Homilia do Mons. José Maria – XI Domingo do Tempo Comum – Ano B

Um Convite à Serenidade, à Esperança, à Confiança, à Paciência!

As duas Parábolas de Jesus, a Semente e o Grão de Mostarda (Mc 4, 26-34), mostram que o Reino de Deus não é obra dos homens, é obra de Deus, e que a comunidade cristã deve ter confiança total na ação de Deus.

A primeira parábola convida à serenidade e à confiança, lembra que o resultado final não depende dos esforços e da habilidade do ser humano. O Reino de Deus é iniciativa divina: quer o camponês durma, quer esteja acordado, a semente que é lançada na terra germina e cresce sozinha. O homem semeia com a confiança de que o seu trabalho não será infecundo. O que sustém o agricultor na sua labuta quotidiana é precisamente a confiança na força da semente e na bondade do terreno. Esta parábola evoca o Mistério da Criação e da Redenção, da obra fecunda de Deus na História. Ele é o Senhor do Reino, o homem é o seu colaborador humilde, que comtempla e rejubila com a obra criadora divina e dela espera pacientemente os frutos. A narração final faz-nos pensar na intervenção conclusiva de Deus no fim dos tempos, quando Ele realizará plenamente o seu Reino. O tempo presente é época de sementeira, e o crescimento da semente é garantido pelo Senhor. Então, cada cristão sabe bem que deve fazer tudo aquilo que pode, mas que o resultado final depende de Deus: esta consciência ampara-o no cansaço de cada dia, de maneira especial, nas situações mais difíceis. A este propósito, Santo Inácio de Loyola escreve: “Age como se tudo dependesse de ti, mas consciente de que na realidade, tudo depende de Deus”.  

“O Reino de Deus é como um grão de mostarda que, ao ser semeado na terra, é a menor de todas as sementes da terra. Quando é semeado, cresce e se torna maior do que todas as hortaliças, e estende ramos tão grandes, que os pássaros do céu podem abrigar-se à sua sombra” (Mc 4, 31-32).

A segunda parábola convida à esperança, à confiança e à paciência, mostra o contraste entre a pequenez da semente e a grandeza da árvore (nas margens do lago da Galileia, alcançava uma altura de 2 a 4m).  O anúncio de Jesus pode parecer uma realidade pequena e insignificante, mas atingirá todos os cantos do mundo. Pode apresentar-se com sinais de debilidade e pequenez aos olhos do mundo, mas tem força irresistível. A fé convida a olhar para a vida e para o mundo com confiança e esperança, mesmo num tempo histórico marcado por crises e por inquietações.

Importa, pois, que o ser humano seja a terra boa, colaborando com a graça de Deus.

A vida terrena, passageira, frágil, instável e mortal, é um exílio, caracterizado por um conhecimento parcial de Deus: é o tempo da fé. São Paulo anseia pelo tempo da visão, isto é, pelo encontro face a face com Deus. Então, a vida caduca e transitória dará lugar a uma vida gloriosa e indestrutível. O cristão deve estar consciente de que o Reino de Deus, embora já presente na história, só atingirá a plena realização no final dos tempos, quando recebermos de Deus a glória eterna, no corpo e na alma.

O Senhor escolheu um punhado de homens para instaurar o seu reinado no mundo. A maioria deles eram humildes pescadores, de pouca cultura, cheios de defeitos e sem meios materiais: “o que é fraco no mundo, Deus o escolheu para confundir os fortes” (1Cor 1, 27). Considerando humanamente, é incompreensível que esses homens tivessem chegado a difundir a doutrina de Cristo por toda a terra, em tempo tão curto e tendo que enfrentar tantos obstáculos e contradições.

Com a parábola do grão de mostarda -comenta São João Crisóstomo, o Senhor moveu- os à fé e fez-lhes ver que a pregação do Evangelho se propagaria apesar de todas as dificuldades.

Nós também somos esse grão de mostarda em relação à tarefa que o Senhor nos confia no meio do mundo. Não devemos esquecer a desproporção entre os meios ao nosso alcance — os nossos poucos talentos — e a vastidão do apostolado que devemos realizar; mas também não podemos esquecer que sempre teremos a ajuda do Senhor. Surgirão dificuldades, e então seremos mais conscientes da nossa insignificância e não teremos outro remédio senão confiar mais no Mestre e no caráter sobrenatural da obra que nos encomenda.

Ensina São Josemaria Escrivá: “Nas horas de luta e contradição, quando talvez “os bons” encham de obstáculos o teu caminho, levanta o teu coração de apóstolo; ouve Jesus que fala do grão de mostarda e do fermento. E diz-Lhe: “Explica-me a parábola”.  E sentirás a alegria de contemplar a vitória futura: aves do céu à sombra do teu apostolado, agora incipiente; e toda a massa fermentada” (Caminho, 695).

Se não perdermos de vista a nossa pouca valia e a ajuda da graça, permaneceremos sempre firmes e fiéis, e saberemos corresponder às expectativas do Senhor em relação a cada um de nós. Com Ele, podemos tudo!

As parábolas da semente e do grão de mostarda, ainda que sejam um apelo à humanidade, único terreno apto para o desenvolvimento do Reino de Deus, são, também, um convite a um otimismo, baseado na eficácia infalível da ação divina.

Mesmo quando os homens estão pervertidos, ao ponto de negar a Deus e de O considerar “morto”, vivendo como se não existisse, Ele está sempre presente e atuante na história humana e continua a espalhar a semente do Seu Reino.

A própria Igreja, que colabora nesta sementeira, não vê, a maior parte das vezes, os seus frutos; mas é certo que um dia amadurecerão as espigas. Porém, é preciso esperar com paciência a hora marcada por Deus, como o lavrador, sem inquietação, espera que passe o inverno e que o grão germine. E se isso serve para a Igreja, deve servir também para cada um em particular, porque no coração do homem se desenvolve, ocultamente, o Reino de Deus e a santidade. Por isso, não deve haver lugar para desânimos, se, depois de esmerados esforços, um se encontra fraco e defeituoso. É preciso perseverar no esforço, mas confiando apenas em Deus, porque somente Ele pode tornar eficaz a ação do homem.

O anúncio do Evangelho, feito na maioria das vezes entre os companheiros de trabalho ou entre os vizinhos, significou, nos primeiros tempos, uma mudança radical de vida e a salvação eterna para famílias inteiras. Para muitos, porém, foi escândalo e, para muitos, loucura: “nós pregamos Cristo crucificado, escândalo para os judeus e loucura para os gentios” (1Cor 1, 23). 

Que o Senhor nos dê forças para sermos cristãos autênticos, vivendo a fé que professamos, em todos os momentos e situações da vida. Serão ocasiões para mostrarmos o nosso amor a Deus, deixando de lado os respeitos humanos, a opinião do ambiente, etc; “Com efeito, Deus não nos deu um espírito de covardia, mas de fortaleza, de amor e de moderação. Portanto, não te envergonhes de testemunhar a favor de nosso Senhor, nem te envergonhes de mim, seu prisioneiro; mas, sustentado pela força de Deus, sofre comigo pelo Evangelho” (2Tm 1 ,7-8).

Somos convidados a continuar semeando com fé e confiança. A força vital de Deus age, garantindo o sucesso da colheita, da Missão. Os frutos não dependem de quem semeou, mas da força da semente. O crescimento do Reino depende da ação gratuita de Deus.

Deus vale-se do pouco para as suas obras.

Nunca nos faltará também a sua ajuda.

E, também, nós encontraremos, na Cruz, o poder e a valentia de que necessitamos. Olhamos para a Virgem Maria: “ Quando ocorreu a debandada dos Apóstolos e o povo embravecido rasga as gargantas em ódio a Jesus Cristo, Santa Maria segue de perto o seu Filho pelas ruas de Jerusalém. Não a arreda o clamor da multidão, nem deixa de acompanhar o Redentor enquanto todos os do cortejo, no anonimato, fazem-se, covardemente, valentes para maltratar Cristo.  

Invoca – a com força: Virgem fiel! –, e pede-lhe que os que nos dizemos amigos de Deus, o sejamos deveras e a todas as horas.” (São Josemaria Escrivá, Sulco,51).

  A imagem da semente é particularmente querida a Jesus, porque expressa bem o Mistério do reino de Deus. Nas duas parábolas de hoje, ele representa um “crescimento” e um “contraste”: o crescimento que se verifica graças a um dinamismo inato na própria semente e o contraste que existe entre a pequenez da semente e a grandeza daquilo que ela produz. A mensagem é clara: Não obstante exija a nossa colaboração, o Reino de Deus é antes de tudo um Dom do Senhor, Graça que precede o homem e suas obras. A nossa pequena força, aparentemente impotente diante dos problemas do mundo, se for introduzida na Força de Deus, não teme obstáculos, porque a vitória do Senhor é certa. É o milagre do Amor de Deus que faz germinar e crescer cada semente de bem espalhada na Terra. E a experiência deste milagre de amor leva-nos a ser otimistas, apesar das dificuldades, dos sofrimentos e do mal que nós encontramos. A semente germina e cresce, porque é o amor de Deus que nos faz crescer.

São Paulo recorda-nos: “Todos devemos comparecer perante o tribunal de Cristo, para cada um receber a devida recompensa do que tiver feito, de bem ou de mal, por meio do corpo” (2Cor 5,10). A vida plena que nos espera para além desta terra deve fundamentar e iluminar o compromisso e a fidelidade a Jesus, enquanto caminhamos neste mundo finito e transitório. Aos cristãos cabe viver à luz da fé e assumir as suas responsabilidades, com a certeza de que seremos ajudados pelo Senhor de uma maneira muito eficaz. Assim poderemos chegar ao final que nos espera: a união definitiva com Cristo na vida eterna.

Jesus continua a dizer-nos: “Coragem, não tenhais medo, eu venci o mundo. E São Paulo: Quem poderá nos separar do amor de Deus? Se Deus está conosco, quem poderá contra nós?”

A Virgem Maria, que acolheu como “terra boa” a semente da Palavra divina, fortaleça em nós esta fé e esta esperança!   

Mons. José Maria Pereira

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