Homilia de D. Anselmo Chagas de Paiva, OSB – Pentecostes

Jo 20,19-23

Caros irmãos e irmãs,
A liturgia da Palavra deste domingo acentua a manifestação do Espírito Santo no milagre de Pentecostes e nos conduz ao Cenáculo onde nos deparamos com Maria, a Mãe de Jesus e os Apóstolos reunidos em oração (cf. At 1,14s), quando ficaram repletos do Espírito Santo (cf. At 2,1-4).  Cumpria-se o prometido pelo Salvador: “O Espírito Santo, que o Pai vos enviará em meu nome.  Ele vos ensinará todas as coisas e vos fará lembrar o que eu vos disse” (Jo 14,26).

Neste dia teve início a missão da Igreja no mundo. O próprio Jesus tinha preparado os seus apóstolos para esta missão aparecendo-lhes várias vezes depois da sua ressurreição (cf. At 1, 3). Antes da ascensão ao Céu, ordenou que “não se afastassem de Jerusalém, mas que aguardassem que se cumprisse a promessa do Pai” (cf. At 1,4-5); isto é, pediu que permanecessem juntos e se preparassem para receber o dom do Espírito Santo.

O Povo de Deus, que tinha encontrado no Sinai a sua primeira configuração, vê agora um novo sinal de Deus a ponto de não conhecer qualquer fronteira de raça, cultura, espaço ou tempo. Diferente do que tinha acontecido com a torre de Babel (cf. Jo 11,1-9), quando os homens, intencionados a construir com as suas mãos um caminho para o céu, fragilizaram a sua própria capacidade de se compreenderem reciprocamente, enquanto o Espírito Santo torna os corações capazes de compreender as línguas de todos e restabelece a ponte da comunicação entre Deus e a humanidade.

No Evangelho temos a aparição de Jesus aos apóstolos para lhes comunicar a sua paz e o dom do Espírito Santo, para tirar o pecado do mundo, ou seja, para que eles continuem sua obra salvadora (cf. Jo 14,27s).  Jesus sopra sobre os apóstolos, para que eles recebam o Espírito Santo e tenham o poder de perdoar os pecados.  Porém, o mais grandioso é quando, na manhã de Pentecostes, um grande vendaval soprou em Jerusalém e o Espírito Santo desceu em forma de línguas de fogo sobre a comunidade inicial da Igreja, e eles ficaram repletos de uma nova vida e de uma nova luz.

O termo “Espírito” traduz o termo hebraico “Ruah” que, na sua primeira acepção, significa sopro, ar, vento. Jesus utiliza precisamente a imagem sensível do vento para sugerir a novidade transcendente daquele que é pessoalmente o Sopro de Deus, o Espírito divino. É o dom por excelência de Cristo ressuscitado conferido aos seus Apóstolos, mas Ele quer que chegue a todos. No Evangelho Jesus diz: “Eu apelarei ao Pai e Ele vos dará outro Paráclito para que esteja sempre convosco” (Jo 14,16). É o Espírito Paráclito, o Consolador, que dá a coragem de levar o Evangelho pelas estradas do mundo! O Espírito Santo ergue o nosso olhar para o horizonte e nos impele para que possamos anunciar a todos a mensagem de Jesus Cristo.
O Batismo nos concede a graça do novo nascimento em Deus Pai, por meio do Filho no Espírito Santo, que é o primeiro no despertar da nossa fé e na vida nova que consiste em conhecer o Pai e aquele que Ele enviou, Jesus Cristo.

Toda a história da Igreja, através dos séculos, desde Pentecostes até nossos dias, está vinculada à ação do Paráclito.  Sua atuação é o cumprimento da promessa de Jesus:  “Eu estarei convosco até o final dos tempos” (Mt 28,20b).  A comunidade primitiva não só se proclamava membro do Corpo Místico de Cristo, mas igualmente acreditava ser o templo do Espírito Santo: “Não sabeis que sois o templo de Deus e que o Espírito de Deus habita em vós?” (1Cor 3,16).

Notemos ainda que em Pentecostes, o Espírito Santo manifesta-se como fogo. A sua chama desceu sobre os discípulos reunidos, acendeu-se neles e infundiu-lhes o novo ardor de Deus. Realiza-se assim aquilo que o Senhor Jesus tinha predito: “Vim lançar fogo sobre a terra; e como gostaria que ele já tivesse sido ateado!” (Lc 12, 49). Juntamente com os fiéis das diversas comunidades, os Apóstolos levaram esta chama divina até aos extremos confins da terra, abriram assim um caminho para a humanidade, uma senda luminosa, e colaboraram com Deus que com o seu fogo quer renovar a face da terra. O fogo de Deus, o fogo do Espírito Santo, é aquele da sarça que ardia sem se consumir (cf. Ex 3, 2).

Esta chama do Espírito Santo arde, mas não queima. E, todavia, ela realiza uma transformação, e por isso, deve consumir algo no homem, o pecado que o corrompe e o impede de construir de forma satisfatória a sua relação com Deus e com o próximo.

Enquanto a água significava o nascimento e a fecundidade da vida dada no Espírito Santo, o fogo simboliza a energia transformadora dos atos do Espírito Santo. São João Batista anuncia Cristo como Aquele que “há de batizar no Espírito Santo e no fogo” (Lc 3,16). E São Paulo ordena: “Não apagueis o Espírito!” (1Ts 5, 19). A tradição espiritual reterá este simbolismo do fogo como um dos mais expressivos da ação do Espírito Santo (cf. CIgC, n. 696).

Possamos também lembrar que quando Cristo sobe das águas do seu batismo, o Espírito Santo, sob a forma duma pomba, desce e paira sobre Ele (cf. Mt 3,16). O símbolo da pomba para significar o Espírito Santo é tradicional na iconografia cristã. Assim, em cada batizado que celebramos, o Espírito Santo desce e repousa no coração purificado do catecúmeno (cf. CIgC, n. 701).

Na solene celebração do Pentecostes, somos enviados a professar a nossa fé na presença e na ação do Espírito Santo e a invocar a sua efusão sobre nós, sobre a Igreja e sobre o mundo inteiro. Portanto, façamos nossa, e com intensidade particular, a invocação da própria Igreja: “Vinde Espírito Santo, enchei os corações dos vossos fiéis e acendei neles o fogo do vosso amor”. Uma invocação simples e profunda que deve nos envolver de alegria e de esperança.

Na anunciação do Anjo Gabriel, Maria é convidada a ser a mãe do Salvador, em quem habitará “corporalmente toda a plenitude da Divindade” (Cl 2,9). A resposta à pergunta de Maria: “Como será isto, se eu não conheço homem?” (Lc 1,34) é dada pelo anjo dizendo: “O Espírito Santo virá sobre ti” (Lc 1,35).  O Espírito Santo, que é “o Senhor que dá a vida”, como recitamos no Credo, é enviado para santificar o seio da Virgem Maria e para a fecundar pelo poder divino, fazendo com que ela venha conceber o Filho eterno do Pai, numa humanidade originada da sua. E a ela, que desde o Pentecostes se une com a Igreja nascente invocando o Espírito Santo, peçamos que fique conosco no centro deste nosso cenáculo singular, a fim de que, com a sua intercessão, possamos dar ao mundo um testemunho vivo e autêntico de Cristo, o nosso Salvador. Assim seja.

D. Anselmo Chagas de Paiva, OSB
Diretor da Faculdade de São Bento/RJ

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