Homilia Domingo da Solenidade da Epifania do Senhor | Ano C

Adorar como os Magos do Oriente

Epifania do Senhor – Domingo – C – Is 60,1-6; Sl 71; Ef 3,2-6; Mt 2,1-12

No contexto do nascimento de Jesus em Belém, aparecem os “magos do Oriente” (Mt 2,1). A bem da verdade, Mt 2,1-12 é um texto sem paralelo no Evangelho da infância segundo Lucas, porém com bastantes ressonâncias que vem do Antigo Testamento: Nm 24,17 fala do astro que procede de Jacó, base teológica da “estrela de Belém”; Gn 49,10 já contemplara um rei de Judá obedecido por todo o mundo; o Salmo 72,10-11 conta com essa universalidade do rei ao qual todas as nações servirão. No texto de Mateus, os magos dominam conhecimentos ocultos através da astrologia, com o qual eles podem ter vindo ou da Babilônia ou da Arábia, já que a Babilônia era a terra da astrologia naquele então. Mesmo que não esteja na Bíblia, a piedade medieval deu nomes aos magos – Gaspar, Melquior e Baltasar – e os transformou em reis. Também o número três,  referindo-se aos magos, é um acréscimo, já que a Escritura não diz quantos eram; contudo, como três foram os presentes – ouro, incenso e mirra -, três devem ter sido os doadores.

Eles vieram do Oriente a Jerusalém, o centro religioso e cultural do povo de Israel. Para contextualizar a visita dos sábios do Oriente ao Messias de Israel, historicamente falando, há que dizer que o mesmo Herodes que começara a governar a Judéia no ano 40, findou seu reinado no ano 4 a. C. É com esse rei que os magos conversaram, segundo Mt 2,1-8. 

Realmente houve magos do Oriente que visitaram Jesus ou se trata apenas de uma narrativa criada pelo hagiógrafo para significar a universalidade da salvação oferecida pelo Messias de Israel? Como já vimos, o Salmo 72 tem essa perspectiva: o rei-messias será servido pelas nações mais diversas. A favor da historicidade, segundo uma antiga tradição, os restos mortais dos magos repousam na Catedral de Colônia, na Alemanha. Sem entrar na discussão se aquelas são as relíquias dos magos ou não, o importante é dizer que não era impossível que esses magos viessem ao encontro de Jesus, pois neles vemos o cumprimento das profecias de que os povos pagãos adorariam o Deus de Israel. Mais ainda, à cidade de Jerusalém vinham peregrinos de várias partes do mundo conhecido da época, especialmente os pagãos tementes a Deus. As razões para admitir a historicidade da narrativa mateana são muito fortes; sendo assim, trata-se de um acontecimento que, ao ser narrado, não deixa de mostrar o talento teológico do hagiógrafo.

A primeira pergunta dos Magos foi: “Onde está o rei dos Judeus recém-nascido?” (Mt 2,2). Mas antes da pergunta, é interessante o fato de que houve uma pergunta. As pessoas cresceram fazendo-se perguntas sobre o mundo, sobre elas mesmas e sobre Deus. As perguntas, mesmo em questões de fé, são importantes, e não devem ser confundidas com as dúvidas, que são oscilações do juízo entre o ato de afirmar e o de negar. Na verdade, uma pessoa de fé tem o seu juízo firme em Deus; é com a mente e o coração fixos no Senhor que um filho de Deus procura conhecer mais as realidades santas. Fará, portanto, perguntas que, no contexto de sua fé, a esclarecem e fazem o caminho do seguimento de Jesus mais inteligível e mais amável. Quem tem fé sabe que conhecer e amar a Deus são atos que o aperfeiçoam como ser humano e como discípulo de Jesus Cristo, e, com essa certeza, percorre o caminho da salvação.

“Onde está…?” – Perguntam os magos do Oriente. A pergunta está bem feita, pois antes da encarnação perguntar-se pelo onde, que indica lugar, era um questionamento não aplicável a Deus, uma vez que ele não habita em lugar nenhum; nada o que o circunscreve nem o limita. Porém, depois da encarnação, Deus – a segunda Pessoa da Trindade divina – encontra-se em lugar concreto: naquele momento que os magos perguntaram, ele estava em Belém; antes, nas entranhas puríssimas de Maria; durante seus trinta anos, naquele território que hoje chamamos Terra Santa, precisamente por ter sido pisada por Jesus Cristo: toda aquela região foi testemunha das andanças evangelizadoras do Filho de Deus e por isso temos veneração por aqueles santos lugares. “Onde está?” Essa pergunta demonstra busca sincera.

“O rei dos judeus recém-nascido” (Mt 2,2) é aquele a quem os magos procuram. Jesus Cristo é rei. Estamos diante de uma analogia com um sistema de governo, a monarquia; contudo, trata-se apenas de uma analogia, ou seja, de uma linguagem de semelhanças, pois o cristianismo não veio para criar sistemas de governo, mas para salvar os que são redimíveis e iluminá-los. Com certa frequência, no Novo Testamento, Jesus preferia não ser reconhecido como rei, pois desta maneira não se confundiria o seu reino com esquemas terrenos nem com ideologias do momento. Fala-se de Jesus como rei porque a tradição de governo em Israel, foi, de acordo com a época, a monarquia começada com Saul e consolidada com o rei Davi. Consequentemente, era conveniente que Jesus Cristo, sendo da família de Davi, fosse rei. Mas não somente por isso, mas porque, de fato, Jesus reina sobre todo o universo, sobre toda a criação; ele é o rei universal. Desta maneira, o seu reino não tem fim e todos os povos, coletiva e individualmente, assim como todas as pessoas e grupos devem servi-lo.

Os reis magos procuravam o Senhor de verdade, pois vieram de longe guiados pela estrela. Nós o procuramos verdadeiramente? Uma dimensão concreta dessa busca é a adoração. Para uma pessoa que entendeu isso, dá pena ver como em alguns ambientes se trata a Eucaristia, o grande dom atual de Deus aos homens! Dá pena observar algumas celebrações eucarísticas: sem zelo e sem a observação das prescrições da Igreja para a correta celebração da santa missa, por parte dos ministros de Cristo; entre conversinhas e atendimentos de celulares, por parte de muitos fiéis que participam do santo sacrifício da missa. Desta maneira, não poderíamos apontar a adoração como momento de encontro com Deus! Eles, os que não conhecem a Deus explicitamente, desejariam conhecê-lo e adorá-lo. Mas, nós que o conhecemos… Será que o conhecemos mesmo?

Tenho saudades de que a Igreja seja mais silenciosa, mais adoradora, mais misteriosa, mais dada à contemplação das ações de Deus. Por vezes, em meio aos desconcertos modernos, o católico tem a impressão de que lhe roubaram a sua Igreja. Mas, como no tempo dos Apóstolos, o Senhor aparece e anima-lhes em sua Fé mostrando-se ressuscitado; assim também, em nossos tempos, o Senhor anima a nossa Fé fazendo-nos notar a sua Igreja ressuscitada.

Padre Françoá Costa
Instagram: @padrefcosta

Facebook
Twitter
LinkedIn

Biblioteca Presbíteros