Homilia de Mons. José Maria Pereira – III Domingo de Páscoa – Ano C

Não brincar com Deus! Lançar a rede

A Palavra de Deus (At 5, 27- 41) apresenta o testemunho de Pedro em Cristo ressuscitado, diante do Sinédrio.

Proibido de dar testemunho de Jesus ressuscitado, Pedro repete novamente, com toda a franqueza, o anúncio da Ressurreição: “O Deus de nossos pais ressuscitou Jesus, a quem vós matastes, pregando-O numa Cruz” (At 5,30). Acaba de sair da prisão com os outros apóstolos, sabe que poderá ter que enfrentar piores dificuldades; mas não tem medo porque colocou já toda a sua confiança no Ressuscitado e compreendeu que tem de seguí-Lo nas tribulações. As suas palavras são reforçadas com uma notável afirmação: “Somos testemunhas destes fatos, nós e o Espírito Santo, que Deus concedeu àqueles que lhe obedecem” (At 5,32). É como se afirmasse que o Espírito Santo fala pela boca daqueles que, obedecendo a Deus, pregam o Evangelho enfrentando todos os riscos. Para os Apóstolos, este risco converte-se imediatamente em realidade ao serem submetidos à flagelação, mas tudo suportou com alegria, “por terem sido considerados dignos de injúrias, por causa do nome de Jesus” (At 5,41). “Pedro e os outros apóstolos responderam: “É preciso obedecer a Deus, antes que aos homens” (At 5,29). E dizia isso para justificar por que não se calava, mesmo que isso custasse sofrer violência. Testemunha com decisão o seu amor e a sua fé em Cristo ressuscitado. Deus é para ser levado a sério! São Paulo escreve: “com Deus não se brinca” (Gál 6,7). Levar Deus a sério é participar da Missa Dominical, de forma presencial; é estar devidamente preparado para comungar; é vestir-se adequadamente para participar da Missa, o ato mais sagrado.

Esta breve catequese de Pedro não era válida só para o Sinédrio. Ela fala a todos nós. Pois Jesus, o Ressuscitado, vive também hoje. E para todas as gerações, para todos os homens Ele é o “chefe” que precede pelo caminho, mostra o caminho, e o “salvador” que torna justa a nossa vida. As duas expressões “conversão” e “perdão” dos pecados”, correspondentes aos dois títulos de Cristo “cabeça” e “salvador, são as palavras-chave da catequese de Pedro, palavras que neste momento pretendem alcançar também o nosso coração. Que significam? O caminho que devemos fazer, o caminho que Jesus nos indica, chama-se “conversão”. Mas, o que é? O que é preciso fazer? Em cada vida a conversão tem a sua própria forma, porque todo o homem é algo de novo e nenhum é o duplicado de outro.

É este o testemunho que Jesus espera de cada um de nós, um testemunho livre de respeitos humanos e também do medo aos riscos e perigos. A fé intrépida dos que creem convence o mundo, mais do que qualquer outra apologia.

O Evangelho (Jo 21, 1-19) narra a terceira aparição de Cristo Ressuscitado aos Apóstolos, à margem do mar de Tiberíades, que narra a pesca milagrosa. Depois do “escândalo” da Cruz, eles tinham voltado para a sua terra e para o seu trabalho de pescadores, isto é, para aquelas atividades que desempenhavam antes de encontrarem Jesus. Tinham voltado para a vida anterior, e isto deixa entender o clima de dispersão e de confusão que reinava na sua comunidade (Mc 14, 27; Mt 26, 31). Era difícil para os discípulos compreender aquilo que tinha acontecido. Mas, enquanto tudo parecia terminado, de novo, como no caminho de Emaús, é ainda Jesus que vem ao encontro dos seus amigos. Desta vez encontra-os à margem do mar, lugar que traz à mente as dificuldades e as tribulações da vida; encontra-os ao amanhecer, depois de uma fadiga inútil que tinha durado a noite inteira. A sua rede está vazia. De certo modo, isto aparece como o balanço da sua experiência com Jesus: tinham-no conhecido, estavam ao lado dele e Ele tinha-lhes prometido muitas coisas. No entanto, agora encontravam-se com a rede vazia, sem peixes.

Mas eis que ao amanhecer Jesus vai ao seu encontro; contudo, eles não O reconhecem imediatamente (Jo 21, 4). E, aos discípulos provados pelo cansaço, decepcionados por não terem pescado nada, o Senhor diz: “Lançai a rede para o lado direito do barco e haveis de encontrar!” (v. 6). O que significa, concretamente, o convite de Cristo a “lançar a rede”? Significa em primeiro lugar, como para os discípulos, acreditar nele e confiar na sua palavra. Também a nós, como a eles, Jesus pede que O sigamos com fé sincera e sólida.

Normalmente, os peixes caem na rede durante a noite, quando é escuro, e não de manhã, quando a água já é transparente. Porém, os discípulos confiaram em Jesus e o resultado foi uma pesca milagrosamente abundante, a tal ponto que mal conseguiam arrastar a rede, devido à grande quantidade de peixes pescados. Nesta altura, João, iluminado pelo amor, dirige-se a Pedro e diz: “É o Senhor!” (v. 7). O olhar perspicaz do discípulo que Jesus amava, reconhece o Mestre presente à margem do lago. “É o Senhor!”: esta sua profissão de fé espontânea é também para nós um convite a proclamar que Cristo Ressuscitado é o Senhor da nossa vida.

Quando o trabalho na vinha do Senhor parece ser vão, como o cansaço noturno doa Apóstolos, não se pode esquecer que Jesus é capaz de inverter tudo num momento. A página evangélica que ouvimos recorda-nos, por um lado, que temos de nos comprometer nas atividades pastorais como se o resultado dependesse totalmente dos nossos esforços. Por outro lado, porém, faz-nos compreender que o verdadeiro bom êxito da nossa missão é totalmente dom da Graça. Nos misteriosos desígnios da sua sabedoria, Deus sabe quando é o tempo de intervir. E então, como a dócil adesão à Palavra do Senhor fez com que se enchesse a rede dos discípulos, assim em todos os tempos, também no nosso, o Espírito do Senhor pode tornar eficaz a missão da Igreja no mundo.

Trata-se de uma aparição marcada por gestos de carinho e ternura, mas também de envio, de missão: a pesca milagrosa, a refeição preparada pelo próprio Ressuscitado e a entrega do primado a Pedro. Dá para perceber que a missão terrena de Jesus terminou! O anúncio do Evangelho, agora, é missão dos discípulos; são os discípulos que espalharão a Boa-Nova pelos caminhos da humanidade.

Neste sentido, os gestos de Jesus apontam para atitudes que devem ser assumidas no anúncio. Mas quais são essas atitudes? Basicamente três: anunciar na certeza de que é o Senhor quem nos envia; que obedecendo à sua voz sempre teremos êxito, a pesca sempre abundante; alimentar-se da Eucaristia, maior gesto de amor e cuidado do Senhor para conosco e amar o Senhor acima de tudo. Se não tivermos verdadeiro amor pelo Senhor, nosso anúncio será vazio, estéril e jamais veremos no outro um irmão, jamais seremos capazes de apascentar, ou seja, de cuidar.

A presença de Jesus ressuscitado nas margens do mar de Tiberíades, revigora a missão dos discípulos de serem pescadores de homens.

A pesca milagrosa simboliza a Missão da Igreja.

A noite quer indicar a ausência de Jesus (a Luz).

A Palavra de Jesus ressuscitado muda a situação.

O êxito da Missão não depende do esforço humano, mas da presença viva do Senhor Ressuscitado nessa comunidade.

Muitas vezes, “pescamos” apoiados apenas em nossas forças… confiantes, como Pedro, em nossa experiência de “velho pescador…”

Diante do fracasso, às vezes, inevitável, desanimamos…

Vendo as redes vazias, somos tentados a largar tudo e voltar à vidinha antiga… (na família, na sociedade, na comunidade…)

Esquecemos que Jesus está sempre conosco todos os dias, até o fim do mundo e deve ser o centro da Missão…

Ele continua nos indicando onde e quando lançar as redes.

Esse caminho, percorrido pelos apóstolos, é semelhante ao caminho que também nós devemos percorrer…

Só a presença de Jesus torna a Missão fecunda…

Em nossas atividades, em quem depositamos a nossa confiança?

Estamos convencidos que sem Ele nada podemos fazer?

Estejamos atentos à voz de Cristo, da Igreja.

Busquemos na Eucaristia alimento para a nossa caminhada, força para realizar a nossa Missão.

Acolhendo com humildade a voz do Senhor, animados pelo amor, nutridos com o alimento que Cristo nos oferece, continuemos a “pescar” com renovado ardor missionário.

Com Jesus, teremos a certeza de que a pesca será abundante…

Hoje, Cristo pergunta a mim e a você: Tu me amas, mais do que os familiares, os trabalhos, os amigos, o esporte?

Tenhamos a coragem de responder com sinceridade, como Pedro: “Senhor, tu sabes que te amo”.  

Mons. José Maria Pereira

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