Maria é Concebida sem Pecado! É Cheia de Graça.
Hoje, a Igreja celebra, solenemente, a concepção imaculada de Maria!
No caminho do Advento, preparando-nos para o Natal, brilha a estrela de Maria Imaculada, “sinal certo de esperança e de conforto” (Concílio Vat. ll, LG,68). Para chegar a Jesus, luz verdadeira, sol que dissipou todas as trevas da História, precisamos de luzes próximas de nós, pessoas humanas que reflitam a luz de Cristo e iluminam assim o caminho a percorrer. E qual pessoa é mais luminosa do que Maria? Quem pode ser para nós estrela de esperança melhor do que ela, aurora que anunciou o dia da salvação (Enc. Spe Salvi, 49)? Por isso, a liturgia faz –nos celebrar, hoje, na proximidade do Natal, a festa solene da Imaculada Conceição de Maria: o Mistério da Graça de Deus que envolveu, desde o primeiro momento da sua existência, a criatura destinada a tornar-se a Mãe do Redentor, preservando-a do contágio do pecado original. Olhando para ela, reconhecemos a altura e a beleza do projeto de Deus para cada homem: tornarem-se santos e imaculados no amor (Ef 1,4), à imagem do nosso Criador.
Em Maria, a Palavra de Deus encontra escuta, recepção e resposta, encontra aquele “Sim” que lhe permite encarnar e vir habitar no meio de nós. Em Maria, a Humanidade e a História abrem-se realmente a Deus, acolhem a sua Graça e estão dispostas a cumprir a sua vontade. Maria é a expressão genuína da Graça.
Portanto, celebramos, hoje, uma das festas mais bonitas e populares da Virgem Maria: a Imaculada Conceição. Maria não só não cometeu pecado algum, mas foi preservada até da herança comum do gênero humano, que é o pecado original. E isso devido à missão para a qual Deus a destinou desde o início: ser a Mãe do Redentor. Tudo isso está contido na verdade da fé da “Imaculada Conceição”. O fundamento bíblico deste dogma encontra-se nas palavras que o Anjo dirigiu à jovem de Nazaré: “Alegra-te, cheia de Graça, o Senhor está contigo!” (Lc1, 28).
“Cheia de Graça”: É o nome mais bonito de Maria, nome que lhe foi conferido pelo próprio Deus, para indicar que ela é, desde sempre e para sempre, a amada, a eleita, a predestinada para acolher o Dom mais precioso, Jesus, “o Amor Encarnado de Deus” (Enc. Deus Caritas est,12).
A expressão “cheia de Graça” indica a obra maravilhosa do amor de Deus, que quis restituir-nos a vida e a liberdade, perdidas com o pecado, mediante o seu Filho Unigênito, encarnado, morto e ressuscitado. Por isso, a partir do século ll, no Oriente e no Ocidente, a Igreja invoca e celebra a Virgem que, com o seu “Sim”, aproximou o Céu da Terra, tornando-se “geradora de Deus e nutriz da nossa vida”, como se exprime São Romano, o Melode, num antigo cântico (Canticum XXV in Nativitatem B. Mariae Virginis).
Que dom grandioso ter, como Mãe, Maria Imaculada! Uma Mãe resplandecente de beleza, transparente ao amor de Deus: a Mulher predestinada para ser a Mãe do Redentor, Mãe d’Aquele que se humilhou até ao extremo para nos reconduzir à nossa originária dignidade. Esta Mulher, aos olhos de Deus, desde sempre, tem um rosto e um nome: “cheia de Graça” (Lc 1, 28), como foi chamada pelo Anjo que a visitou em Nazaré. É a nova Eva, esposa do novo Adão, destinada a ser mãe de todos os remidos. Assim escrevia Santo André de Creta: “A Theotókos Maria, o refúgio comum de todos os cristãos, foi a primeira a ser libertada da primitiva queda dos nossos progenitores” (Homilia lV sobre a Natividade, 97, 880). E a liturgia de hoje afirma que Deus “preparou uma digna morada para o seu Filho e, em previsão de sua Morte, preservou-a de toda a mancha de pecado” (Oração da Coleta).
Dizer que Maria é Imaculada, significa que ela, desde o primeiro instante de sua existência – no momento de sua concepção -, foi isenta do pecado original. Ensina o Concílio Vaticano II: “A Mãe de Jesus, dando à luz do mundo a própria Vida que tudo renova… foi adornada por Deus com dons dignos de uma tão grande missão… enriquecida desde o primeiro instante da sua conceição, com os esplendores de uma santidade singular” (LG 56). A saudação do Arcanjo Gabriel: “Alegra-te, cheia de graça, o Senhor está contigo!” (Lc 1,28), constitui o mais válido testemunho da conceição imaculada de Maria, pois não seria “cheia de graça”, em sentido pleno, se o pecado a tivesse manchado, ainda que fosse por um instante apenas.
A Igreja reza e ensina: “Ó Deus, que preparastes uma digna habitação para o vosso Filho, pela Imaculada Conceição da Virgem Maria, preservando-a de todo o pecado em previsão dos méritos de Cristo…”.
Deus preparou aquela que seria a Mãe do seu Filho com todo o seu Amor infinito.
Maria não se coloca somente numa relação singular com Cristo, o Filho de Deus que, como homem, quis tornar-se seu filho. Permanecendo totalmente unida a Cristo, Ela pertence, também, de modo integral, a nós. Sim, podemos dizer que Maria está próxima de nós como nenhum outro ser humano, porque Cristo é homem para os homens, e todo o seu ser é um “ser para nós”. Como Cabeça, dizem os Padres da Igreja, Cristo é inseparável do seu Corpo que é a Igreja, formando juntamente com ela, por assim dizer, um único sujeito vivo. A Mãe da Cabeça é também a Mãe de toda a Igreja; ela é, por assim dizer, totalmente despojada de si mesma; entregou-se inteiramente a Cristo e, com Ele, é entregue como dom a todos nós. Com efeito, quanto mais a pessoa humana se entrega, tanto mais se encontra a si mesma.
Disse São João Paulo II: “Na Virgem puríssima, resplandecente, fixamos os nossos olhos, como a Estrela que nos guia pelo céu escuro das expectativas e incertezas humanas, especialmente neste dia em que, sobre o fundo da liturgia do Advento, brilha esta solenidade anual da tua Imaculada Conceição e te contemplamos na eterna economia divina como Porta aberta através da qual deve vir o Redentor do mundo” (Alocução, 8 -12-1982)
A festa da Imaculada toca-nos profundamente se a compreendemos à luz das palavras de São Paulo: “Deus nos escolheu, em Cristo, antes da fundação do mundo, para que sejamos santos e irrepreensíveis sob o seu olhar, no amor” (Ef 1,4).
Entre os antigos cantores, da beleza espiritual da Mãe de Deus, sobressai São Bernardo, afirmando que a invocação: “Ave Maria, cheia de Graça” é “agradável a Deus, aos anjos e aos homens. Aos homens, graças à maternidade; aos anjos, graças à virgindade; e a Deus, graças à humildade” (Sermo XLVll, De Annuntiatione Dominica, Roma 1970, 266). O diálogo entre o anjo Gabriel e a Virgem (Ave, Cheia de Graça: o Senhor está contigo) revela a identidade mais profunda de Maria, o “nome”, por assim dizer, com que o próprio Deus a conhece: “cheia de Graça”. Essa expressão, que nos é tão familiar, desde a infância, porque a pronunciamos todas as vezes que recitamos a “Ave-Maria”, oferece-nos a explicação do mistério que hoje celebramos. De fato, Maria, desde o momento em que foi concebida pelos seus pais, foi objeto de uma singular predileção da parte de Deus, o qual, no seu desígnio eterno, escolheu-a para ser a Mãe do seu Filho, feito homem, e, por conseguinte, preservou-a do pecado original. Por isso, o Anjo dirige-se a ela com este nome, que literalmente significa: “desde o início cheia do Amor de Deus” e da sua Graça.
O mistério da Imaculada Conceição é fonte de luz interior, de esperança e de conforto. No meio das provações da vida e, sobretudo das contradições que o homem experimenta dentro de si e à sua volta, Maria, Mãe de Cristo, diz-nos que a Graça é maior que o pecado, que a misericórdia de Deus é mais poderosa que o mal, e sabe transformá-lo em bem.
Todos somos chamados a ser santos e irrepreensíveis; é o nosso mais verdadeiro destino; é o projeto de Deus para nós!
Maria é o modelo de santidade para todos nós! Nós não nascemos imaculados como Maria nasceu, por singular privilégio de Deus; o mal, pelo contrário, está em todas as nossas fibras e nas mais variadas formas. Estamos cheios de rugas: ruga é nossa preguiça, ruga é a nossa soberba, ruga é a nossa sensualidade desordenada, que torna o espírito tão refratário à visita de Deus. Eliminar essas rugas e purificar-nos é trabalho de toda a existência: trabalho difícil e extenuante; mas, indispensável, já que nada de impuro pode comparecer diante de Deus.
Maria está diante de nós, como um auxílio poderoso, neste trabalho de purificação e de recuperação da imagem de Deus. Maria é modelo de santidade.
Sem dúvida, foi o Espírito Santo quem ensinou, em todas as épocas, que é mais fácil chegar ao Coração do Senhor, por meio de Maria. Por isso, temos de fazer o propósito de buscar sempre um trato muito íntimo com a Virgem, de caminhar por esse atalho para chegarmos antes a Cristo: “conservai zelosamente esse terno e confiado amor à virgem. Não o deixeis esfriar nunca… Sedes fiéis aos exercícios de piedade mariana tradicionais na Igreja: a oração do Angelus, o mês de Maria e, de modo muito especial, o Rosário”, anima-nos São João Paulo II.
Se cumprirmos o nosso propósito de recorrer com mais frequência à Virgem, desde o dia de hoje, verificaremos que “Nossa Senhora é descanso para os que trabalham, consolo dos que choram, remédio para os enfermos, porto para os que se encontram no meio da tempestade, perdão para os pecadores, doce alívio dos tristes, socorro para os que rezam” (São João Damasceno). Guie-nos a Virgem Maria a uma verdadeira conversão do coração, para que possamos fazer as opções necessárias para sintonizar as nossas mentalidades com o Evangelho.
A festa da Imaculada, que hoje celebramos, ilumina, como um farol, o tempo do Advento, que é tempo de vigilante e confiante expectativa do Salvador. Enquanto nos encaminhamos ao encontro do Deus que vem, olhamos para Maria que “brilha como sinal de esperança segura e de consolação aos olhos do Povo de Deus peregrino” (Lumen Gentium, 68).
Ao dirigir o olhar para Nossa Senhora, como não deixar que ela desperte em nós, seus filhos, a aspiração pela beleza, pela bondade e pela pureza do coração? A sua pureza celestial leva-nos para Deus, ajudando-nos a superara tentação de uma vida medíocre, feita de compromissos com o mal, para orientarmo-nos decididamente para o bem autêntico, que é fonte de alegria.
Caríssimos, em Maria Imaculada, contemplamos o reflexo da Beleza que salva o mundo: a beleza de Deus que resplandece sobre a face de Cristo. Em Maria, essa beleza é totalmente pura, humilde, livre de qualquer soberba e presunção.
Mons. José Maria Pereira.