Homilia de D. Anselmo Chagas de Paiva, OSB – XXXIII Domingo do Tempo Comum – Ano B

Minhas palavras não passarão- Mc 13, 24-32

Caros irmãos e irmãs,

Para este domingo a Liturgia da Palavra nos faz um convite à esperança.  A primeira leitura anuncia aos crentes perseguidos e desanimados a chegada iminente do tempo da intervenção de Deus para salvar o Povo fiel. É esta a esperança que deve sustentar os justos, chamados a permanecerem fiéis a Deus, apesar da perseguição e do sofrimento.  Nesta leitura, retirada do livro do profeta Daniel (cf. Dn 12,1-3), o autor utiliza símbolos que evocam a transfiguração dos ressuscitados.

Essa vida nova não será como a do mundo presente, mas será uma vida transfigurada.  A mensagem de esperança que o nosso texto nos deixa destinava-se a animar os crentes que sofriam a perseguição numa época e num contexto particulares. No entanto, é uma mensagem válida para os cristãos de todos os tempos e lugares.  É a certeza de que Deus nunca abandona o seu povo e a vitória final será daqueles que se mantiverem fiéis aos seus ensinamentos.

O trecho do Evangelho nos apresenta uma parte do discurso de Jesus proferido em Jerusalém antes da páscoa, onde fala sobre os últimos tempos utilizando algumas imagens de tipo apocalíptico: “O sol vai se escurecer e a lua não brilhará mais, as estrelas cairão do céu e as forças que estão nos céus serão abaladas” (v. 24-25). Na mentalidade apocalíptica, os terremotos, incêndios, guerras eram sinais de um fim do mundo que estava para chegar.

Antigamente os astros do céu eram considerados divindades, com influência sobre a vida dos homens.  Podiam conceder benefícios ou provocar tragédias, por esta razão era preciso conquistar a sua amizade, oferecendo-lhes orações e sacrifícios.  Visando refutar a religião dos que adoravam o sol, a lua e as estrelas, os profetas afirmavam que um dia estes corpos celestes haviam perdido a sua luz e caído (cf. Is 13,10; 34,4; Gl 2,10).  Com estas afirmações os profetas mostravam que o mundo pagão, representado por estes astros, teria sido destruído e Jesus retoma estas imagens visando confortar os seus discípulos e prepará-los para os últimos acontecimentos.

E o texto do Evangelho segue dizendo: “Então verão vir o Filho do Homem sobre as nuvens, com grande poder e glória” (v. 26). A expressão “Filho do homem” é uma referência ao próprio Jesus Cristo, que relaciona o presente e o futuro; as antigas palavras dos profetas encontraram o seu centro no Messias de Nazaré. Ele é o verdadeiro acontecimento que, no meio dos transtornos do mundo, permanece o ponto firme e estável. E Jesus ainda diz: “Não passará esta geração sem que tudo isto aconteça” (v. 30).

Nestas reflexões, apesar de nos assustar, encontramos uma mensagem de esperança, porque, após todas as trevas e tribulações, depois de todos os horrores e os erros do nosso caminho humano, virá o “Filho do Homem” para nos confortar com a sua palavra eterna, a única que não passará, para devolver-nos com força e com ternura, a verdade da nossa vida.

O modo como Jesus descreveu o fim dos tempos se encaixava no horizonte teológico da época.  Como de fato, esperavam-se abalos e outros fenômenos terríveis, quando Deus interviesse, definitivamente, na História. A intenção de Jesus, porém, era a de levar os seus discípulos à vigilância, de maneira a estarem sempre preparados para o encontro com o Senhor.

E Jesus ainda sublinha: “Passará o céu e a terra, mas as minhas palavras não passarão” (Mc 13,30).  As palavras “o céu e a terra”, indicam todo o universo, a criação inteira. Jesus sublinha que tudo isto irá passar. O mundo é provisório; tudo deve terminar. Não só a terra, mas também o céu, aqui entendido precisamente em sentido cósmico, não como sinônimo de Deus. Contudo, Jesus afirma que as suas palavras “não passarão” (v. 30), ou seja, estão da parte de Deus e por isso suas palavras são eternas e devem orientar a nossa vida e as nossas preocupações.  As palavras de Jesus nos ensinam que não somos provisórios.  Somos destinados à vida eterna.

Com efeito, sabemos que na Sagrada Escritura a Palavra de Deus está na origem da criação: todas as criaturas, a partir dos elementos cósmicos: sol, lua, firmamento, obedecem à Palavra de Deus. Este poder criador da Palavra divina concentrou-se em Jesus Cristo, Verbo feito carne, e passa também através das suas palavras humanas, que são o verdadeiro “firmamento” que orienta o pensamento e o caminho do homem sobre a terra. O núcleo em volta do qual se centra o discurso de Jesus é ele mesmo, o mistério da sua pessoa e da sua morte e ressurreição, a sua vinda no fim dos tempos.

A exortação de Jesus não passa com o tempo, eternas são todas as suas palavras.  Elas não passarão, embora tudo o mais perca seu valor.  Tudo passa, nos recorda Santa Teresa de Ávila, só Deus basta. Só ele é eterno e a sua Palavra não muda, por isto, deve ser ela base e alicerce para os nossos atos e o nosso comportamento. É absolutamente certa a vinda do Cristo Senhor e há necessidade de nos mantermos vigilantes e preparados para colhê-lo.  É também firme a palavra do Senhor que apresenta o amor como critério do juízo final, a recompensa para quem se mantiver fiel e a comunhão definitiva com o Pai, como destino último do cristão.  Por conseguinte, o discípulo sensato deixa-se guiar pelos ensinamentos de Jesus.

Em cada celebração eucarística, após a consagração do pão e do vinho, dizemos: “Todas as vezes que comemos deste pão e bebemos deste cálice, anunciamos, Senhor, a vossa morte, enquanto esperamos a vossa vinda!”.  Embora Cristo tenha dito que ninguém conhece o momento do seu regresso, enquanto isto, podemos perguntar: Estou preparado para encontrar-me com o Cristo quando ele voltar?  O nosso objetivo final é o encontro com o Senhor ressuscitado. E quantos de nós pensamos nisto? Haverá um dia no qual estaremos frente a frente com o Senhor. É esta a nossa esperança: estar com o Senhor. O problema não é quando os sinais premonitórios dos últimos tempos acontecerão, mas se estamos preparados para este encontro. Na verdade, somos chamados a viver o presente, construindo o nosso futuro com serenidade e confiança em Deus.

Por meio da parábola da figueira (v. 28-29), Jesus nos ensina a manter uma atitude vigilante que nos leve a discernir, a distinguir os sinais da presença de Deus no mundo e na história. Não podemos ficar desanimados. Jesus nos convida a ter uma atitude atenta, vigilante para descobrir assim sua presença no meio de nós. Somos chamados a ter coragem para não nos deixar desanimar pelas diferentes dificuldades que podem acontecer. É necessário ficar atentos, estar ligados para redescobrir nos acontecimentos do dia a dia, os apelos de Deus presentes no meio de nós.

Peçamos ao Senhor que nos ajude a trilhar sempre o caminho do bem, observando a sua Palavra e que saibamos também ser a terra boa que acolheu a Palavra de Deus com disponibilidade, de modo que toda a nossa existência seja transformada e nos conduza à vida eterna.  E seguindo o Cristo pelo caminho da cruz, possamos alcançar juntos à glória da ressurreição.  A Virgem de Nazaré nos ajude a confiar em Jesus, aquele que é o fundamento firme da nossa vida, e a perseverar com alegria no seu amor para que possamos estar sempre preparados para o encontro definitivo com ele. Assim seja.

Anselmo Chagas de Paiva, OSB

Mosteiro de São Bento / RJ

Facebook
Twitter
LinkedIn

Biblioteca Presbíteros