Homilia de D. Anselmo Chagas de Paiva, OSB- Solenidade da Assunção de Maria

SOLENIDADE DA ASSUNÇÃO DE NOSSA SENHORA – Lc 1,39-56

Caros irmãos e irmãs

Estamos celebrando neste domingo a solenidade da Assunção de Nossa Senhora. No Brasil, por razões pastorais, esta celebração, quando a data do dia 15 de agosto não coincide com o domingo, é transferida para o domingo seguinte.  A Assunção da Virgem Maria ao céu é uma verdade que a Igreja professou desde os primeiros séculos, mas que só foi proclamada como dogma pelo Papa Pio XII em 1950, onde declarava ser “revelado por Deus que a imaculada Mãe de Deus, a Virgem Maria, tendo terminado o curso de sua vida terrena, foi assunta em corpo e alma à glória celestial” (DS 3903). Assunção significa elevação, ou seja, Maria foi elevada em corpo e alma ao céu por Deus. Uma vez concebida sem pecado e sendo o primeiro sacrário vivo a portar Jesus, seu corpo não poderia ter o fim de um corpo corruptível pelo pecado (cf. PIO PP XII, Constituição Apostólica “Munificentissimus Deus”, in AAS 42 [1950], 768-769).

Ao celebrarmos a gloriosa Assunção de Maria ao Céu, em corpo e alma, podemos também afirmar que os dogmas da Imaculada Conceição e da Assunção estão intimamente ligados entre si. Ambos proclamam a glória de Cristo Redentor e a santidade de Maria, cujo destino humano está perfeita e definitivamente realizado em Deus, pois o próprio Cristo disse: “E quando eu tiver partido e vos tiver preparado um lugar, voltarei e vos levarei comigo para que, onde estiver, vós estejais também” (Jo 14, 3). Maria é o penhor e o cumprimento dessa promessa de Cristo.

Assim como Jesus ressuscitou dos mortos e subiu à direita do Pai, também Maria, depois de concluir o percurso da sua existência na terra, foi levada ao céu. A liturgia nos recorda esta consoladora verdade de fé, enquanto canta os louvores daquela que foi coroada de glória incomparável. Lemos no trecho do Apocalipse, proposto à nossa meditação na primeira leitura: “Apareceu no céu um grande sinal: uma Mulher vestida de sol, com a lua debaixo dos pés e com uma coroa de doze estrelas na cabeça” (Ap 12,1). Nesta mulher resplandecente de luz, os Padres da Igreja reconheceram Maria. O autor do livro do Apocalipse profetiza a salvação de Maria, preservada da morte e glorificada no céu. No seu triunfo, o povo cristão peregrino na história entrevê o cumprimento das próprias expectativas e o sinal seguro da sua esperança.

O trecho do Evangelho de São Lucas que lemos na liturgia desta solenidade nos leva a ver o caminho que a Virgem de Nazaré percorreu para estar na glória de Deus. É a narração da visita de Maria a Isabel (cf. Lc 1,39-56). Após a anunciação do Anjo, Maria põe-se em viagem rumo à montanha, para ir às pressas a uma cidade de Judá e chegar à casa de Zacarias e Isabel. Maria entra nesta casa de Zacarias e Isabel, mas não entra sozinha, ela leva no seu ventre o Filho, que é Deus feito homem. E é o Espírito Santo que abre os olhos de Isabel e que a leva a reconhecer em Maria a verdadeira Arca da Aliança, a Mãe de Deus, que vem para a visitar. E assim, a idosa parente recebe-a, dizendo em voz alta: “Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto do teu ventre! Donde me vem esta honra de vir a mim a mãe de meu Senhor?” (Lc 1,42-43).

Aqui temos a sequência do que se ouviu dos lábios do anjo Gabriel: “Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto do teu ventre. E bem-aventurada aquela que acreditou que teria cumprimento tudo o que foi dito da parte do Senhor…” (Lc 1,42.45). Isabel ainda exclama: “Pois assim que a voz de tua saudação chegou aos meus ouvidos, a criança estremeceu de alegria no meu seio” (v. 44).

Nesta passagem, o evangelista São Lucas recorre ao termo grego “eskírtesen”, ou seja, “saltitar”, o mesmo vocábulo que encontramos numa das antigas traduções gregas do Antigo Testamento para descrever a dança do rei Davi diante da arca sagrada, que finalmente voltou para a pátria (cf. 2Sm 6,16). João Batista, no ventre da mãe, dança diante da Arca da Aliança, como Davi; e reconhece deste modo: Maria é a nova Arca da Aliança, perante a qual o coração exulta de alegria; a Mãe de Deus presente no mundo, que não conserva para si esta presença divina, mas oferece-a compartilhando a graça de Deus.

Em seguida, Maria pronuncia o cântico do Magnificat, onde os seus sentimentos exprimem a consciência do cumprimento das promessas (cf. Lc 1,54). É precisamente desta consciência que brota a alegria da Virgem Maria, que transparece no conjunto do cântico: alegria de saber que Deus olha para Ela, apesar da sua “fragilidade” (cf. Lc 1,48); alegria em virtude do serviço que lhe é possível prestar, graças às “grandes obras” que o Todo-Poderoso realizou em seu favor (cf. Lc 1,49). Mediante as suas palavras, a Virgem Maria aparece como um modelo a ser seguido ao longo do nosso caminho.
E Maria, também cheia do Espírito Santo, continua e completa aquilo que Isabel disse, afirmando: “Todas as gerações me chamarão bem-aventurada” (v. 48). É uma verdadeira profecia, inspirada pelo Espírito Santo, e a Igreja venerando Maria responde a esta ordem do Espírito Santo.

Na segunda Leitura (cf. 1Cor 15,20-27), São Paulo nos faz compreender este mistério, partindo do acontecimento central da história humana e da nossa fé. Assim diz o Apóstolo: “Cristo ressuscitou dos mortos como primícias dos que morreram. Com efeito, por um homem veio a morte e é também por um homem que vem a ressurreição dos mortos. Como em Adão todos morrem, assim também em Cristo todos reviverão. Porém, cada qual segundo uma ordem determinada: Em primeiro lugar, Cristo, como primícias; depois, os que pertencem a Cristo, por ocasião da sua vinda” (1Cor 15, 21-23).

A Virgem Maria que, na sua mesma concepção humana, foi imaculada, isto é, livre do pecado, cuja consequência é a morte, pelo mesmo fato, tornou-se livre da morte, que é a consequência do pecado. A vinda de Cristo, de que fala São Paulo nesta segunda leitura, realizou-se de modo excepcional em Maria.

Neste contexto, o que São Paulo afirma a respeito de todos os homens, a Igreja, no seu Magistério reconhece estar a Mãe de Deus inserida em tal medida no mistério de Cristo, a ponto de ser partícipe da Ressurreição do seu Filho com todo o seu ser, já no final da vida terrena; Maria vive aquilo que nós esperamos no final dos tempos, quando for aniquilado “o último inimigo”, a morte (v. 26)

Maria nos precede na glória celeste. Aquela que não teve pecado não foi tocada pela corrupção da morte! Imediatamente após a sua “dormição”, ela foi glorificada em corpo e alma, foi elevada ao céu! Podemos, portanto, exclamar como Isabel: “Bendita és tu entre as mulheres! Bendito é o fruto do teu ventre! Bem-aventurada aquela que acreditou, porque será cumprido o que o Senhor lhe prometeu!” (Lc 1,42.45).
A festa da Assunção de Nossa Senhora, a sua chegada à Glória, nos aponta para o nosso destino final, como todos nós almejamos, em conformidade com o que proclamamos na recitação do Credo:  “Espero a ressurreição dos mortos e a vida do mundo que há de vir”.

Possamos também pedir ao Senhor que nos faça crescer na fé, a exemplo de Maria, pois foi grande e heróica a obediência da sua fé; e foi precisamente através desta fé que Maria se uniu perfeitamente a Cristo, na morte e na glória.  Que ela interceda sempre por nós e nos proteja ao longo da nossa peregrinação até à Casa do Pai.  Que ela ainda nos ajude a dizer “não” ao erro e ao pecado e nos faça preparar o nosso encontro definitivo com Cristo, no final do nosso itinerário terrestre.  Assim seja.

Anselmo Chagas de Paiva, OSB

Mosteiro de São Bento/RJ

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