Falam e não praticam!
Segundo o Evangelho de Mateus (23,1-12), aos poucos vai-se acentuando a tensão entre Jesus e os escribas e fariseus, que acaba levando-O à morte. Jesus fala às multidões e aos discípulos da vaidade e dos desejos de glória dos fariseus, denunciando sua hipocrisia: “Eles dizem e não fazem”. “Amarram pesados fardos e os colocam nos ombros dos outros, mas eles mesmos não estão dispostos a movê-los nem sequer um o dedo. Fazem todas as suas ações só para serem vistos pelos outros; cobiçam os primeiros lugares nos banquetes, as primeiras cadeiras nas sinagogas, as saudações nas praças e que os homens os chamem de mestres.”
A este comportamento Jesus opõe a simplicidade e a humildade que quer ver sempre nos seus discípulos e, por conseguinte, em todos os apóstolos. Longe de se apresentarem como mestres, devem procurar que a sua autoridade se manifeste em atitudes humildes, modestas, fraternas e cordiais, pois assim terá credibilidade.
Os fariseus eram crentes entusiastas, que valorizavam muito a Lei de Moisés, mas esqueciam o essencial, o amor e a misericórdia.
Jesus Cristo vem ensinar a Verdade; mais ainda, Ele é a Verdade (Jo 14,6). Daí a singularidade e o caráter único de sua condição de Mestre. “Toda a vida de Cristo foi um ensino contínuo: o Seu silêncio, os Seus milagres, os Seus gestos, a Sua oração, o Seu amor ao homem, a Sua predileção pelos pequenos e pelos pobres, a aceitação do sacrifício total na Cruz pela salvação do mundo, a Sua ressurreição são a atuação da Sua palavra e o cumprimento da revelação. De sorte que para os cristãos o Crucifixo é uma das imagens mais sublimes e populares de Jesus que ensina.
Estas considerações, que estão na linha das grandes tradições da Igreja, reafirmam em nós o fervor por Cristo, o Mestre que revela Deus aos homens e o homem a si mesmo; o Mestre que salva, santifica e guia, que está vivo, que fala, que exige, que comove, que orienta, julga, perdoa, caminha diariamente conosco na história; o Mestre que vem e virá na glória (Catechési Tradendae, n° 9).
Disse Jesus: “o maior dentre vós deve ser aquele que serve. Quem se exaltar será humilhado, e quem se humilhar será exaltado” (Mt 23, 11-12).
Os fariseus gostavam de aparecer, e Jesus ao condenar os seus principais vícios e corrupções quer incutir-lhes a virtude da humildade. Está é o fundamento de todas as virtudes, mas é especialmente da caridade: na medida em que nos esquecemos de nós mesmos, podemos interessar-nos verdadeiramente pelos outros e atender às suas necessidades. Ao redor destas duas virtudes encontram-se todas as outras. Afirma São Francisco de Sales: “humildade e caridade são virtudes mães; as outras as seguem como os pintinhos seguem as galinhas”. Em sentido contrário, a soberba, aliada ao egoísmo, é a raiz e a mãe de todos os pecados, mesmo dos capitais, e o maior obstáculo que o homem pode opor à graça.
A soberba e a tristeza andam frequentemente de mãos dadas, enquanto a alegria é patrimônio da alma humilde.
O humilde é audaz porque conta com a graça de Deus, que tudo pode, porque recorre com freqüência à oração, convencido da absoluta necessidade da ajuda divina. E por ser simples e nada arrogante ou auto-suficiente, atrai as amizades, que são seu veículo para ação apostólica eficaz e de longo alcance.
Santo Afonso de Ligório ensinou que “o primeiro traço da humildade é o modesto conceito de si mesmo.”
À virtude da humildade deve acrescentar-se ao amor sincero, a entrega generosa e o desinteresse pessoal de que nos fala S. Paulo: “Fizemo-nos pequenos no meio de vós. |Como a mãe que acalenta os filhos, assim pela viva afeição que vos dedicamos. Desejávamos dar-vos não somente o Evangelho de Deus, mas até a própria vida (…)” (1 Ts 2, 7-8). Não são meras palavras, pois Paulo não retrocedeu nem sequer diante dos mais graves riscos para ganhar homens para Cristo e evangelizou-os “com trabalhos e fadigas, trabalhando noite e dia para não ser pesado a nenhum deles.” (1 Ts 2, 9). A sua generosidade chegou a renunciar àquilo a que tinha direito. Preocupou-se exclusivamente em dar e nada receber, convencido de que o desinteresse pessoal daria à sua pregação uma maior eficácia; de fato, a sua palavra foi acolhida, “não como palavra humana, mas como palavra de Deus que realmente é” (1 Ts 2, 13). A pregação desinteressada do Evangelho é o mais eloqüente testemunho da verdade da fé.
Que o Senhor nos conceda a graça de sermos cristãos coerentes, de fazermos o que dissermos para os outros! Pois os fariseus não fazem o que dizem.
Mons. José Maria Pereira