Homilia do Mons. José Maria – XXXIII Domingo do Tempo Comum – Ano A

Jesus avisa: Temos que Aproveitar a Vida!

A Palavra de Deus deste domingo – o penúltimo do Ano Litúrgico – adverte-nos acerca do caráter passageiro da existência terrena e convida-nos a vivê-la como uma peregrinação, mantendo o olhar dirigido para a meta, para aquele Deus que nos criou e, dado que nos fez para Si (Santo Agostinho, Conf. 1,1), é o nosso destino último e o sentido do nosso viver. Passagem obrigatória para alcançar tal realidade definitiva é a morte, seguida pelo juízo final. O Apóstolo Paulo recorda que “o dia do Senhor virá como um ladrão de noite” (1Ts 5,2), isto é, sem aviso prévio. A consciência da vinda gloriosa do Senhor Jesus estimula-nos a viver numa atitude de vigilância, aguardando a sua manifestação na memória constante da sua primeira vinda.

No Evangelho (Mt 25,14-30) Jesus conta a parábola dos talentos: um homem que, partindo de viagem para o estrangeiro, chamou os seus próprios servos e entregou-lhes os seus bens. A um deu cinco talentos, a outro dois, a outro um. A cada um, de acordo com a sua capacidade. Depois de muito tempo ele voltou e pôs-se a ajustar as contas com eles. Elogiou e recompensou os que fizeram render os talentos a eles confiados e repreendeu e castigou o que não fez render o único talento recebido.

Com esta parábola Jesus nos ensina que a vida na terra é um tempo para administrarmos a herança do Senhor e assim ganharmos o Céu.

O significado da parábola é claro! Nós somos os servos; os talentos são as condições com que Deus dotou cada um de nós (a inteligência, a capacidade de amar, de fazer os outros felizes, os bens temporais…); o tempo que dura a ausência do patrão é a vida; o regresso inesperado, a morte; a prestação de contas, o juízo; entrar no gozo do Senhor, o Céu. Não somos donos, mas administradores de uns bens dos quais teremos de prestar contas.

Hoje podemos examinar na presença de Deus se realmente temos mentalidade de administradores e não de donos absolutos, que podem dispor a seu bel-prazer do uso que fazemos do nosso corpo e dos sentidos, da alma e das suas potências. Servem realmente para dar glória a Deus? Pensemos se fazemos o bem com os talentos recebidos: com os bens materiais, com a nossa capacidade de trabalho, com as amizades… o Senhor deseja ver o seu patrimônio bem administrado. O que Ele espera é proporcional àquilo que recebemos.

“Muito bem servo bom e fiel! Como foste fiel na administração de tão pouco, eu te confiarei muito mais. Vem participar da minha alegria” (Lc 25,21). Vale a pena sermos fiéis aqui, enquanto aguardamos a chegada do Senhor, aproveitando este curto espaço de tempo com sentido de responsabilidade. Que alegria quando nos apresentarmos diante d’Ele com as mãos cheias, dizendo: olha Senhor, fiz render os talentos que me destes. Não tive outro fim senão a tua glória!

Nesta parábola o Senhor ensina-nos especialmente a necessidade de corresponder à graça de maneira esforçada, exigente e constante durante toda a vida. Importa fazer render todos os dons que recebemos do Senhor. O importante não é o número, mas a generosidade para fazê-los frutificar.

Fiquemos atentos, pois a correspondência à graça se dá no dia a dia, na família, no trabalho profissional, no apostolado etc. Ensina São Josemaría Escrivá: “Há uma única vida, feita de carne e espírito, e essa é que tem de ser – na alma e no corpo – santa e cheia de Deus, deste Deus invisível, que nós encontramos nas coisas mais visíveis e materiais. Não há outro caminho, meus filhos: ou sabemos encontrar o Senhor na nossa vida corrente, ou nunca O encontraremos” (Temas Atuais do Cristianismo, n° 114).

Mas o que tinha recebido um talento foi, cavou na terra e escondeu o dinheiro do seu senhor. Quando este lhe pediu contas, tentou desculpar-se…

Este último servo revela-nos como é que o homem se comporta quando não vive uma fidelidade ativa em relação a Deus. Prevalecem o medo, a auto estima, a afirmação do egoísmo que procura justificar a sua conduta com as injustas pretensões do seu senhor que deseja colher onde não semeou. “Servo mau e preguiçoso”, é como o Senhor o chama ao ouvir as suas desculpas. Esqueceu uma verdade essencial: que o homem foi criado para conhecer, amar e servir a Deus neste mundo e assim merecer a vida com o próprio Deus para sempre no Céu.

Quando se conhece a Deus, é fácil amá-Lo e servi-Lo. Quando se ama, servir não só não é custoso nem humilhante: é um prazer. “Servo preguiçoso”, diz o Senhor. A preguiça fruto da falta de amor leva a um desamor muito maior. Nesta parábola, o Senhor condena os que desenvolvem os dons que Ele lhes deu e os que os empregaram a serviço do seu comodismo pessoal, ao invés de servirem a Deus e aos seus irmãos, os homens, num serviço de amor.

A nossa vida é breve! Por isso temos que aproveitá-la até o último instante para crescer no amor e no serviço a Deus. Alerta-nos a Sagrada Escritura para a brevidade da vida. È comparada à fumaça (Sl 38,6), à sombra (Sl 143,4), à passagem das nuvens (Jó 4,2; 37,2), ao nada (Sl 38,6). Que pena se perdemos o tempo ou o empregamos mal, como se não tivesse valor! Quando o cristão mata o seu tempo na terra, coloca-se em perigo de matar o seu Céu.

Aproveitar o tempo é levar a cabo o que Deus quer que façamos em cada momento; é viver plenamente o momento presente, empenhando a cabeça e o coração naquilo que fazemos, ainda que humanamente pareça ter pouca importância, sem nos preocuparmos excessivamente com o passado nem nos inquietarmos muito com o futuro. Viver o momento presente, de olhos postos em Deus, torna-nos mais eficazes e livra-nos de muitas ansiedades inúteis, que nada mais fazem do que paralisar-nos.

Ao pedir que administremos os talentos o Senhor convida-nos à vigilância.

Pensemos na nossa vida. Por que não conseguimos, às vezes, os minutos de que precisamos para terminar amorosamente o nosso trabalho, que é o meio da nossa santificação? Por que descuidamos as obrigações familiares? Por que nos entra a pressa à hora de rezar ou de participar da Missa? Por que nos faltam a serenidade e a calma para cumprirmos os deveres, e nos entretemos sem pressa nenhuma nos caprichos pessoais? Poderemos responder: são ninharias. Mas essas ninharias mantêm viva a luz da fé e do amor. E o amor está nos detalhes. Contamos com todos os meios para isso: com a doutrina e com a graça do Senhor, apesar das nossas misérias. Com os meios da graça divina (principalmente a confissão, a comunhão e a oração pessoal), não necessitamos senão de boa vontade para aproveitar as ocasiões que Deus nos concedeu.

No fim de nossa vida, o que desejamos ouvir? “Servo bom e fiel… vem participar da minha alegria…” ou “ servo mau e preguiçoso… servo inútil… joguem-no fora… na escuridão… onde haverá choro e ranger de dentes?”. A escolha será nossa!

Entrar na glória divina é o único que realmente interessa. Se não, a vida terá sido um imenso fracasso, e para sempre. Ainda que poderosos, famosos, ricos e tendo gozado todos os prazeres nesta vida. Tudo isso é temporário, depois é para sempre!

Jesus avisa: temos que aproveitar a vida. Nossa vida tem que render para o Reino de Deus. Estamos na terra para algo que não é o nosso egoísmo. A parábola dos talentos é um aviso de Jesus para darmos frutos com os dons que recebemos de Deus. Aliás, o talento não era uma moeda, era medida de peso de metais preciosos, equivalente a 50 kg de ouro.

Nosso Senhor nos chama a reconhecer que a vida é um dom, que recebemos muitos dons, e espera que nós os façamos frutificar. E, ao final, poderemos encontrá-lo e dizer: “eis, Senhor, os talentos que me destes e restituo com o que ganhei”. E ouviremos: “servo bom e fiel, entra na alegria do teu Senhor”. A Virgem Maria nos sirva de mestra de vigilância ativa e jubilosa no caminho rumo ao encontro com Deus.

Mons. José Maria Pereira

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