Solenidade da Epifania do Senhor – Ano B – Homilia do D. Anselmo Chagas de Paiva

SOLENIDADE DA EPIFANIA DO SENHOR

Mt 2,1-12

 

Caros irmãos e irmãs,

 

Celebramos neste domingo a Solenidade da Epifania do Senhor, o mistério da manifestação do Senhor a todas as nações, representadas pelos Magos, conhecidos, segundo a tradição, com os nomes de Melchior, Gaspar e Baltasar. Eles vieram do Oriente para adorar o Rei dos Judeus (cf. Mt 2,1-2). O Evangelista São Mateus, que narra o acontecimento, ressalta como eles chegaram a Jerusalém seguindo uma estrela, vista surgir e interpretada como sinal do nascimento do Rei anunciado pelos profetas, isto é, o Messias. Mas, tendo chegado a Jerusalém, os Magos precisaram das indicações dos sacerdotes e dos escribas para conhecer exatamente o lugar aonde ir, isto é, Belém, a cidade de David (cf. Mt 2,5-6; Mq 5,1). A estrela e a Sagrada Escritura foram as duas luzes que guiaram o caminho dos Magos, os quais são para nós modelos dos autênticos pesquisadores da verdade.

 

O itinerário seguido pelos Magos reflete a caminhada que os pagãos percorreram para encontrar Jesus. Atentos aos sinais da estrela, percebem que Jesus é a luz que traz a salvação, põem-se decididamente a caminho para O encontrar.  Chama a nossa atenção neste evangelho a disposição dos Magos: eles viram a estrela, deixaram tudo, arriscaram tudo e partiram à procura de Jesus.  Neste sentido, podemos dizer que os Magos representam os homens de todo o mundo que vão ao encontro de Cristo.

 

Não podemos deixar de prestar uma atenção particular ao símbolo da estrela, tão importante na narração evangélica (cf. Mt 2,1-12).  Esses Magos eram provavelmente astrônomos, tinham observado o surgir de um novo astro, e tinham interpretado este fenômeno celeste como anúncio do nascimento de um rei, precisamente, segundo as Sagradas Escrituras, do rei dos Judeus (cf. Nm 24,17), e puseram-se a caminho.  Na realidade, esta luz de Cristo se manifestou na inteligência e no coração dos Magos. “Eles partiram” (Mt 2, 9), narra o evangelista, lançando-se corajosamente por estradas desconhecidas e empreendendo uma longa e difícil viagem.

 

Neste caminho são guiados por uma luz. A primeira leitura já anuncia a chegada da luz salvadora de Deus, que transfigurará Jerusalém e que atrairá à cidade de Deus povos de todo o mundo. O apóstolo João escreve na sua Primeira Carta: “Deus é luz e nele não há trevas” (1Jo 1,5); e mais adiante acrescenta: “Deus é amor”. A luz, que surgiu no Natal, que hoje se manifesta aos povos, é o amor de Deus, revelado na Pessoa do Verbo encarnado. Portanto, os Magos do Oriente são atraídos por esta luz. A adoração de Jesus por parte dos Magos é reconhecida como cumprimento das Escrituras proféticas, como podemos ler no Livro do Profeta Isaías: “À tua luz caminharão os povos e os reis andarão ao brilho do teu esplendor… trazendo ouro e incenso, e anunciando os louvores ao Senhor” (Is 60,3.6).

 

Cristo é a luz que se acende na noite do mundo e atrai a si todos os povos da terra. Cumprindo o projeto redentor que o Pai nos quer oferecer.  Essa “luz” encarnou na nossa história, iluminou os caminhos dos homens, conduziu-os ao encontro da salvação, da vida definitiva. O evangelista São Lucas também faz uma reverência a Cristo como luz: “Luz para se revelar às nações e glória de Israel, teu povo” (Lc 2,32), como, inspirado por Deus, exclamará Simeão tendo o menino entre os braços, quando os pais o apresentaram no templo.  Cristo é a luz que ilumina os povos e que provém da glória de Israel (cf. Lc 2,4).

 

Lemos ainda no Evangelho que “a estrela, caminhava à frente deles, até que, chegando ao lugar onde estava o Menino, parou”. Chegando a Belém, os Magos “ao entrar na casa, viram o menino com Maria sua mãe, e prostrando-se o adoraram” (Mt 2,11). A criança que eles descobrem não é uma criança como as outras: é rei, então oferecem-lhe ouro; é Deus, então queimam incenso; passará pela morte antes de ressuscitar, então apresentam a mirra. Os dons que os Magos oferecem ao Messias simbolizam a verdadeira adoração. Mediante o ouro eles realçam a realeza divina; com o incenso confessam-no como sacerdote da nova Aliança; oferecendo a mirra reconhecem que Jesus derramará o próprio sangue para reconciliar a humanidade com o Pai.

 

É este o ápice de todo o itinerário: o encontro se faz adoração, conduz a um ato de fé e de amor que reconhece em Jesus, nascido de Maria, o Filho de Deus feito homem.  Da adoração dos Magos fazem parte os presentes, como sinal de doação: ouro, incenso e mirra; oferendas que se faziam a um Rei considerado divino.

 

Uma vida frágil que necessita dos cuidados de uma mãe desperta nos magos a admiração. Eles prostram-se e adoram o Menino Jesus. Aqueles que conheciam bem a Palavra de Deus, sabiam interpretá-la, sabem também ler as estrelas e são capazes de ver mais além das aparências. E o que eles percebem nesse Menino é tão profundo que caem prostrados, tiram seus tesouros, esvaziam-se e enchem-se da nova Luz descoberta. Os Magos adoraram um simples Menino nos braços de Maria porque reconheceram Nele a fonte da dupla luz que os tinha guiado: a luz da estrela e a luz da Palavra de Deus. Reconheceram o Cristo recém-nascido como o Rei dos Judeus, mas também o Rei de todas as nações.

 

O Evangelho esclarece que, depois de ter encontrado Cristo, os Magos regressaram ao seu país “por outro caminho”. Esta mudança de caminho pode simbolizar a conversão daqueles que encontraram Jesus.  Quando se encontra Cristo e se acolhe o seu Evangelho, a vida muda e somos estimulados a comunicar aos outros a própria experiência.  Teria sido natural voltar a Jerusalém, ao palácio de Herodes e ao Templo, para dar realce à sua descoberta.  Mas eles escolheram o Menino como seu soberano e foram transformados pelo encontro com a Verdade; descobriram um novo rosto de Deus, uma nova realeza: a do amor. O caminho exterior daqueles homens tinha terminado. Tinham chegado à meta. Mas a este ponto, começa para eles um novo caminho, uma peregrinação interior que altera toda a sua vida.  Cristo também nos convida a esta peregrinação interior.

 

Os Magos que vieram do Oriente são apenas os primeiros de uma longa procissão de homens e mulheres que na sua vida procuraram constantemente com o olhar a estrela de Deus, que procuraram aquele Deus que está perto de nós, seres humanos, e nos indica o caminho. É a grande multidão de santos, mediante os quais o Senhor, ao longo da história, abriu diante de nós o Evangelho e folheou as suas páginas; ainda hoje Ele continua a fazer isto.

 

A vida dos santos revela a riqueza do Evangelho. Eles são o rastro luminoso de Deus que Ele mesmo traçou e continua a traçar ao longo da história.  O segredo da santidade é a amizade com Cristo e a adesão fiel à sua vontade.  Santo Ambrósio dizia: “Cristo é tudo para nós” (S. AMBRÓSIO, De virginitate 16, 99). E São Bento exorta aos seus monges: “Nada antepor ao amor de Cristo” (RB 4,21).  São Bento indica com isto que devemos dar sempre prioridade a Cristo, que não podemos colocar nada, nem ninguém em seu lugar. A palavra “antepor” significa colocar algo entre mim e Cristo, construir um muro, uma separação. O amor de Cristo deveria ser nossa meta e nosso caminho, nossa certeza e nossa busca, nosso conforto.  Este “nada antepor”, significa que devemos priorizar sempre a companhia de Cristo. Quando nada colocamos no seu lugar, aí sim, nada antepomos ao seu amor.

 

Possamos também nós imitar os Magos e colocarmo-nos a caminho do Senhor. Saibamos percorrer com decisão o caminho do bem.  E assim como a estrela esteve a serviço dos Magos, possamos também nós estar a serviço dos nossos irmãos, indicando a eles o Cristo Senhor. Também como a estrela, devemos resplandecer como filhos da luz, para atrair a todos à presença do Salvador que nasceu para nos trazer uma vida nova.  Assim seja.

 

  1. Anselmo Chagas de Paiva, OSB

Mosteiro de São Bento/RJ

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