Homilia do D. Henrique Soares da Costa – II Domingo do Tempo Comum – Ano B

1Sm 3,3b-10.19
Sl 39
1Cor 6,13c-15a.17-20
Jo 1,35-42

Caríssimos em Cristo, após as santas festas do Tempo do Natal do Senhor, estamos iniciando o Tempo Comum. Terminada ontem a primeira semana deste tempo “verde”, entramos hoje no Segundo Domingo chamado Comum: comum do dia-a-dia, da vida miúda, vivida na presença do Senhor que está sempre presente na sua Igreja na potência do seu Espírito Santo, dando vigor à Palavra e eficácia aos sacramentos.

A Escritura que escutamos nesta Missa falou-nos de um Deus que chama, que entra na nossa vida e nos dirige o seu apelo. Foi assim com Samuel que, novinho, sequer sabia reconhecer a voz do Senhor; foi assim com os primeiros discípulos, traspassados pela palavra do Batista que, apresentando o Cordeiro de Deus, quase que forçava aqueles dois, André e Tiago, a seguirem Jesus. E lá vão eles: “Rabi, onde moras? Onde tens tua vida?” E Jesus os convida: “Vinde e vereis! Somente se tiverdes a coragem de virdes comigo, de comigo permanecerdes, podereis ver de verdade!” Não é impressionante, quase que inacreditável, caríssimos, que Deus nos conheça pelo nome, que o Senhor nos chame e nos queira parceiros seus no caminho da vida? E, no entanto, é assim! Também nós somos conhecidos pelo nome, nossos passos, nosso coração, nossa vida, são conhecidos pelo Senhor… E ele nos chama com amor. A nós, que estamos procurando a felicidade e a realização na vida, o Senhor também dirige a pergunta: “O que estais procurando?” Vinde, caríssimos, fiquemos com o Senhor e encontraremos aquilo que nosso coração procura, aquilo que faz a vida valer a pena.

Mas, esse “estar com o Senhor”, esse “permanecer com ele”, que é o início da própria vida eterna já neste mundo, não pode se dar sem que realmente sejamos de Cristo, com todo o nosso ser, corpo e alma. Aqui aparece com toda clareza a urgência e atualidade da advertência de São Paulo, feita aos coríntios e a nós. Corinto era uma cidade particularmente devassa do Império Romano. E, como hoje, os cristãos eram tentados a “corintiar”, a entrarem na onda, achando tudo normal, moderno e compatível com a fé. O Apóstolo, em nome de Cristo, desmascara essa ilusão, tão comum entre os cristãos de hoje. Ouçamo-lo! É incômodo, é chato, mas é a Palavra de Deus, que nos ilumina, liberta e nos salva… Ouçamo-la! “O corpo não é para a imoralidade, mas para o Senhor, e o Senhor é para o corpo!” Eis cristão: teu corpo pertence ao teu Senhor Jesus Cristo que nele habita pela potência do seu Espírito Santo desde o dia do teu Batismo: “Porventura ignorais que vossos corpos são membros de Cristo? Ou ignorais que o vosso corpo é santuário do Espírito Santo, que habita em vós e que vos é dado por Deus? E, portanto, ignorais que não pertenceis a vós mesmos? Então, glorificai a Deus em vosso corpo!” Compreende, cristão! Tu pertences a Cristo, tu és sagrado porque no Batismo foste consagrado pelo Espírito de Cristo que habita em ti! Teu corpo foi lavado pela água, símbolo do Santo Espírito, foi ungido pelo óleo batismal, sinal da graça de Cristo, foi untado pelo santo Crisma, sinal da força e da energia do Espírito de Cristo; teu corpo foi alimentado com o Corpo do Senhor… Teu corpo é sagrado, cristão, teu corpo é santo, teu corpo pertence ao Senhor! “Portanto, ignorais que não pertenceis a vós mesmos? Então, glorificai a Deus em vosso corpo!” Solteiro ou casado, todos nós temos o dever sagrado, o dever de amor de fugir da imoralidade! À medida que o paganismo avança, perde-se o sentido cristão do corpo e da sexualidade! Tem-se a ideia de que o corpo é para o prazer, para a satisfação da libido; pensa-se que o corpo é uma coisa, um objeto de prazer, que a bel prazer pode ser usado… Isso pensam os pagãos, isso vivem os pagãos. Nós sabemos que não é assim: “O corpo é para o Senhor e o Senhor é para o corpo…” para este corpo, que será ressuscitado para a glória de Cristo!

Eis, caríssimos em Cristo, os pecados de hoje: a impureza (ou seja, a busca do prazer solitário e de atos e pensamentos sensuais que aguçam propositalmente o erotismo), a fornicação (isto é, o ato sexual antes do casamento com pessoas do mesmo ou do outro sexo) o adultério (ou seja, a relação fora do casamento). Nunca deveremos esquecer qual a verdade do Evangelho: o ato sexual somente é santo, responsável, bendito e plenamente agradável a Deus no casamento. Fora dele, é sempre um pecado – e esta regra não conhece nenhuma exceção! E mais: a vida sexual do casal deve ser santa. Como diz a Palavra do Senhor: “O matrimônio seja honrado por todos, e o leito conjugal, sem mancha; porque Deus julgará os fornicadores e os adúlteros” (Hb 13,4).

Caríssimos, o modo que os cristãos têm de vivenciar a sexualidade não pode ser o modo dos pagãos. Eles seguem seus caprichos, suas paixões… Nós, mesmo frágeis, mesmo com nossos instintos e tendências muitas vezes desordenados, por amor do Cristo que nos amou, temos o dever de lutar para colocar nossa sexualidade debaixo do senhorio de Cristo! Esse senhorio é mistério de cruz, mas também de ressurreição. Nós, que somos um só corpo com o Senhor pelo Batismo e a Eucaristia, nós que pelo Espírito Santo nos tornamos uma só coisa com o Senhor, de corpo e alma, não podemos pensar e viver nossa sexualidade como os pagãos! Então, jovem solteiro, jovem solteira, tua vida sexual, teu namoro, devem ser vividos à luz do Senhor Jesus! Casados cristãos, vossa vida conjugal não deve ser como a dos pagãos, sujeita e ditada simplesmente pela libido… Vossa sexualidade deve ser vivida na luz do Senhor! Homossexual cristão, vive tua tendência de modo cristão, lutando para seres casto, recorrendo à oração, completando corajosamente na carne da tua vida e da tua luta, aquilo que falta à paixão do Cristo. Procura viver dignamente, procura acompanhamento espiritual e coloca em Cristo a tua esperança e a tua alegria. Solteiro cristão, vive tua sexualidade na castidade e na continência por amor a Cristo! Padre, religioso, religiosa, tem coragem e generosidade para viveres o que prometeste a Cristo diante de toda a Igreja reunida no dia da tua profissão religiosa ou da tua ordenação sacerdotal! O Senhor nos pedirá contas, a todos nós! Ninguém está acima da Palavra, ninguém está acima do juízo do Cristo Jesus!

Talvez, caríssimos, alguns de vocês pensem como os judeus pensaram ao término do Discurso sobre o Pão da Vida: “Essa palavra é dura! Quem pode escutá-la?” (Jo 6,60). Pois bem, a nós, com doçura e também com firmeza o Senhor diz: “Isto vos escandaliza? Quereis também vós ir embora?” (Jo 6,61.67). Não é fácil, irmãos! Não somos melhores nem mais fortes que ninguém… Sentimos em nós pensamentos, afetos e desejos contraditórios… Mas, sabemos que Cristo nos chamou, nos amou e por nós entregou a vida. Então, que digamos como Pedro: “Senhor, a quem iremos? Tens palavra de vida eterna e nós cremos e reconhecemos que tu és o Santo de Deus” (Jo 6,69).

É isto, caríssimos, dizer na vida como Samuel disse: “Eis-me aqui”; é isto atender ao convite do Senhor: “Vinde e vereis”; é isto, finalmente, “ir ver onde ele mora e permanecer com ele”.  Que ele nos dê também a nós a sua graça! Amém.

  1. Henrique Soares da Costa
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