Homilia I Domingo da Quaresma | Ano C

Tentações de Cristo

I Domingo da Quaresma – C – Dt 26,4-10; Sl 90/91; Rm 10,8-13; Lc 4,1-13

[Resumo:  Mesmo sendo pessoas unidas ao Senhor, continuaremos a ser tentados. É importante a vigilância diante das tentações e que coloquemos os meios adequados para resistirmos às tentações. Desde o ponto de vista sobrenatural, temos que contar muito com a graça; desde o ponto de vista natural, temos que ter muito bom humor]

Estranho, porém verdade: alguém pode estar cheio do Espírito e, ao mesmo tempo, ser tentado pelo diabo: “Jesus, pleno do Espírito Santo, voltou do Jordão; era conduzido pelo Espírito através do deserto durante quarenta dias, e tentado pelo diabo” (Lc 4,1-2). Aprendamos: mesmo que estejamos nos melhores momentos da nossa vida espiritual, nunca nos esqueçamos dessa nossa condição tão básica, somos barro da terra. Porém, não somente, pois também somos sopro divino. Esta é a realidade: somos pouca coisa pelo fato de sermos um punhado de terra, mas somos muita coisa pelo fato de sermos também sopro divino. Miseria e nobreza encontram-se muito presentes em nossa vida. Consequentemente, na prática, temos que ter atitudes de humildade e nobreza, contrição e otimismo.

  1. K. Chesterton, converteu-se ao catolicismo em 1922. Para esse ilustre escritor inglês a Igreja Católica era um autêntico milagre porque se mantém otimista em meio ao pessimismo generalizado. Escrevendo sobre o otimismo, ele se perguntava: “Por que se publica no jornal a seguinte notícia: ‘Ontem um pedreiro caiu do andaime e morreu’? Não seria mais inteligente e, sobretudo, mais consolador anunciar: ‘Ontem 68.224 pedreiros no país não caíram do andaime’? De fato, por pouco que se pense, dada a fragilidade dos andaimes e o distraído que os homens são, é muito mais extraordinário que 68.224 não caiam  do andaime que um só tenha caído.” Temos que ter esse otimismo na nossa luta quaresmal: há tanta coisa boa em nós, mas, é preciso estar vigilantes, pois podemos cair.

Alguns se queixam de que ser santo é muito difícil, que lutam sem nada conseguir, que voltam a cair nos mesmos pecados. Mas talvez não pensem que Deus os tem protegido sempre, durante as tentações, e de que seguir o Senhor é verdadeiramente belo. Precisamos ser mais otimistas! Jesus Cristo também foi tentado, não pela sua própria concupiscência, pois Jesus Cristo não tinha o pecado original. Cristo quis ser tentado – como explica Santo Tomás de Aquino – para trazer-nos o auxílio em nossas tentações; para que sejamos cautelosos, assim nenhum santo, por mais que o seja, confie em si mesmo nem se julgue imune de toda e qualquer tentação; para dar-nos o exemplo ao instruir-nos como devemos vencer as tentações do demônio; para que tenhamos confiança em sua misericórdia que sempre nos socorre em todas as nossas necessidades.

O que são, mais precisamente, as tentações? São forças internas ou situações externas a nós mesmos que dão lugar ao consentimento da nossa vontade em pecados. As tentações ainda não são pecados, são disposições para o pecado. Se a pessoa, portanto, resiste às tentações, ela não pecou, por mais terríveis que tenham sido as tentações. A resistência, contudo, só é possível no poder da graça de Cristo e na firmeza da nossa vontade em não querer ofender o Senhor.

No nosso caso, Santo Afonso Maria de Ligório diz que “Deus permite as tentações em primeiro lugar, para que através delas conheçamos melhor a nossa debilidade e a necessidade que temos da ajuda de Deus para não cair (…); em segundo lugar, Deus permite-as para que cada um aprenda a viver desprendido das coisas materiais e deseje mais fervorosamente chegar à contemplação de Deus no céu (…); e, em terceiro lugar, para nos enriquecer de méritos”.

Uma fé ardente no Senhor e uma luta constante através da oração e da penitência são os remédios contra toda e qualquer tentação. Por outro lado, a tentação ainda não é pecado, pecado é consentir na tentação. Podemos, ademais, demonstrar muito amor a Deus enquanto somos tentados. Inclusive, depois de vencidos numa determinada tentação, deveríamos perguntar-nos se nós lutamos de verdade para não ofender ao Senhor que nos ama tanto. Essa luta, mais intensa ou menos intensa, mostra também o nosso amor ao Senhor: pouco ou muito, o amor a Deus existe em nós e é ele que deve fazer com que nos distanciemos do pecado.

São Lucas e São Mateus deixaram muitos pormenores sobre o jejum e as tentações de Jesus Cristo (cf. Lc 4,1-13; Mt 4,1-11). Jesus luta contra a tentação da seguinte maneira: na força da Palavra: “Não tentarás o Senhor teu Deus” (Lc 4,12); na força do jejum: “Nem só de pão vive o homem” (Lc 4,4); desprezando as sugestões do demônio, ao não dar-lhe atenção: “Para trás, Satanás” (Mt 4,10); fixando-se no seu Pai do céu: “Adorarás ao Senhor, teu Deus e a Ele prestarás culto” (Mt 4,10). Aprendamos do Senhor: ler as Sagradas Escrituras com reverência e atenção, a fazer penitência por causa do nosso espírito verdadeiramente arrependido por amor, a orar olhando mais para Deus, a cuidar dos outros com verdadeiro interesse e por caridade humano-sobrenatural..

E, por último, não sejamos ingênuos: quem se põe na boca do lobo está esperando ser comido. Não se brinca com a tentação! Alguns não querem pecar por gula, mas sempre buscam satisfazer os caprichos na comida; outros até não queriam pecar contra a castidade, mas ficam lendo porcaria, assistindo bobagem, brincando com fogo no namoro e depois… Nesse caso, vale transcrever aqui um antigo refrão: “o homem é fogo, a mulher é palha, vem o demônio e sopra”; outros, finalmente, não queriam pecar por orgulho, mas não param de falar de si mesmos. “Não nos deixeis cair em tentação”, peçamos mais uma vez ao nosso Pai do céu. Na hora da tentação não nos esqueçamos de implorar a ajuda poderosa de Nossa Senhora, pois ela roga por nós, os pecadores, agora e na hora da nossa morte. Amém.

Padre Françoá Costa
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