Homilia do Mons. José Maria – XXIII Domingo do Tempo Comum – Ano A

 A Mais Genuína Manifestação do Amor Fraterno!

A Palavra de Deus, neste Domingo (Mt 18, 15-20), pode ser desenvolvida, como meditação, refletindo sobre dois aspectos importantes da vida cristã: a correção fraterna e a oração em família.

Diz Jesus: ”Se teu irmão pecar contra ti, vai corrigi-lo, mas em particular, a sós contigo!” (Mt 18,15). Este primeiro momento demonstra o respeito e o amor para com o próximo. Muitas vezes acontece que se espalha o erro da pessoa aos quatro ventos… Esta atitude não é cristã! É necessário rezar, pedindo as luzes do Espírito Santo para saber quando se deve calar… quando se deve falar… e como falar…

Caso o irmão não queira ouvir, Jesus ensina que se deve pedir a ajuda de outras pessoas, que tenham sensibilidade cristã e sabedoria…

O texto do Evangelho, de Mateus 18, que estamos refletindo, é dedicado à vida da comunidade cristã, diz-nos que o amor fraterno exige também um sentido de responsabilidade recíproca, pelo que, se o meu irmão comete uma falta contra mim, devo usar de caridade para com ele e, antes de tudo, falar-lhe pessoalmente, recordando-lhe que quanto disse ou fez não é bom. Este modo de agir chama-se correção fraterna: ela não é uma reação à ofensa de que se foi vítima, mas é movida pelo amor ao irmão. Santo Agostinho comenta: “Aquele que te ofendeu, ao ofender-te, causou em si mesmo uma ferida grave, e não te preocupas tu pela ferida de um teu irmão?… Deves esquecer a ofensa que recebeste, mas não a ferida de um teu irmão” (Discurso 82, 7).

A correção fraterna é uma obra de misericórdia espiritual: corrigir os que erram. Porque, no caminho que conduz à vida eterna, podemos desviar-nos do rumo. Os familiares ou amigos podem criar hábitos que destoam de um bom cristão e que os afastam de Deus, por exemplo: grosserias, impaciências, faltas de justiça no trabalho ou nos negócios, maneira de falar ou vestir pouco exemplares, gula, embriaguez, desperdícios de dinheiro, relacionamentos que põem em perigo o casamento ou a castidade…

Infelizmente, a caridade espiritual é ignorada por tantos. Quantas omissões na responsabilidade para com os irmãos, pela sua salvação eterna. Diante do mal, não se deve ficar calado!

Quando somos nós que recebemos uma correção, devemos aceitá-la com humildade, sem nos desculparmos, reconhecendo a mão do Senhor nesse bom amigo. Tenhamos gratidão porque alguém se interessou de verdade por nós. Aliás, Jesus disse claramente: nisso vos reconhecerão como meus discípulos, se vos amardes uns aos outros.

O importante é colocar-se de acordo no bem. Deve sobressair o amor fraterno, o ágape, pois, “não fiqueis devendo nada a ninguém, a não ser o amor mútuo, pois quem ama o próximo está cumprindo a Lei” (Rm 13,8). Isto vale também para a correção individual entre irmãos… Santo Agostinho aplicou exatamente à correção fraterna as palavras de São Paulo sobre a caridade: “Ama e faze o que queres. Seja que cales, cala por amor; seja que fales, fala por amor; seja que corrijas, corrige por amor; seja que perdoes, perdoa por amor. Esteja em ti a raiz do amor, porque desta raiz não pode nascer outra coisa a não ser o bem”.

A correção, quando é evangélica, é talvez a manifestação mais genuína do amor fraterno. Ela exclui qualquer desejo de vingança ou ostentação pessoal e é movida unicamente pelo desejo do bem do outro. “Se teu irmão pecar contra ti, vai corrigi-lo, mas em particular, a sós, contigo!” Esta primeira palavra se refere ao âmbito privado, à correção como deve acontecer nas relações interpessoais. A regra de Jesus vale, por isso, também na vida familiar, entre amigos, no ambiente onde passamos nossa vida cotidiana. Se teu irmão pecar contra ti […] pode significar também: se teu marido, se teu filho, se teu cunhado e se teu patrão erram. Dir-se-ia que, finalmente, nos deparamos com um mandamento do Evangelho fácil e agradável. O que existe de mais natural do que perceber as culpas dos outros? Ao invés, se trata de uma das coisas mais difíceis e isto explica por que seja tão rara, nos relacionamentos humanos, a verdadeira correção fraterna. Jesus não encoraja a caça aos defeitos alheios, a maledicência ou aquela propensão tão frequente de tornar públicos os defeitos do próximo, embora fingindo estar talvez hipocritamente tristes pelo mal que produzem contra a virtude. O importante é distinguir a pessoa e os seus atos errados. As ações erradas devem ser condenadas; os que cometeram essas ações devem ser vistos como irmãos, a quem se deve amar. Amar mesmo não é fácil. Se fosse fácil, não seria mandamento, ordem.

Um outro aspecto importante para observar é o valor da oração em comunidade, em família.

“ De novo, eu vos digo: se dois de vós estiverem de acordo na terra sobre qualquer coisa que quiserem pedir, isso lhes será concedido por meu Pai que está nos Céus. Pois, onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, Eu estou aí, no meio deles”(Mt 18,19-20). Certamente a oração pessoal é importante, aliás, indispensável, mas o Senhor garante a sua Presença à comunidade que – mesmo se for pequena – está unida e é unânime, porque reflete a própria realidade de Deus Uno e Trino, comunhão perfeita de amor. Orígenes dizia que “nos devemos exercitar nesta sinfonia” (Comentário ao Evangelho de Mateus 14,1), ou seja, nesta concórdia no âmbito da comunidade cristã.

A Igreja viveu desde sempre a prática da oração em comum: “Enquanto Pedro era mantido na prisão, a Igreja orava continuamente a Deus por ele” (At. 12,5). De modo particular, é muito agradável ao Senhor a oração que a família faz em comum!

“A oração familiar, ensina São João Paulo II, tem como conteúdo original a própria vida de família: alegrias e dores, esperanças e tristezas, nascimento e festas de anos, aniversário de casamento dos pais, partidas, ausências e regressos, escolhas importantes e decisivas, a morte de pessoas queridas, etc., assinalam a intervenção do amor de Deus na história da família, assim como devem marcar o momento favorável para a ação de graças, para a súplica, para o abandono confiante da família ao Pai comum que está nos Céus. A dignidade e a responsabilidade da família cristã, como Igreja doméstica, só podem ser vividas com a ajuda incessante de Deus, que será concedida, sem falta, a todos os que a implorarem com humildade e confiança na oração.” (Exortação Apostólica Familiaris Consortio, 59).

A oração em comum comunica uma particular fortaleza a toda a família, pois fomenta o sentido sobrenatural, que permite compreender o que acontece ao nosso redor e no seio do lar, e nos ensina a ver que nada é alheio aos planos de Deus: Ele se mostra sempre como um Pai que nos diz que a família é mais sua do que nossa!

“Onde há caridade e amor, ali está Deus”. Quando nós, cristãos, nos reunimos para orar, Cristo encontra-se entre nós. Ele escuta com prazer essa oração alicerçada na unidade. Assim faziam também os Apóstolos: ”Todos eles perseveravam na oração em comum, junto com algumas mulheres –  entre elas, Maria, mãe de Jesus – e com os irmãos dele” (At 1,14). Era a nova família de Cristo.

Em família, no mês da Bíblia e sempre, intensifiquemos a leitura orante da Bíblia!

Outra fórmula de oração, que é um belo ato de piedade e de oração familiar, por excelência, é o terço. Ensina São João Paulo II: ”A família cristã encontra-se e consolida a sua identidade na oração. Esforçai-vos por dispor todos os dias de um tempo para dedicá-lo juntos a falar com o Senhor e a escutar a sua voz. Que bonito quando numa família se reza, ao anoitecer, nem que seja uma só parte do Rosário! Uma família que reza unida permanece unida, uma família que ora é uma família que se salva.

A Igreja quis conceder inúmeras graças e indulgências aos que rezam o terço em família. Esforcemo – nos por fomentar esta oração tão grata ao Senhor e à sua Santíssima Mãe, e que é, no dizer de São João XXlll, “uma grande oração pública e universal em face das necessidades ordinárias da Igreja santa, das nações e do mundo inteiro”.  É um bom ponto de apoio para a unidade familiar e a melhor ajuda para enfrentar as necessidades de toda a família.

Comportai-vos de tal maneira que as vossas casas sejam lugares de fé cristã e de virtude, mediante a oração em comum”.

“Estarei no meio deles”, diz Jesus. Tratando-se da correção fraterna através dos meios indicados por Jesus, quando a mesma não for possível, ainda poderá ser possível pela Oração, feita em comum, em nome de Jesus.

Peçamos a Deus para que nos ensine esta difícil forma de amor que sabe corrigir sem desencorajar e lutar sem ofender. Devemos exercitar-nos quer na correção fraterna, que exige muita humildade e simplicidade de coração, quer na oração, para que se eleve a Deus de uma comunidade deveras unida em Cristo. Peçamos tudo isto por intercessão de Maria Santíssima, Mãe da Igreja.

 Mons. José Maria Pereira

Facebook
Twitter
LinkedIn

Biblioteca Presbíteros