Homilia de D. Anselmo Chagas de Paiva, OSB – IV Domingo do Advento – Ano C

A visitação de Maria a Isabel

Meus caros irmãos e irmãs,

Nestes dias em que nos preparamos para o Natal, somos convidados a contemplar a ação de um Deus que ama de tal forma a humanidade que envia ao nosso encontro o seu Filho, a fim de nos conduzir à comunhão com Ele. 

Neste quarto domingo do tempo do Advento, à distância de poucos dias do Natal do Senhor, o Evangelho narra a visita de Maria à sua prima Isabel. Este episódio apresenta com grande simplicidade o encontro de duas importantes mulheres, ambas grávidas, na expectativa do nascimento de seus respectivos filhos. Ambas ressaltam a gratidão ao Senhor pela obra nelas operada.  Isabel, já idosa, simboliza Israel que espera o Messias, enquanto que a jovem Maria traz em si o cumprimento desta expectativa, em benefício de toda a humanidade. 

Na Anunciação o anjo Gabriel tinha falado a Maria da gravidez de Isabel (cf. Lc 1,36) como prova do poder de Deus. A esterilidade, não obstante ela fosse idosa, tinha-se transformado em fertilidade. E Isabel, acolhendo Maria, reconhece que nela está para se realizar a promessa de Deus à humanidade e exclama: “Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto do teu ventre” (v. 42). São palavras que aparecem no Antigo Testamento, mais precisamente no Cântico de Débora (cf. Jz 5,24) para celebrar Jael, a mulher que, apesar da sua fragilidade, foi o instrumento de Deus para libertar o Povo de Israel das mãos de Sísara, um cruel comandante do exército que tencionava decepar os Israelitas. 

Algo incomum para uma mulher, olhando o contexto da época.  Com isto, observa-se que Deus pode usar de instrumentos frágeis para operar maravilhas.  Aplicando a Maria, pode-se também constatar que Deus uma vez mais usa instrumentos simples para realizar suas obras de salvação.  Através de Maria ele realizou um marcante acontecimento histórico: deu à humanidade o seu próprio Filho. Através do anjo Gabriel, Deus dirige-se a Maria e a escolhe para gerar o Salvador do mundo.

A manifestação de alegria de João Batista no seio de sua mãe Santa Isabel, é o sinal do cumprimento da expectativa: Deus está para visitar o seu povo. Isabel interpreta este movimento que ela experimenta como um sinal divino e como uma saudação de seu filho ao filho de Maria.  Em sua alegria, Isabel ainda ressalta a posição privilegiada de sua parenta dizendo: “…e bendito é o fruto do teu ventre” (v. 42).  Ao fruto do ventre de Maria, Isabel chama de Kyrios mou: “Meu Senhor” (v. 43).  No uso do título Kyrios Jesus é reconhecido como Deus, e como o seu Deus.  Maria também é apresentada como a mulher de fé (v. 45), porque acreditou na veracidade e na fidelidade da promessa de Deus.

No texto evangélico temos a exaltação de Isabel: “Como posso merecer que a mãe do meu Senhor me venha visitar?” (v. 43).  Davi pronunciou uma frase semelhante a esta: “Como pode estar a Arca do Senhor em minha casa?” (2Sm 6,9). A Arca continha as tábuas da Lei, o maná e o cajado de Aarão (cf. Hb 9, 4), era o sinal da presença de Deus no meio do seu povo. João Batista, ainda para nascer, exulta de alegria diante de Maria, a nova Arca da nova Aliança, que traz no seio Jesus, o Filho de Deus feito homem.

Outro detalhe significativo nos põe em paralelo com a visita de Maria e a Arca da Aliança.  Maria, bem como a Arca, permanecem durante três meses em uma casa da Judéia.  A Arca é recebida com danças, com gritos de alegria, com hinos festivos e é portadora de bênçãos para a família que a recebe (cf. 2Sm 6,10-11) e Maria, ao entrar na casa de Zacarias, faz pular de alegria João Batista, o menino que está no seio de Isabel e representa o povo do Antigo Testamento, que está à espera do Messias.  Com isto, fica evidente que Maria é a nova Arca da Aliança, como entoamos na Ladainha de Nossa Senhora.

A cena da Visitação expressa também que Jesus é o Deus que vem ao encontro da humanidade e tem uma mensagem de salvação que concretiza as promessas feitas pelo Senhor aos antepassados; logo, a presença de Jesus provoca a alegria em todos aqueles que esperam a concretização das promessas de Deus que se realizam com sua chegada. Promessas de um mundo de justiça, amor, paz e felicidade para todos.  Por isto, dirá o anjo aos pastores: “Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens por ele amados” (Lc 2,14).  Através de Jesus, Deus vai oferecer a paz e a salvação a todos e isso gera alegria, por parte de todos aqueles que anseiam pela concretização das suas promessas.

Finalmente, temos a resposta de Maria: “A minha alma engrandece o Senhor”. A resposta de Maria retoma um salmo de ação de graças (cf. Sl 34,4), destinado a dar graças ao Senhor porque protege os humildes e os salva, apesar da prepotência dos opressores. É um salmo de esperança e de confiança, que exalta a preocupação de Deus para com os pobres, vítimas da injustiça e da opressão. Sugere-se, claramente, que a presença de Jesus, através dessa mulher simples e frágil que é Maria, é um sinal do amor de Deus, preocupado em trazer a salvação a todos os que são vítimas da injustiça. Com Jesus, chegou esse novo tempo de paz e de felicidade anunciado pelos profetas.

Com a celebração do Santo Natal já próximo, devemos nos preparar para o encontro com Jesus, o Emanuel, Deus conosco. Nascido na pobreza de Belém, Ele deseja fazer-se companheiro de viagem de todos. O dom surpreendente do Natal é precisamente este: Jesus veio para cada um de nós e nele nos tornamos irmãos. Estejamos preparados espiritualmente para receber o Menino Jesus. Ele vem para nós. É seu desejo vir para habitar no nosso coração. Para que isso aconteça é indispensável que estejamos disponíveis e nos preparemos para recebê-lo, prontos a dar-lhe espaço dentro de nós, nas nossas famílias, na nossa cidade. Que seu nascimento nos encontre preparados para festejar o Natal.  Com a consciência de que é Ele o protagonista da fé.

Neste tempo de Natal saibamos imitar Maria, e com a mesma alegria e disposição que a levou a ir às pressas para estar com Isabel (cf. Lc 1,39), possamos nós também ir ao encontro do Senhor que vem.  À Maria, Arca da Nova e Eterna Aliança, confiemos o nosso coração, para que o torne digno de acolher a visita de Deus no mistério do seu Natal.

Que o Senhor encontre um abrigo no nosso coração e na nossa vida. Na verdade, não devemos apenas levá-lo no coração, devemos também levá-lo ao mundo, de forma que também nós possamos gerar Cristo para as pessoas do nosso tempo.   Assim seja.

Anselmo Chagas de Paiva, OSB
Mosteiro de São Bento/RJ

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