Trigo ao celeiro, palha ao fogo!
A primeira parte do Tempo Advento nos insere na dinâmica da espera da segunda vinda de Cristo, da Parusia. Jesus há de vir pela segunda vez! Ele “tem na mão a pá, limpará sua eira e recolherá o trigo ao celeiro. As palhas, porém, queimá-las-á num fogo inextinguível” (Mt 3,12). Essas palavras em lugar de infundir medo, são portadoras de esperança. Por outro lado, se na consumação do fim dos tempos todos fossem tratados por igual, não se manifestaria a justiça de Deus nem a importância que tem a liberdade humana. Não podemos dizer que o trigo é a mesma coisa que a palha, pois isso iria contra a verdade. O mesmo se diga da diferença entre uma pessoa que procura comportar-se de tal maneira a ser trigo para Deus de outra cuja vida está cheia de palha.
Mas, como foi dito, tudo isso é motivo de esperança: podemos ser trigo de Deus! Ainda que tenhamos errado muito na vida, enquanto vivermos o caminho encontra-se aberto rumo à santidade. Não sei de quem é o ditado, mas sei que é certo: “por um burro dar um coice não se lhe corta logo a perna”. Por mais coices dados na vida sempre podemos utilizar as pernas para andar rumo a Deus. Quando? Agora!
Juntamente com o arroz e o milho, o trigo foi um dos alimentos mais consumidos pela humanidade. Com ele se podem fazer tantas coisas! Ser trigo para Deus significa deixar-se trabalhar para alimentar os outros, para servir para muitas coisas. De fato, triticum (trigo, em latim) significa também a atividade de triturar esse cereal para separar o grão da palhinha que o recobre.
Para sermos bons instrumentos nas mãos de Deus é preciso abandonar-nos em suas mãos. Confiemos nesse bom agricultor, ainda que às vezes tenhamos a sensação de que nos está triturando e de que sofremos muito: essa atividade é necessária para que a nossa humanidade apareça como Deus sempre a quis, transluzente da sua graça, que é antecipação da glória de Deus em nós. Somos transformados para transformar, temos que alimentar os outros. A nossa vida deve ser um reflexo dessa referência obrigatória a Deus e aos demais.
Deus nos faça bom trigo! Que a nossa vida sirva para o sacrifício da Missa e para o alimento dos irmãos. Nós que somos pão de Deus na preparação dos dons de cada celebração eucarística, temos que matar a fome dos nossos semelhantes, e em primeiro lugar a fome de Deus que eles sentem. Recentemente, na viagem que o Papa Bento XVI fez à Espanha, na homilia pronunciada na Praça do Obradoiro em Santiago de Compostela, nos recordava que os apóstolos “deram testemunha da vida, morte e ressurreição de Cristo Jesus, a quem conheceram enquanto pregava e realizava milagres. Nós também, queridos irmãos, temos que seguir o exemplo dos apóstolos, conhecendo ao Senhor cada dia mais e dando um testemunho claro e valente do seu Evangelho. Não há tesouro maior a oferecer aos nossos contemporâneos”. O Evangelho, a Boa Nova, isto é, Jesus, é o maior tesouro que podemos oferecer aos outros. Aqui está um dos pontos que mostram a especificidade do cristianismo: oferecer a vida que está em Cristo a todos. Outras coisas, outras pessoas poderão oferecer.
É preciso que mantenhamos sempre o entusiasmo da fé, a juventude da fé. O exemplo pessoal do Santo Padre deveria ser um ponto de partida para nós. Ele já tem 83 anos, a sua juventude foi marcada pelo horror do nazismo e da segunda guerra mundial, teve que estudar em situações difíceis, combater tantos erros e… sorrir oferecendo o próprio testemunho em meio a situações verdadeiramente complicadas. Depois da morte do queridíssimo João Paulo II, Ratzinger pensava retirar-se e dedicar-se ao estudo repousado da teologia. Deus não quis que fosse assim e chamou-o a ser o sucessor de Pedro. Com 83 anos, carrega erguido o peso da Igreja com um sorriso nos lábios, cativando com a sua presença discreta, com essa espécie de timidez que o faz tão simpático e tão próximo a cada um de nós. Ele é trigo de Deus!
São Josemaría Escrivá gostava de dizer que temos de ser tão úteis ao serviço de Deus que terminemos espremidos como um limão e muito felizes na nossa entrega. E depois? Depois… daremos um abraço ao Pai e ao Filho e ao Espírito Santo.
Pe. Françoá Costa