Homilia do Mons. José Maria – Solenidade de Cristo Rei

O Destino Último Que Nos Espera!

Com a Solenidade de Cristo, Rei do Universo, encerramos o Ano Litúrgico. No próximo domingo será o primeiro domingo do Advento, um novo Ano Litúrgico; início da preparação para o Natal. Ainda que as festas da Epifania, Páscoa e Ascensão sejam também festas de Cristo Rei e Senhor de todas as coisas criadas, a festa de hoje foi especialmente instituída para nos mostrar Jesus como único soberano de uma sociedade que parece querer viver de costas para Deus.

Estamos acostumados a ver Cristo na Cruz. Na sua posição de entrega por amor, de vítima pelos nossos pecados. Porém, corremos o risco de imaginá – lo sempre na Cruz, permanentemente na Cruz, parecendo, senão um derrotado, como que imóvel e impotente diante do mal no mundo, diante do mal em nós. Acostumados com o julgamento e condenação de Cristo por parte dos homens, esquecemo-nos do julgamento que Ele fará dos homens e da História.

Jesus veio ao mundo para buscar e salvar o que estava perdido; veio em busca dos homens dispersos e afastados de Deus pelo pecado. E como estavam feridos e doentes, curou-os e vendou-lhes as feridas. Tanto os amou que deu a vida por eles. Como Rei, vem para revelar o amor de Deus, para ser o Mediador da Nova Aliança, o Redentor do homem. No Prefácio da Missa fala-se de Jesus que ofereceu ao Pai “um reino de verdade e de vida, de santidade e de graça, de justiça, de amor e de paz”.

Assim é o Reino de Cristo, do qual somos chamados a participar e que somos convidados a dilatar mediante um apostolado fecundo. O Senhor deve estar presente nos nossos familiares, amigos, vizinhos companheiros de trabalho… “Perante os que reduzem a religião a um cúmulo de negações, ou se conformam com um catolicismo de meias-tintas; perante os que querem por o Senhor de cara contra a parede, ou colocá-Lo num canto da alma…, temos de afirmar, com as nossas palavras e com as nossas obras, que aspiramos a fazer de Cristo um autêntico Rei de todos os corações…, também dos deles” (São Josemaria Escrivá, Sulco, nº 608).

Disse São João Paulo II: “A Igreja tem necessidade sobretudo de grandes correntes, movimentos e testemunhos de santidade entre os fiéis, porque é da santidade que nasce toda a autêntica renovação da Igreja, todo o enriquecimento da fé e do seguimento cristão, uma reatualização vital e fecunda do cristianismo com as necessidades dos homens, uma renovada forma de presença no coração da existência humana e da cultura das nações”.

Continua São João Paulo ll ao encerrar o Jubileu do Ano 2000: “Terminando o Jubileu, retoma-se o caminho comum; no entanto, apontar a santidade permanece mais que nunca uma urgência da pastoral. Em primeiro lugar, não hesito em dizer que o horizonte para o qual deve tender todo caminho pastoral é a santidade.

Assim, é preciso redescobrir, em todo seu valor programático, o capítulo V da Constituição Dogmática Lumem Gentium, intitulado “Vocação universal à santidade.”

Professar a Igreja como santa significa apontar seu rosto de Esposa de Cristo, que a amou, entregando-se por ela precisamente para a santificar (Ef 5, 25-26). Este dom de santidade, por assim dizer, objetiva, é oferecido a cada batizado.

Por sua vez, o dom se traduz num dever que deve dirigir toda a existência cristã: ““Esta é a vontade de Deus: a vossa santificação.” (1Ts 4,3). É um compromisso que diz respeito não apenas a alguns, pois os cristãos de qualquer estado ou ordem são chamados à plenitude da vida cristã e à perfeição da caridade” (S. João Paulo II, Carta Apostólica Novo Millennio Ineunte, 30)

A atitude do cristão não pode ser de mera passividade em relação ao reinado de Cristo no mundo. Nós desejamos ardentemente esse reinado. É necessário que Cristo reine em primeiro lugar na nossa inteligência, mediante o conhecimento da sua doutrina e o acatamento amoroso dessas verdades reveladas. É necessário que reine na nossa vontade, para que se identifique cada vez mais plenamente com a vontade divina. É necessário que reine no nosso coração, para que nenhum amor se anteponha ao amor de Deus. É necessário que reine no nosso corpo, templo do Espírito Santo; no nosso trabalho profissional, caminho de santidade… Convém que Ele reine!” (Papa Pio XI).

Cristo é um Rei que recebeu todo o poder no Céu e na terra, e governa sendo manso e humilde de coração, servindo a todos, porque não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida para a redenção de muitos.

O texto do profeta Ezequiel salienta o amor de Cristo-Rei, que veio estabelecer o seu reinado, não com a força de um conquistador, mas com a bondade e a mansidão do Pastor: “Assim diz o Senhor Deus: “Vede! Eu mesmo vou procurar minhas ovelhas e tomar conta delas. Como o pastor toma conta do rebanho, de dia, quando se encontra no meio das ovelhas dispersas, assim vou cuidar de minhas ovelhas e vou resgatá-las de todos os lugares em que foram dispersadas num dia de nuvens e escuridão” (Ez 34, 11-12).

São Paulo ensina que a soberania de Cristo sobre toda a criação cumpre-se agora no tempo, mas alcançará a sua plenitude definitiva depois do Juízo universal. “É necessário que Ele reine…” (1Cor 15,25).

O Evangelho (Mt 25, 31-46) mostra que há um discernimento, um juízo. Jesus que tinha sempre falado do Bom-Pastor que “reúne” as ovelhas num só rebanho (Jo 10,16), agora fala do Pastor que “separa” ovelha de outra ovelha e forma dois rebanhos eternos: um para os carneiros e outro para as ovelhas. O Pastor deixa o lugar ao Rei-Juiz que senta “no trono de sua glória.”

Creio que o pensamento central seja este. Nossa vida se divide em dois tempos: o primeiro, aqui neste mundo, onde estamos vivendo. Nele encontramos Cristo como “Bom-Pastor”; a decisão depende de nós; é o que São Paulo chama o tempo propício ou o dia da salvação (2Cor 6,2). Chegará, porém, o momento em que se atravessará uma porta e se entrará numa nova fase: aquela em que se encontrará Cristo como juiz, em que a decisão não estará mais em nossas mãos, em que não haverá mais tempo para debate ou defesa, mas somente para sentença. Deixemos que Cristo reine em nossa vida! Deus não criou o mundo para uma espécie de jogo de se correr atrás, no qual nada é sério e nada é definitivo. “Lá onde a árvore cai, ali fica.” (Ecl 11,3); atrás não se volta, nem para informar os próprios irmãos, como queria fazer o rico avarento (Lc 16,27). Daí o absurdo da reencarnação pregada pelo Espiritismo: “O homem morre uma só vez, e logo em seguida vem o juízo” (Hb 9,27).

Nosso Senhor apresenta o destino último que nos espera, o desenlace da História da Humanidade, e convida à escolha decisiva. A cena não é uma descrição fotográfica do que vai acontecer no final dos tempos: é instrução sobre os critérios e a lógica de Deus. No critério do julgamento, o rei glorioso se identifica com os necessitados. Ele não aprova uma vida conduzida por critérios de egoísmo, onde não há lugar para o amor ao próximo – um amor efetivo –, particularmente ao mais fraco.

Diz-nos a Palavra de Deus: “Animai-vos mutuamente cada dia durante todo o tempo compreendido na palavra hoje, para não acontecer que alguém se torne empedernido com a sedução do pecado” (Hb 3,13).

Agora, portanto, Cristo é para nós ainda o bom pastor cantado por Ezequiel (Ez 34,11-17).

Ao mesmo tempo, pedimos-lhe que nos reforce a vontade de colaborar na tarefa de estender o seu reinado ao nosso redor e em tantos lugares em que ainda não o conhecem.

“Venha a nós o vosso Reino”.

Que esse Reino venha de fato ao nosso coração e ao coração de todos os homens: Reino de Verdade e de Vida; Reino de Santidade e de Graça; Reino de Justiça, de Amor e de Paz…

Queremos que Jesus reine em nossa família, na sociedade, no mundo. Devemos rezar, e muito: Venha a nós o vosso reino! Mas a atitude do cristão não pode ser passiva. A festa de hoje nos chama a semearmos a paz, a justiça, a fraternidade, o perdão, a caridade e a santidade.

Sejamos mensageiros desse Reino, na família, na rua, na sociedade, no ambiente de trabalho… E, que Maria, a Mãe Santa do nosso Rei, Rainha da Paz, Rainha do nosso coração, cuide de nós como, somente Ela o sabe fazer!

Mons. José Maria Pereira

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