Homilia do D. Henrique Soares da Costa – II Domingo da Quaresma – Ano A

Gn 12,1-4a
Sl 32
2Tm 1,8b-10
Mt 17,1-9

No Domingo passado, primeiro da Quaresma, meditamos sobre as tentações de Jesus. O Cristo Senhor no deserto, lutando contra o Diabo, convidava-nos ao combate espiritual, próprio do deserto quaresmal. Sim, porque é isso que o tempo santo que estamos vivendo deseja ser: tempo de retiro no deserto do coração para combater nossos demônios interiores e, pela oração, a penitência, a caridade fraterna, a escuta da Palavra de Deus e a reconciliação sacramental, caminharmos para a santa Páscoa. Este é o caminho para cada um de nós, este o caminho da inteira Igreja peregrina!

Na liturgia deste hoje, ladeado por Moisés e Elias, que também enfrentaram durante quarenta dias e quarenta noites o combate no deserto para experimentarem o fulgor da Glória de Deus, Jesus nos mostra qual a finalidade do nosso caminho quaresmal, Jesus nos revela aonde nos leva nosso combate espiritual. Qual o objetivo? Qual a finalidade? Ei-los: celebrar com Ele a Sua Páscoa, sendo com Ele transfigurados em Glória! Nosso objetivo, nosso escopo, o feliz e gozoso fim do nosso caminho é o Cristo envolto na Sua Glória pascal que nos transfigura também a nós!

Mais que Moisés e Elias, nós seremos envolvidos da glória de Cristo, aquela glória que é o Espírito Santo que o Pai derramou sobre Ele na Sua Ressurreição! Passaremos, portanto, do roxo quaresmal, tão sóbrio, para o esfuziante branco pascal, sinal da Glória e da imortalidade, transfigurados em Jesus e por Jesus, o Homem perfeito, modelo de todo ser humano que vem a este mundo.

Um dia, meus caros em Cristo, passaremos do roxo das lágrimas desta vida, para o branco da Glória eterna dos que, revestidos da Glória do Cordeiro, haverão de segui-Lo para sempre! De Quaresma em Quaresma e de Páscoa em Páscoa, passaremos da Quaresma deste mundo para a Páscoa da Glória eterna!

Mas, detenhamo-nos um pouco no Tabor do Evangelho hodierno. Ele é prenúncio, uma misteriosa antecipação da Ressurreição.

Com Sua bendita Transfiguração, Jesus nosso Senhor deseja preparar os Seus para as dores da Paixão – do mesmo modo que a Igreja nos deseja alentar e motivar para as renúncias e observâncias quaresmais. Por isso mesmo, Pedro, Tiago e João, os três que estão no Tabor, são os mesmos que estarão no Jardim das Oliveiras. Por isso também o Evangelho de hoje termina com uma alusão à Ressurreição de Jesus dentre os mortos e, o relato da transfiguração em Lucas afirma que “Jesus falava de Sua partida que iria consumar-se em Jerusalém”  (Lc 9,30).

Eis: Moisés e Elias, a Lei e os Profetas dão testemunho da Paixão do Senhor: tudo estava no misterioso desígnio de Deus! Após a Ressurreição, isto ficará claro: “’Não era necessário que o Cristo sofresse tudo isso para entrar na sua glória?’ E, começando por Moisés e passando por todos os Profetas, explicou-lhes em todas as Escrituras, as passagens que se referiam a Ele”  (Lc 24,26-27). Eis que mistério: a Lei (Moisés) e os Profetas (Elias) dão testemunho de Jesus e aparecem iluminados por Ele. Somente Nele, na luz da Sua Cruz e Ressurreição, o Antigo Testamento encontra sua plenitude e sua luz!

Sendo assim, levantemo-nos! Tomemos, generosos, nosso caminho quaresmal! Também nós somos chamados, como nosso Pai Abraão o foi, a sair: sair de nós mesmos, sair de nós velhos para nós renovados, transfigurados à imagem do Cristo Jesus! Tenhamos a coragem de atravessar o deserto interior, enfrentar o deserto do nosso coração, como Moisés e Elias, como o Povo de Israel, como o próprio Senhor Jesus, que por nós quis ser tentado no Seu período de deserto! Somente assim chegaremos renovados e purificados ao nosso destino. Este destino não é um lugar, mas uma situação, uma realidade: é o homem novo, transfigurado à imagem do Cristo que, após o tormento imenso da Cruz, foi glorificado pelo Espírito do Pai.

Eis o caminho quaresmal: do homem velho ao homem novo, do pecado à graça, do vício à virtude, da preguiça espiritual à generosidade, da morte à Vida, da tristeza à alegria, trazendo em nós, na nossa vida, o reflexo da Glória do próprio Cristo Jesus! Não é este o significado das palavras de São Paulo, na segunda leitura de hoje? Sofre comigo pelo Evangelho. Deus nos salvou e nos chamou a uma vocação santa… em virtude da graça que nos foi dada em Jesus Cristo. Esta graça foi revelada agora, pela manifestação de nosso Salvador, Jesus Cristo. Ele não só destruiu a Morte, como também fez brilhar a Vida e a imortalidade”. Eis! Os sofrimentos e lutas desta vida não são pesados se compararmos com o objetivo tão alto que nos preparam (2Cor 4,17)!

Caríssimos, que as práticas quaresmais, vividas com generosa fidelidade, arrancando o pecado que nos torna opacos, possam revelar em nós o resplendor da Glória de Cristo a que somos chamados e que já está presente em nós desde o nosso Batismo!

Mais ainda: que a novidade de nossa vida transborde para o mundo, que tanto tem necessidade do testemunho dos cristãos. Nunca esqueçamos: este mundo mergulhado na violência (violência da injustiça, violência do desrespeito à dignidade humana, violência da destruição das famílias, violência da fome, violência dos atentados à paz, violência das drogas e das mentiras, violência da corrupção, violência da imoralidade, violência da destruição do reto sentido da sexualidade, violência dos meios de comunicação, violência de minorias organizadas e tirânicas que desejam impor sua visão e sua agenda nefasta, violência da negação de Deus)… Este mundo precisa de nosso testemunho e de nossa palavra, mesmo quando nos rejeita, quando despreza o nome de Cristo, quando deseja esquecer o seu Senhor e pisar os valores do Evangelho!

Deixemo-nos, portanto, transfigurar pelo Senhor e sejamos humilde e forte luz para o mundo! Como pede a oração inicial da Missa hodierna: Senhor, “que purificado o olhar da nossa fé, nos alegremos com a visão da Vossa Glória!”. Por Cristo, nosso único Senhor

Dom Henrique Soares da Costa

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