que admiremos o silêncio, quando temos oportunidade de fazer um pouco de silêncio, fazemo-lo com música. Que pena! Há pessoas que não podem estar sequer cinco minutos em silêncio. Você já observou como algumas pessoas ficam inquietas quando o sacerdote guarda uns minutinhos de silêncio depois da proclamação do Evangelho ou depois da homilia, outras não sabem o que fazer na ação de graças depois da comunhão caso não haja um canto. O silêncio às vezes parece que nos incomoda! Outra coisa: você já notou que às vezes numa discussão todo mundo está de acordo, mas não se entende? Finalmente, quando chega alguém e diz que todos estão dizendo a mesma coisa e que a única diferença está na ordem dos fatores, então talvez alguns percebam que o problema é que eles não se escutavam.
Nós queremos seguir o Senhor e fazer a sua vontade. Não a realizaremos, porém, se não o escutarmos atenciosamente. Como? Com alguns propósitos concretos: escutar atentamente as leituras da Missa e a homilia, ler a Sagrada Escritura procurando entendê-la, evitar tanto barulho quando possível, fazer uns minutinhos de oração mental todos os dias. A oração mental não é nenhum bicho de sete cabeças, basta ler um trecho do Evangelho, por exemplo, e depois ficar uns minutinhos em silêncio conversando com Deus: pense naquela passagem, imagine-a, converse com Jesus sobre a cena do Evangelho, sobre a sua vida e a dos seus amigos, escute-o já que ele nos fala nesses momentos. Uma outra coisa: se soubermos escutar, também descobriremos a voz de Deus nas circunstâncias mais ordinárias da nossa vida: você vai ver como ele vai pedir que a sua ajuda para animar aquele companheiro de trabalho que está triste, para conversar um pouco com aquela pessoa que ninguém dá atenção, para sorrir para aquela outra que parece que está sempre amargurada. Esse conhecimento vem da fé e do amor; efetivamente, a fé atua pela caridade (cf. Gl 5,6).
Pe. Françoá Costa