EPÍSTOLA (2 Tm 2,8-13)
(Pe. Ignácio, dos padres escolápios)
INTRODUÇÃO: Paulo exorta Timóteo a ser fiel à palavra do evangelho, que em Jesus vê o Cristo Ressuscitado. Paulo espera que seus sofrimentos por ter sido ministro dessa palavra, sejam a causa de sua glória com Cristo; pois declara que compadecer com Cristo é a base de ser glorificado com Ele. E finaliza dizendo que apesar de sermos desleais, Ele nunca pode ser igual a nós, pois não pode se negar a si mesmo. Logo sua palavra permanece imutável e nela devemos confiar.
JESUS CRISTO: Lembra-te de Jesus Cristo, tendo sido levantado dentre os mortos, da semente de Davi, segundo o meu evangelho (8). Memor esto Iesum Christum resurrexisse a mortuis ex semine David secundum evangelium meum. LEMBRA-TE: O judaísmo era uma religião de lembranças, que tinha suas festas como recordação dos fatos, em que a mão de Jahveh foi vista claramente em favor de seu povo eleito. Tal é a Páscoa, Pentecostes e Tabernáculos. Era também uma religião de testemunhas, pois os profetas recebiam as visões e palavras de Jahveh como declarações e atestados em que o povo devia acreditar para a sua salvação. Assim mesmo o cristianismo é uma religião de memórias, a começar pela Eucaristia [fazei isto em minha memória], de fatos em que o amor divino se manifestou de modo insuperável em contra do ódio satânico como na cruz; e sua onipotência triunfou sobre o poder supremo da morte com a ressurreição. Também é uma religião de testemunhos em que visões e revelações têm existido em todos os tempos, inclusive nos mais próximos, como Paray le Monial, Lourdes e Fátima para citar os últimos, aceitos pela Igreja universal. Deus não é um Deus longínquo, mas próximo do homem, que se revela e se apresenta em formas que o homem pode ver e das quais ser testemunha a outros homens. A memória, pois, da revelação e dos fatos experimentados constitui a base da fé e Paulo acentua de modo especial a da Ressurreição como alvo derradeiro da vida: Se Cristo ressuscitou, nós também poderemos ressuscitar com Ele, pois se a morte entrou por um homem, também por um homem a ressurreição dos mortos (1 Cor 15, 21). E como todos morrem em Adão, assim também todos serão vivificados em Cristo (1 Cor 15, 22). LEVANTADO: Assim o fato principal, do qual a memória tem sido a base testemunhal fundamental, é a Ressurreição de Cristo. De maneira que se Cristo não ressuscitou é vã a nossa fé e ainda permanecemos em nossos pecados (1 Cor 15,17). Nada de estranho que Paulo lembrasse a Timóteo desse fato essencial. Ao traduzir em passiva o verbo egeirö [<1453>=surgere], a tradução seria ser levantado o que implica a ação divina na ressurreição de Jesus. SEMENTE: [sperma <4690>=semen] é a semente de uma planta; também o sêmen viril que, segundo o pensar antigo, era como uma semente que continha o novo ser, semeado no ventre materno que fazia ocasião de terra fértil até o nascimento. Daí que seja também prole ou descendência, como é no caso atual. É a palavra usada por Lucas em 1, 55: como falou a nossos pais, para Abraão e sua posteridade [spermati] para sempre.
ACORRENTADO: No qual estou padecendo até correntes como um malfeitor; mas a palavra de (o) Deus não está acorrentada (9). In quo laboro usque ad vincula quasi male operans sed verbum Dei non est alligatum. CORRENTES [desmoi<1199>=vincula] Uma das testemunhas fundamentais da ressurreição de Cristo era Paulo. Sua autenticidade e veracidade tinham uma base facilmente verificável: as correntes que todo preso especial carregava como testemunho de sua culpabilidade. De Pedro lemos em At 12, 6-7 que estava preso com duas cadeias, que à vista do anjo cairam-lhe das mãos. O latim vincula como o grego desmoi significa ligações, e em particular, em plural, significa prisão ou cárcere, pois nestes casos as ligações eram cadeias ou correntes de ferro [em grego alusis<254>=catena] que nas mãos se traduz por algemas e nos pés no plural por grilhões e em grego pedë [<3976>=compedes]. Temos o exemplo de At 16, 24: Paulo estava sujeito aos pés por um cepo de madeira [seguros os pés no madeiro é a tradução literal]. Num mundo em que o preso era encerrado com duas correntes que amarravam as mãos à parede e por vezes com um cepo nos pés numa cela sem luz, tudo por pensar que o detento era culpado até que se provasse sua inocência, o carcereiro tomava todas as precauções para que o preso não pudesse se soltar; pois a falha condenava o carcereiro a uma morte extremamente dolorosa e humilhante. Foi por isso que, o carcereiro de Paulo em Filipos tentou se matar ao ver as portas do xadrez abertas e pensar que os presos tinham escapado (At 16, 27). Que Paulo estava encadeado o sabemos por 2 Tm 1, 16 : O Senhor conceda misericórdia à casa de Onesíforo, porque muitas vezes me recreou e não se envergonhou das minhas cadeias [alusin]. A PALAVRA [o logos<3056>=verbum] com artigo, pode significar a segunda pessoa da Trindade, segundo João 1, 1; mas no NT em geral, é a palavra de Deus, testemunhada pelos apóstolos e escrita nos evangelhos. Essa palavra é agora também lida nos evangelhos e interpretada e testemunhada pelos novos sucessores dos apóstolos, Papa, bispos em comunhão e fiéis em observância. Essa palavra não está acorrentada, e por isso, hoje a Igreja tem o direito e dever de iluminar com a verdade revelada, o Cristo (Jo 14, 6), o destino final do homem e a felicidade e modo de viver para obter a mesma na terra. Existem na Igreja duas maneiras de evangelizar: ministerial e carismática. A tradição se complementa com a ação do Espírito que age com poder [sobrenatural] como afirma Paulo. Porém a pergunta essencial de todo homem é não tanto o para que, mas o para quem. Daí que Paulo explica o porquê de sua prisão: a palavra não pode estar acorrentada, embora seus propagadores o sejam.
A SALVAÇÃO: Por isso, todas as coisas suporto, por causa dos escolhidos, a fim de que também eles obtenham a salvação, a de em Cristo Jesus com glória sem fim (10). Ideo omnia sustineo propter electos ut et ipsi salutem consequantur quae est in Christo Iesu cum gloria caelesti. SUPORTO [ypomenö<5278>=sustineo] do grego significa permanecer, continuar, tolerar, suportar, aguentar. É neste sentido de tolerar, padecer e sofrer sem se render, que Paulo usa o verbo. E a razão é a SALVAÇÃO [söteria<4991>=salus]. A tradução de söteria é libertação, resgate, salvação, especialmente do inimigo, por uma ação de terceira pessoa. O inimigo é o pecado e o seu instigador o diabo. A Escritura descreve quatro diferentes modos de salvação do pecado: da pena, do poder, da presença e do prazer. A moderna Teologia toma a libertação como um ato de salvação de condições materiais escravizantes. A Teologia tradicional coloca o inimigo no pecado. É verdade que temos em Lucas, capítulo 1, no cântico de Zacarias ambas as interpretações: 1) A salvação dos inimigos materiais no versículo 69: levantou uma força [corno no original] de salvação [söterias] na casa de e Davi, seu servo, inimigos que declara no versículo 71: salvação [söterian] de todos os nossos inimigos e da mão e todos os que nos odeiam. 2) E a salvação espiritual do pecado no versículo 77: Para dar ao seu povo conhecimento da salvação [söterias], na remissão dos seus pecados. Em todos os casos, a tradução latina de söteria é salus,tis, de onde se origina a palavra salvação. Já em Paulo unicamente encontramos a palavra söteria com o significado de remissão dos pecados através da redenção [lytron<3083> ou apolytrösis<629>] (1 Tm 2, 6) que é o preço do sangue de Jesus em resgate nas palavras de Jesus: o filho do homem não veio para ser servido mas para servir e dar sua vida em resgate [lytron] de muitos (Mt 20, 28). A única diferença é que Paulo emprega apolutrösis no lugar de lytron. E a mais clara citação sobre a redenção [apolytrösis] é Ef 1, 7: Em quem [Jesus] temos a redenção [apolytrösin] pelo seu sangue, a remissão das ofensas, segundo a riqueza da sua graça. Ideia que repete em Cl 1, 14, de modo que não podemos afirmar seja um apax casualmente encontrado em Efésios. Sem, pois, rejeitar a ideia do AT de uma salvação de inimigos materiais, a verdadeira redenção é a salvação dos pecados mediante o sangue de Jesus na cruz, fato confirmado por Lucas o escrevente do seu evangelho em 22, 20: Este cálice é o novo testamento no meu sangue, que é derramado por vós, que Mateus afirmará para remissão dos pecados (26, 23). GLÓRIA SEM FIM [doxës<1391> aiöviou<166>=gloria coelesti]. Doxa é o esplendor, magnificência e majestade divinas, das quais seremos partícipes, os salvados pelo sangue de Jesus. Essa glória será sem fim, palavra que tem a mesma raiz que aei [sempre] de modo que a tradução seja glória sempiterna, ou seja, definitiva, sem fim.
UM CÂNTICO: Fiel a palavra: Se, pois, morremos com ele também viveremos com ele (11). Fidelis sermo nam si conmortui sumus et convivemus. Parece que Paulo cita um velho hino cristão que se inicia com a frase seguinte, que acompanha a palavra. MORREMOS é o primeiro versículo. A palavra morrer com Cristo tem dois significados; 1º) Comum a todos os cristãos como é ilustrado em Rm 6, 3-5: todos quantos fomos batizados em Cristo fomos batizados na sua morte, de sorte que fomos sepultados com ele pelo batismo na morte…porque se fomos plantados juntamente com ele na semelhança de sua morte, também o seremos na da sua ressurreição. 2º) O martírio que é provavelmente o significado com o qual Paulo apresenta o hino, pois ele estava numa situação em que seu testemunho era vital e que ele afirmaria mais tarde com a sua própria morte.
SEGUNDO VERSÍCULO: Se suportamos, também reinaremos com ele; se negamos, também ele nos negará (12). Si sustinemus et conregnabimus si negabimus et ille negabit nos. SUPORTAR [ypomenö <5278>= sustinere] permanecer, ficar, tolerar, suportar, aguentar, esperar, resistir, manter-se firme, padecer, aguentar, sofrer com perseverança. Este último significado é o que melhor se acomoda às circunstâncias em que Paulo escreve a sua carta. O sofrimento de uma prisão romana era particularmente grave: sem luz, sem movimento, acorrentado às paredes da minúscula cela, malcheirosa e fria, como dá a entender ao pedir a capa (4, 13). O sofrimento é causa de mérito, pois o Reino é a resposta dEle, como indicou nas bemaventuranças (Mt 5, 10-12). NEGAR [arneomai<720>=negare] negar, abjurar, rechaçar, recusar, renegar. Também Jesus o afirmava: Qualquer que me negar diante dos homens eu o negarei diante de meu Pai que está nos céus (Mt 10, 33).
FINAL: Se não somos fiéis, ele permanece fiel: não pode negar-se a si mesmo (13). Si sustinemus et conregnabimus si negabimus et ille negabit nos. INFIEL [apisteö<569>=não credere] com o significado de trair a confiança, infiel, não acreditar. Não é o mesmo negar que ser infiel. Pedro negou e os outros apóstolos foram infiéis. A negação está no testemunho de boca; a infidelidade, na conduta imprópria e na covardia de quem cala ante a maldade, que é contrária à bondade para a qual fomos escolhidos. É o pecado de todo aquele que for contrário à máxima que diz ama o próximo e tenta fazer agradável a vida do mesmo. A vida verdadeira –cuja consequência é a vida eterna- só se logra lutando por fazer profunda e limpamente o bem aos outros. NEGAR-SE [arnësasthai<720>=negare se], Deus não pode negar-se a si mesmo: Ele é puro amor, entrega, sem ódios nem rejeições. Isso implica que Deus sempre será fiel como vemos em (Rm 3, 3): Se alguns foram incrédulos, a sua incredulidade aniquilará a fidelidade de Deus? Estas palavras nos lembram a parábola do filho pródigo. O pai abandonado não deixa de esperar a volta do pródigo e o recebe em triunfo, como se nada tivesse acontecido. Essa fidelidade divina é a essência de sua natureza. Deus é sempre fiel. Deus é sempre Amor. Porém é o homem que voluntariamente se separa de Deus. É o homem que quer controlar Deus e ter assim o poder de frear sua justiça quando se separa da ordem estabelecida. O homem que pensa que Deus é só Pai e, portanto não existe o castigo, esquece que o maior castigo é o da consciência, juiz que obriga o culpado a não aceitar o amor do pai e rejeitar a misericórdia do ofendido, como vemos em Judas, após sua traição. Pelo contrário, nunca melhor vivemos, mais felizes, que quando a consciência está tranquila. O Inferno existe e é escolhido voluntariamente pelos que não querem admitir o amor como supremo dirigente de suas vidas. Seremos julgados [nos julgaremos a nós mesmos] pelo que temos sido capazes de amar, não pelo que nos tenham amado os outros e especialmente o Outro que é Deus, cujo amor [e perdão] é definitivamente rejeitado. Realmente a condenação, segundo esta norma substancial, não depende de Deus, mas de nossa conduta errada e consciência culpável. Um exemplo: Pode ser perdoado um ladrão que se nega a devolver o roubado? A quem ajudará a justiça divina: ao ladrão, por ser pai, ou ao espoliado, por ser justo? Poderá amar mais o ladrão que o injustamente privado dos seus bens? Nossa conduta não é indiferente à sua justiça; porque o amor não pode se opor ao injustamente ofendido. Sempre a conduta humana tem consequências que implicam a justiça pelo mal feito ao próximo.
EVANGELHO (Lc 17, 11-19)
OS DEZ LEPROSOS
(Pe. Ignácio, dos padres escolápios)
INTRODUÇÃO: Os milagres de Jesus são sinais da presença salvadora do Reino de Deus e parte integrante da boa nova que o Cristo anunciou com suas palavras e confirmou com suas obras. A limpeza dos leprosos, além do fato em si, tem um simbolismo extra: Jesus não cura unicamente os corpos, mas limpa de impurezas as almas, fato que no caso nosso aponta o sacramento da reconciliação por intermédio do sacerdote. Ao mesmo tempo que Jesus cumpre a lei do Levítico, exige a fé dos doentes, que devem abandonar sua aldeia, para se dirigir a Jerusalém. Jesus sente o agradecimento do samaritano, ao mesmo tempo que nota, com certa amargura, a falta de reconhecimento por parte dos outros nove que eram galileus. Jesus expressa, como homem, um sentimento que poderíamos encontrar em Deus, ao contemplar muitas condutas humanas que vivem esquecendo os muitos e grandes benefícios recebidos do alto.
DE CAMINHO: Então sucedeu ao caminhar ele para Jerusalém que também ele passava pelo meio da Samaria e da Galileia(11). Et factum est dum iret in Hierusalem transiebat per mediam Samariam et Galilaeam. AO CAMINHAR: É a terceira vez que, nesta parte do seu evangelho, Lucas cita, como circunstância temporal e geográfica, Jerusalém (9, 51; 13, 22 e esta de hoje). É o ambiente de viagem para seu último destino que dirige os atos e as palavras do grande Mestre, segundo a forma de relato escolhido pelo evangelista. Parece, como se quisesse pintar a vida humana de Deus, dependendo do seu último destino, que é um sacrifício final, não sem antes fazer o bem e se mostrar como mestre único da verdade e da solidariedade. TAMBÉM ELE: A frase é um pouco misteriosa. Provavelmente se refere à rota comum que os peregrinos usavam para se trasladar do Norte até Jerusalém, no Sul. PELO MEIO DA SAMARIA E DA GALILEIA: Como alguns autores declaram, a frase é um caso típico da inaptidão geográfica de Lucas. A tradução da vulgata per médium Samariam et Galilaeam é a escolhida pela VA evangélica. A não ser que o grego seja usado de forma irregular e pudéssemos traduzir através da Galileia e da Samaria (nessa ordem) ou atravessando a Samaria e a Galileia, e não pelo meio delas na ordem em que as encontramos no texto grego, como se a Samaria estivesse mais afastada de Jerusalém do que a Galileia. A geografia não é tema dominado por Lucas. O texto português moderno traduz: passava entre a Samaria e a Galileia. Das diferentes bíblias somente três: a latino-americana, a francesa e a inglesa traduzem pelos confins [frontieres [Fr] ou border [Ing]} entre, a Samaria e a Galileia. Supostamente, a menção imprecisa entre as duas regiões só serve para justificar a presença do personagem principal entre os leprosos, ou seja, a daquele que era samaritano, cuja presença só poderia ser possível por estar Jesus passando entre os limites de ambos os territórios.
OS DEZ LEPROSOS: E, entrando Ele numa vila, saíram ao seu encontro dez homens leprosos os quais plantaram-se de longe(12). Et cum ingrederetur quoddam castellum occurrerunt ei decem viri leprosi qui steterunt a longe. A LEPRA: Não podemos logicamente obter da escritura e dos evangelhos uma definição, nem mesmo uma descrição, tão acurada como as atuais, da doença de pele, que tanto discriminava os enfermos nas sociedades antigas. A doença era um castigo tanto social como religioso. Ela é descrita nos capítulos 13 e 14 do livro do Levítico. Seu nome hebraico tsaraat<06883>[3014 lepra] serve para designar afecções impuras. Este termo foi traduzido por lepra, ou seu equivalente, nos diferentes idiomas, apesar de não ser possível afirmar, com certeza, o seu significado preciso no texto original. Naturalmente, em virtude da falta de meios para um diagnóstico exato, eram provavelmente chamados leprosos, não apenas os portadores da hanseníase, mas também portadores de outras doenças crônicas de pele, muitas das quais, com certeza, não seriam menos contagiosas para o que hoje chamamos de leucodermia [pele branca]. Também existia a palavra parah <06509>que podemos traduzir por surgir uma erupção. Outrossim, encontramos a palavra negah <05061> significando surto, erupção ou praga (Lv 13, 12). Pois não existia uma clara ideia do que era a lepra. A sua descrição, a impureza a ela subsequente e o rito de sua cura com os sacrifícios correspondentes, estão descritos no Levítico nos capítulos 13 e 14. Quem distinguia entre lepra e outra dermatose mais ou menos grave, como herpes e até a tinha, era o sacerdote. Era um exame experimental. Se se formar na pele um dartro [tipo de herpes] ou uma mancha e, no lugar enfermo, o pelo se tornar branco e a enfermidade se tornar mais profunda na pele, o sacerdote declarará a doença como lepra (Lv 13, 3). Em caso de dúvida, o doente deveria permanecer em quarentena de sete a quatorze dias, que podia ser repetido até ter certeza da natureza da doença. Mas se o sacerdote declarasse que a doença era lepra, o doente era declarado impuro. Deveria, portanto, morar fora do acampamento ou da aldeia, rasgar suas vestes, soltar seus cabelos, ou seja, sem os cobrir e, no entanto, cobrir o bigode e gritar impuro cada vez que alguém se aproximasse. A impureza era devida principalmente às úlceras que se formavam. O rito de purificação, caso fosse declarado puro o sujeito, antes leproso, exigia duas aves, madeira de cedro, púrpura carmesim e hissopo. (Lv 14, 4). Temos visto no domingo do pobre Lázaro, como existiam duas classes de púrpura: a violácea, a mais cara, e a carmesim ou escarlata. O hissopo era uma planta ou arbusto de até 60 cm de altura de folhas aromáticas. Vários pequenos galhos juntos serviam para aspergir sangue ou água nos ritos religiosos. Atualmente usa-se com o mesmo nome um instrumento de metal com buracos na parte oposta do mango que serve para sugar água benta e aspergir com ela objetos e pessoas. O rito da purificação do leproso era espetacular e parece que estava em vigor no tempo de Jesus desde a época da construção do tabernáculo no deserto. LEPROSOS CÉLEBRES: O primeiro foi Moisés a quem Javé mandou por a mão no peito e ao retirá-la apareceu como coberta de neve, para depois reintroduzi-la e ficar normal de novo (Ex 4, 6-7). Outro caso memorável foi o de Miriam, irmã de Moisés, que, como castigo por sua murmuração, teve que se isolar por sete dias até conseguir a cura por intercessão de seu irmão (Nm 12, 10). Leproso era Naamã o sírio que foi curado por Eliseu (2 Rs 5) e Giezi, tornado leproso por sua avareza (2 Rs 5); e leproso era Simeão, hospedeiro de Jesus (Mt 26, 6). Mateus no cap 8 e Marcos no cap 1, narram a cura de um leproso. Já o relato de hoje, em número e circunstâncias, é próprio de Lucas. A LEPRA HOJE: O nome científico é Hanseníase. A doença era própria da Índia e da África. Os gregos a chamavam de Elefantíase e o termo lepra foi introduzido por Hipócrates como doença com lesões escamosas entre as quais podem estar a psoríase e os eczemas crônicos. Durante a idade Média a hanseníase prevalecia na Europa e no Oriente Médio. No Concílio de Lião (1245) estabeleceram-se regras para lidar com a profilaxia [medidas de prevenção] da doença: Isolar o doente da população sadia. Na França, o isolamento era precedido de um ofício religioso semelhante ao ofício dos mortos, após o qual o leproso era excluído da comunidade. O doente era obrigado a usar vestimentas características que o identificavam como portador da doença e fazer soar uma sineta ou matraca para avisar a gente sadia de sua doença. Data também da idade Média (Séc XIII) a criação das primeiras associações religiosas, dedicadas a prestar cuidados aos doentes de hanseníase. Essas associações foram responsáveis pela criação de centenas de asilos para abrigar os acometidos pela doença. Nesse século cerca de 19 mil leprosários existiam no continente. A partir do século XVII foram desativados muitos desses asilos de modo que por volta de 1870 a hanseníase já havia praticamente desaparecido em quase todos os países com a exceção da Noruega onde ainda podia ser considerada endêmica [permanente]. Mantinha-se, porém inalterada na Ásia e na África e tornou-se gradativamente endêmica na América Latina. No Brasil foi em 1600 que se notificaram os primeiros casos no Rio de Janeiro, onde anos mais tarde seria criado o primeiro Lazareto. Sem tratamento eficiente e sendo uma enfermidade contagiosa, o doente era considerado como uma cultura ambulante da doença e, portanto, uma ameaça à sociedade. Assim como não se deixam cadáveres insepultos, não se devem deixar leprosos desamparados. Era-lhes, pois, permitido viver em asilos e até serem recolhidos em cadeias públicas. Pensemos na ilha de Molokai em que só entravam os leprosos e dos quais foi apóstolo o Pe. Damião. Na década de 40 do século XX, com a descoberta da Sulfona, mudou o tratamento, e o isolamento passou a ser seletivo. Outros dois remédios, Clofazimina, nos anos 60, e Rifampicina, nos anos 70, trouxeram a cura, muito embora o tratamento demorasse 5 anos. Hoje em dia, o tratamento com PQT [poliquimioterapia] demora apenas um dia, seis meses, ou doze meses e o diagnóstico precoce permite que mais de 90% dos pacientes não apresentem nenhuma sequela. Atualmente, na primeira dose de tratamento, 99% dos bacilos são eliminados e não há mais chance de contaminação. O microbacilo de Hansen ataca normalmente a pele, os olhos e os nervos. A doença é também conhecida como moreia, mal-de-Lázaro ou mal-do-sangue. Não é uma doença hereditária. As vias de transmissão são pelas vias aéreas. Porém a infecção dificilmente acontece depois de um simples encontro social. O contato deve ser íntimo e frequente. A maioria das pessoas é resistente ao bacilo e de 7 doentes apenas um oferece risco de contaminação. De 8 pessoas em contato com o paciente, apenas 2 contraem a doença e desses 2, um torna-se infetante. Ela se apresenta sob duas formas. O tratamento do tipo paucibalar [poucos bacilos] é mais rápido: basta uma dose mensal [um coquetel], além da ingestão de um comprimido diário durante 6 meses. Do tipo multibacilar [muitos bacilos] o tempo para o tratamento é mais longo: são 12 doses uma por mês e a ingestão de dois remédios diários durante 2 anos. A maioria da população adulta é resistente à hanseníase, mas as crianças são mais susceptíveis, geralmente adquirindo a doença quando há um paciente contaminante na família. O período de incubação varia de 2 a 7 anos, e entre os fatores predisponentes estão o baixo nível econômico, a desnutrição e a superpopulação doméstica. Por isso ainda tem grande incidência nos países subdesenvolvidos. A hanseníase tem 4 formas de se apresentar: Indeterminada, como forma inicial que evolui espontaneamente para a cura na maioria dos casos e para outras formas da doença em 25% dos mesmos. Geralmente encontra-se apenas uma lesão de cor mais clara que a pele normal, com diminuição da sensibilidade. Mais comum em crianças. Tuberculoide: Forma mais benigna e localizada, ocorre em pessoas com alta resistência ao bacilo. As lesões são poucas [ou única] de limites bem definidos e um pouco elevados e com ausência de sensibilidade [dormência]. Ocorrem alterações nos nervos próximos à lesão, podendo causar dor, fraqueza e atrofia muscular. Dimorfa: forma intermediária que é resultado de uma imunidade também intermediária. O número de lesões é maior, formando manchas que podem atingir grandes áreas da pele, envolvendo parte da pele sadia. O acometimento dos nervos é mais extenso. Lepromatose: Nestes casos, a imunidade é nula e o bacilo se multiplica muito, levando a um quadro mais grave, com anestesia dos pés e mãos que favorecem os traumatismos e feridas que podem causar deformidades, atrofia muscular, inchaço das pernas e surgimento de lesões elevadas na pele [nódulos]. Órgãos internos também são acometidos pela doença. A IMPUREZA: A lepra não era tão temida como doença, mas por ser causa de marginalidade total na sociedade antiga. Na realidade, a impureza que a acompanhava por causa das chagas purulentas era absoluta. Segundo o modo de pensar do AT, o sangue derramado era uma das fontes de impureza. O sangue não podia ser derramado porque era considerado como base da vida, que pertencia diretamente a Deus; daí que o contato com o sangue tinha um sentido religioso como se fosse um relacionamento íntimo com a divindade, dona da vida. A perda do sangue era considerada como perda de vitalidade, a qual deve ser restabelecida através de certos ritos alcançando sua integridade para se unir com o Deus, fonte da vida. As leis da impureza estão no Levítico entre os capítulos 11 a 15. Existem animais impuros no capítulo 11; há uma impureza de nascimento no capítulo 12; fala-se da impureza da lepra nos capítulos 13 e 14 e a menstruação merece um capítulo à parte como é o 15. A impureza de um leproso durava toda a vida e o leproso deveria ser mandado fora do acampamento pois no meio do povo só habitava o Senhor (Lv 15, 31). A razão para essa lei era a santidade divina que podia ser maculada por certas ações entre as quais as principais eram a idolatria e o derramamento de sangue, especialmente de inocentes como eram as crianças oferecidas aos deuses ou Baals (Sl 106, 38). A impureza legal, especialmente se ligada com o exercício sacerdotal, tomou conta da impureza interior ou pecado, de modo que este último não fosse mais considerado na sua intencionalidade interna, sendo que toda a lei e seu cumprimento estavam em evitar a impureza externa da qual os fariseus fugiam como essencialmente contagiante. O pecado estava também unido à miséria física e econômica (Jo 9, 2). Não somente o leproso era considerado impuro, de modo que deveria ser afastado e morar à parte; mas também os vestidos cobertos de mofo eram considerados como tendo lepra e deveriam ser considerados impuros. Também o mofo ou bolor das casas as tornava impuras e sujeitas à inspeção do sacerdote como eram as pessoas (Lv 14, 33 ss).
O GRITO: Então eles elevaram a voz dizendo: Jesus, senhor, tende piedade de nós (13). Et levaverunt vocem dicentes Iesu praeceptor miserere nostri. Segundo a lei, o leproso não podia ter contato com as pessoas sãs, e devia chamar a atenção das mesmas gritando: impuro, impuro. O grito indica que estavam longe e deviam elevar a voz para serem escutados. SENHOR: A palavra é epistatës [<1988>=praeceptor], que significa presidente, ou seja, superior, amo, dono, chefe, comandante, e que temos traduzido por senhor. O inglês tem máster [dono, amo] que é a tradução mais apropriada da palavra grega. Na linguagem atual seria Doutor, vocábulo com o qual é reconhecida a superioridade do interlocutor. Eles sabem que Jesus tem o poder de cura. Por isso eles pedem que olhe para eles com compaixão.
A RESPOSTA DE JESUS: E tendo visto, disse-lhes: marchando, apresentai-vos aos sacerdotes, e sucedeu ao irem eles, foram curados. A CURA: Não foi imediata como quando disse ao leproso: quero, fica limpo (Mt 8,3), mas respeitando as regras da lei, mandou que fossem aos sacerdotes para que estes os declarassem curados. A reação dos leprosos foi diferente da de Naamã, que resistiu em obedecer; os nossos doentes seguiram a ordem de Jesus e, no caminho, é que eles se sentiram curados. O SACERDOTE: Como temos visto a impureza, que tem como razão o derramamento do sangue, liga a lepra ao sentido religioso e por isso era o sacerdote quem deveria declarar sua existência, da qual dependia a vida social do indivíduo. Por isso a reintegração do leproso deveria ser feita com um sacrifício semelhante ao sacrifício pelo pecado (Lv 14, 1-31. 49-53), pois era um atentado à virtude vivificante do Deus de Israel. O rito de purificação abrangia detalhes que hoje parecem ridículos, mas que, sem dúvida, tinham seu significado nos costumes da época. Um detalhe importante é que assim como na purificação do dia do Yom Kippur um dos dois bodes do sacrifício era deixado no deserto para o demônio Azazel que com esse bode recebia as impurezas do povo, também havia dois pássaros na purificação do leproso e um deles era solto após receber a infusão do sangue do pássaro sacrificado. Assim ele levaria a impureza longe do povo e do doente. Uma questão à parte é por que Jesus, neste caso, não cura de imediato, mas manda respeitar a lei que nos outros casos não impõe. Talvez seja pelo número dos enfermos que se curados de imediato, seria um fato tão notável que poderia meter em uma enrascada o messiado de Jesus. Assim, longe das turbas e de toda comoção social, os leprosos são curados enquanto se dirigiam a Jerusalém.
O AGRADECIDO: Um, pois, dentre eles, tendo visto que fora curado, voltou com grande voz louvando a(o) Deus(15). Unus autem ex illis ut vidit quia mundatus est regressus est cum magna voce magnificans Deum. Um samaritano [único ou havia mais da mesma etnia?] foi o único que voltou dando graças a Deus, como veremos no parágrafo seguinte. O nome de Deus era El, muitas vezes usado no plural Elohim, e que receberá segundo situações determinadas diversos atributos como El-Elyon= Deus Altíssimo (Gn 14, 22). El-Roi=Deus da visão (Gn 16, 13), El Shadai= Deus da montanha (Gn 17, 1), El-Olam= Deus eterno (Gn 31, 33), El- Betel=Deus de Betel (Gn 35, 7); mas, sem dúvida, o NOME [Hashem ou Hashem Yitbarah, nome oculto] era o de JAVÉ [YHWH] (Êx 3, 13) que na língua hebraica é traduzido por o Eterno e que alguns modernos traduzem por o que existe, o vivente e daí o verdadeiro, o único. Os setenta traduziram por Ego eimi ho on= eu sou o é [o que existe]. O apocalipse dirá: Aquele que é, aquele que era Aquele que vem, o Todo-poderoso (Ap 1,8). Este Deus era a quem o samaritano dava glória com grandes vozes. Sabia muito bem que um homem não podia realizar semelhante cura e que, se ela se fazia através da ordem de um homem, era porque o tal falava em nome de Deus, era sua voz, seu profeta.
O SAMARITANO: E caiu sobre o rosto aos pés dEle dando-lhe graças. E o tal era samaritano(16). Et cecidit in faciem ante pedes eius gratias agens et hic erat Samaritanus. Ao chegar a Jesus, prostrou-se com o rosto em terra aos pés de Jesus. É a proskynesis, forma de submissão ao rei oriental. O Grande, Rei dos persas, que Alexandre o Grande quis exigir depois de seu regresso da Índia em 324 aC para ser reconhecido como deus. Jesus é, pois homenageado como Rei, no mínimo (Mt 2,2) e talvez como representante de Deus (Jo 4, 20) e intermediário da ação divina. Deu-lhe graças. É a única passagem dos evangelhos em que a ação-de-graças (eucharisteuo) é dada a Jesus e não a Deus. O estrangeiro, como Jesus o chama para evitar o sobrenome de samaritano que era um insulto porque era sinônimo de herege, louva a Deus por sua cura e agradece a Jesus, causa próxima da mesma, venerando-o como um profeta do Altíssimo, e representante do poder deste último na terra.
A QUEIXA: Tendo respondido Jesus disse: não foram limpos os dez? Os nove, pois, onde (estão)?(17). Não foram encontrados (sic) os que regressaram para dar glória a(o ) Deus senão este estrangeiro?(18). Respondens autem Iesus dixit nonne decem mundati sunt et novem ubi sunt. Non est inventus qui rediret et daret gloriam Deo nisi hic alienígena. A queixa de Jesus é causada pela repercussão de unicamente contemplar, como curado, um dos dez. Implicitamente Ele afirma que também os ausentes foram limpos da lepra. E logo claramente afirma que dar glória a Deus é agradecer sua pessoa. Esta parte é a nossa função principal como cristãos ou discípulos de Jesus. Adorá-lo no verdadeiro sentido de ver nEle a divindade, é a maior glória que uma criatura humana pode dar ao Deus único. O versículo 18 é um tanto incorreto em grego e temos deixado assim mesmo a tradução literal. Ao Deus: sempre que se referem a YHVH os evangelistas usam o grego Theos <2316> com artigo determinado, para distingui-lo dos outros deuses pagãos.
A FÉ: E disse-lhe: Levanta, vai embora: tua fé te salvou (19). Et ait illi surge vade quia fides tua te salvum fecit. O grego muito propriamente usa o levanta em aoristo e o vai em presente para indicar uma ação passada pontual e a outra atual contínua. A fé: É importante observar como todos os evangelistas apresentam a fé como um requisito antes da cura. Mutatis mutandis podemos dizer que é também o requisito para a salvação da alma. O maior e talvez único obséquio que o homem pode oferecer ao Deus que deseja salvá-lo é a fé, a entrega, com plena confiança, nas mãos que o podem ajudar como confia um filho na bondade do pai. Nada temos a oferecer a um Deus absolutamente pleno que nada necessita; mas deixamos que Ele atue livremente em nós: é aí onde estão coincidindo as duas liberdades: a do homem que confia plenamente e se entrega, e a de Deus que atua com total permissão. A obediência dos leprosos à palavra de Jesus consegue a cura; mas aparentemente, sua falta de agradecimento os desvia de quem foi seu salvador. Em Jesus, o samaritano, infiel e herege segundo os judeus, encontrou o Deus verdadeiro e o seu representante na terra. Daí a proskynesis como fez o cego a quem Jesus pediu fé em sua pessoa: Crês no Filho do Homem? (Jo 9, 38). Por isso dirá Jesus ao samaritano: Tua fé te salvou (19). Há, pois um contraste entre cura e salvação que o mundo atual não percebe, porque os bens imediatos, embora não sejam tudo, são os únicos que interessam e preocupam a maioria. E uma vez obtidos estes, não nos preocupamos com a salvação, que é a posse de Jesus como fim de nossas vidas.
PISTAS: 1) Os marginalizados se aproximam de Jesus. Apesar de sua total culpabilidade perante Deus e os homens, eles têm esperança. Sua cura dependia daquele Mestre [epistates= chefe, ou líder], de quem tinham ouvido falar como grande médico e curandeiro. O seu grito pode ser também o nosso, quando a esperança só tem como base a bondade divina: eleeson ymas, compadece-te de nós. Como pensamos que Deus vê nossas vidas? Limpos e puros ou tão terrivelmente marcados pelo mal que parecemos monstruosos leprosos cheios de imundície? Somos diante de Deus malditos e assim se tornou seu Filho, não unicamente maldito, mas maldição para nos salvar (Gl 3, 13).
2) O ponto de partida para a ação divina é a súplica. Jesus não os busca. São eles que o buscam, que sabem que Jesus tem poder para curar. O resto é um mandato: conformem-se com a lei se é que querem viver em sociedade de novo. Naamã foi mandado a se lavar no Jordão. Os dez leprosos foram enviados para o sacerdote. Nada há de anormal ou extraordinário em ambas as ocasiões. É a obediência que atrai a ação de Deus e transforma o homem em seu filho amado no qual encontra satisfação (Mt , 17).
3) O agradecimento é essencial nas relações com Deus. Todos nós somos semelhantes aos nove leprosos curados. Incapazes de uma súplica que não seja uma petição de ajuda. Uma vez obtida a mesma, esquecemos o louvor, o elogio, a ação-de-graças. Nossa religiosidade tem muito de magia, de oportunismo, de interesse, de ingratidão. Conformamo-nos com o nosso bem-estar e esquecemos o muito que temos recebido como dom e como presente. O pouco mal que nos atinge não nos permite enxergar o muito de bem que nos rodeia. Por isso, a queixa é mais abundante do que o louvor.
4) Por esse egoísmo próprio de quem só olha seu próprio bem, esquecemos que os bens são fruto de uma dádiva divina. Nos servimos de Deus, não servimos a Deus. E a melhor maneira de servi-lo é agradecê-lo e obedecê-lo. Esquecemos que os bens, agora possuídos, são uma simples amostra do que nos espera se a gratidão tomar conta de nossas vidas. O canto às misericórdias de Deus nesta vida é só o começo do canto sem fim que será o modus vivendi na eternidade. Desde já devemos aprender a recitá-lo, caso queiramos vivê-lo como experiência existencial.
5) Não temos lepra que nos separa socialmente, mas a Aids, etnia, e pobreza, marginalizam muita gente neste mundo, que se gloria de sua globalização. Quem não tem ouvido falar dos ciganos, dos negros, dos indígenas? E eles não são contagiosos, o contágio, pelo contrário, é a ideia de que existem classes e diferenças.