Homilia do Pe. André Luís Buchmann de Andrade – XVI Domingo do Tempo Comum – Ano B

“… descansai um pouco” (Mc 6,31)

“Naquele tempo, os apóstolos reuniram-se com Jesus e contaram tudo o que haviam feito e ensinado. Ele lhes disse: ‘Vinde sozinhos para um lugar deserto e descansai um pouco’. Havia, de fato, tanta gente chegando e saindo que não tinham tempo nem para comer” (Mc 6,30-31).

Idéias principais: Cristo sabia trabalhar e descansar. O mal do nosso tempo é a ansiedade.  A tentação do ativismo.

I. Cristo sabia trabalhar e descansar.

Cristo, Nosso Senhor, Deus e Homem verdadeiro, demonstra a Sua Santíssima Humanidade trabalhando na oficina com São José, e também demonstra a Sua Divindade trabalhando nas coisas do Pai, através dos grandes prodígios que fez.

Demonstrou Sua Humanidade ainda em outras ocasiões quando, por exemplo, descansava.

Hoje vemos o convite de Jesus aos Apóstolos para que eles também descansassem: “Vinde sozinhos para um lugar deserto e descansai um pouco”.

Sabia descansar de verdade. Notem o detalhe da expressão de Jesus: não disse “ide”, como quem quisesse que os Apóstolos fossem para longe d’Ele, mas “vinde”. Portanto, chamou-os para Si. O descanso, então, não era somente ir para um lugar sossegado, mas estar com Ele, o Divino Mestre.

Infelizmente, hoje, estamos perdendo a noção do descanso. Lazer, relax, espairecer são palavras que atualmente significam, para muitíssima gente, viagens, bebidas, dormir, e coisas ainda piores.

Cristo sabia descansar. Mas sabia também lidar com os imprevistos, como é o caso do Evangelho de hoje: quis sair para descansar com os Apóstolos, mas acabou encontrando gente que precisava dos Seus ensinamentos.

O cristão tem de encontrar um meio de santificar o seu descanso e santificar-se pelo descanso. Cada um deve encontrar o seu modo de descansar. Mas é sempre bom encontrar um meio saudável de descansar. Entre os meios saudáveis encontram-se a boa leitura que é um ótimo modo de desenvolver e exercitar o cérebro. Outro meio é um passatempo, que tem hoje o nome bonito de hobby. Pode ser jardinagem, cuidar de um animal de estimação, fazer ginástica, escrever, pintar e assim por diante.

É claro que por vezes precisamos dormir um pouco mais, ficarmos quietos por mais tempo, mas devemos evitar os excessos tão comuns de trabalhar, trabalhar e trabalhar e depois dormir, dormir e dormir. O equilíbrio é a chave do sucesso na vida e na saúde física, mental e espiritual.

Cristo descansou para nos dar o exemplo de que se trata de um tema importante na vida de todo ser humano.

Cristo descansava dormindo, mas também visitando os amigos, conversando com eles, recebendo convites para almoçar e jantar. Enfim, tinha uma vida normal.

II. O mal do nosso tempo é a ansiedade.

Hoje não entendemos o porquê de tanto estresse, de tanta depressão, de tantos males físicos. A ansiedade – que está tão na moda – causa muitos destes problemas.

A ansiedade está também na raiz de muitos defeitos de carácter ou, pelo menos, os potencializa como, por exemplo, a impaciência, a timidez, a rispidez e tantos outros vícios que se transformam até em pecados.

Tem gente tão atacada pela ansiedade que não tem paciência com nada: nem com o trânsito, nem com as filas, nem com os amigos e muito menos com os inimigos. Luta e luta para adquirir a virtude da paciência, mas não pensa na ansiedade. Quando sua luta envolver também a ansiedade, aí sim terá mais resultados.

Tem gente que dá todas as demonstrações de timidez, é muito calada, e as pessoas até pensam que se trate de uma pessoa mal-educada ou soberba. E o que na realidade atrapalha a abertura do indivíduo é a ansiedade. Fica muito ansioso e, por isso, prefere não falar com os outros ou em público. A ansiedade provoca medo e falta de conforto.

Caso isso se some ao cansaço de um sujeito que não saiba ter alguns momentos de descanso criativo, então a desgraça está feita.

Os ríspidos também têm a desvantagem que a ansiedade provoca: ficam tão ansiosos em questões inesperadas, na pressa ou nas emergências que arranham e machucam os entes queridos e os estranhos.

Uma vez, uma Professora minha disse, na classe, que ela tinha aprendido a se possuir a si mesma quando se sentia dentro de uma situação de medo, de ansiedade ou de desconforto. Ela dizia que segurava um dedo ou o pulso e começava a sentir o coração batendo e ia se acalmando e se possuindo, em vez de ser possuída por alguma emoção suspeita.

Não foi justamente isso que Nosso Senhor disse no Evangelho? “In patientia vestra, possidebitis animas vestras”[note] “Na vossa paciência, possuireis as vossas almas” ou como a maioria das traduções traz: “É pela vossa constância que alcançareis a vossa salvação” (Lc 21,19). [/note]

Não digo que seja uma receita que precise ser copiada por todos. Nem todos vão se dar bem apertando os dedos ou os pulsos para sentir as batidas do coração. Mas é certo que cada um deverá arranjar um jeito para se conscientizar de sua ansiedade e arranjar um modo de tranquilizar-se mais.

Vinde sozinhos para um lugar deserto e descansai um pouco”.

A ansiedade obnubila a visão da fé.

Ela também turva a pureza do amor.

E, ainda, nos faz perder a esperança.

Muito pessimismo, negativismo e sentimento de derrota vem da ansiedade.

III. A tentação do ativismo.

Somos muito tentados pelo ativismo hoje em dia.

Atualmente, porque as comunicações são muito rápidas, nós temos a tentação de querer fazer o máximo de atividades no menor espaço de tempo. Fazer, fazer e fazer. E pensamos que nisso esteja a chave da felicidade. Esquecemos de parar. Esquecemos que perder tempo com as coisas boas da vida no fundo é ganhar tempo de qualidade.

Tem gente que pensa que rezar é perda de tempo, que fazer adoração ao Santíssimo Sacramento é perder o precioso tempo. Ir à Missa, para quê? Rezar o terço, que repetição!

Vinde sozinhos para um lugar deserto e descansai um pouco”.

Em outros tempos, as coisas eram diferentes, os ritmos eram outros e todos sobreviviam.

Lembro-me, quando era pequeno, de um dia, na loja de meu pai, vê-lo tirar o telefone preto do gancho e de ouvi-lo pedir linha à telefonista para a cidade vizinha e colocar novamente no gancho o aparelho. Estranhei e disse a meu pai: o senhor não vai continuar falando? Ele me respondeu: “quando tiver linha disponível ela vai me ligar”. E foi o que aconteceu, mas apenas meia hora mais tarde.

Hoje falamos com Roma, com Londres, com Buenos Aires a qualquer hora com as imagens ajudando a voz na comunicação. Ótimo, mas podemos pensar que tudo o que fazemos deva ser rápido e instantâneo. Nós não somos café solúvel para sermos instantâneos.

Hoje somos especialistas em acelerar. E por isso cansamos demais. Precisamos saber pôr o pé no freio também.

Vinde sozinhos para um lugar deserto e descansai um pouco”.

Descansar, rezar, estar a sós com Deus faz com que reabasteçamos as energias para trabalhar mais e melhor. Tudo tem sua hora.

“Percorrendo a vida de Jesus Cristo, vemos que a cada dor e humilhação corresponde um lampejo de alegria e de glória, como que por compensação… Justamente assim também para nós. A cada oração, a cada fadiga, mesmo neste mundo, corresponde uma luz de consolação; mas depois, lá em cima, corresponderá a luz da transfiguração eterna”[note] Pensamento sôbre os Evangelhos e sôbre as Festas do Senhor e dos Santos, p. 316. [/note]

Que Maria Santíssima nos ajude a entendermos o que significa a paz, a mansidão, o descanso e a oração.

Pe. André Luís Buchmann de Andrade

 

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