Homilia do Mons. José Maria – III Domingo do Tempo Comum – Ano B

A Vida é Breve! Tudo Passa! 

O início da atividade apostólica de Jesus, para S. Marcos, é um convite à conversão!  No Evangelho deste Domingo (Mc 1, 14 – 20), ressoam as palavras da primeira pregação de Jesus na Galileia: “Completou–se o tempo, e o Reino de Deus está próximo. Convertei–vos e crede na Boa Nova” (Mc 1,15).

Acabou-se o tempo das promessas e da espera: O Messias chegou e está começando o seu ministério! A sua presença é a plenitude dos tempos, tornando-os veículos da misericórdia de Deus e da história da salvação.

Para acolher Jesus, a condição primeira é a conversão, a mudança profunda de vida que exige, sobretudo, a luta contra o pecado e, consequentemente, a rejeição de tudo aquilo que pode desviar o seguidor do Cristo do amor e da Lei de Deus. Uma conversão parecida à que Deus exigiu à cidade de Nínive, por meio da pregação de Jonas, e que os seus habitantes praticaram, abandonando “o seu mau caminho” (Jn 3, 10). Mas, a fuga do pecado é apenas a primeira fase da conversão anunciada por Jesus, que exige também um segundo momento que é destacado no Evangelho: “Acreditai na Boa-Nova”. O cristão tem que aderir positivamente ao Evangelho com uma fé vivificada pelo amor, que não fica apenas na sua aceitação teórica, mas procura evidenciá-lo com a vida prática. É necessário e urgente, pois, deixar de lado a mentalidade terrena que faz com que o homem viva e atue apenas com vistas à felicidade e aos interesses temporais. O Evangelho diz: “Convertei – vos”!  Paulo esmiúça esta importante palavra em algumas atitudes mais concretas; diz – nos: os que têm mulher vivam como se não tivessem (…) os que choram, como se não chorassem. “A aparência (a figura) deste mundo passa”, adverte S. Paulo (1 Cor 7,29 – 31). Estamos diante de um paradoxo: Quem está casado, viva como se não o estivesse! É uma palavra forte, aparentemente em contraste com todas as coisas belas que, em outras circunstâncias, a Palavra de Deus disse-nos sobre o matrimônio. Porém, o contraste é somente aparente. Ela se atém apenas a explicar a palavra dita por Jesus aos saduceus, a respeito da mulher que tinha passado por sete maridos: “Neste mundo, homens e mulheres casam–se, mas os que forem julgados dignos de participar do mundo futuro e da ressurreição dos mortos não se casam…” (Lc 20, 34s).

Há um sério risco: o de apegar-se às coisas deste mundo e esquecermos que temos razões maiores para existir, isto é, o Céu espera-nos. E Deus é o maior interessado em levar-nos para o Céu. Esse é o conteúdo fundamental da esperança cristã.

É preciso que se crie uma consciência cristã capaz de fomentar desejos, intenções, hábitos e comportamentos em total sintonia com o Evangelho de Cristo. Isto é tão urgente quanto “o tempo é breve” (1 Cor 7, 29); brevidade esta, fixada precisamente pela vinda de Cristo e da qual não fica mais que uma fase histórica, ou seja, a que separa o dia de hoje da sua última vinda. O tempo não tem mais que um sentido: acertar os passos do homem – individual ou coletivamente – no seu caminho para a eternidade.

É curto o tempo para procurar Jesus, para encontrá-Lo, para tratar com Ele e para amá-Lo. É curto, mas o suficiente, se soubermos usar o dia a dia, a oração e os sacramentos. Triste que haja os que matam o tempo em ociosidade, egoísmo e pecado. Quando o cristão mata o seu tempo na terra, coloca em perigo o seu destino futuro.

Aproveitar o tempo é fazer o que Deus quer que façamos em cada momento e do modo que Ele quer. Aproveitar o tempo é viver plenamente o momento, empenhando a cabeça e o coração naquilo que façamos, com sentido humano e sobrenatural.

A Palavra de Deus leva-nos a refletir numa dimensão essencial da vida cristã: a provisoriedade, viver como peregrinos e forasteiros. Diz–nos São Pedro: “Caríssimos, eu vos exorto como a migrantes e forasteiros: afastai–vos das paixões carnais, que fazem guerra a vós mesmos”. Esses termos lembram-nos de que o nosso viver é provisório. Vivemos, sempre, com o pé na estrada, impelidos pela pressa; todavia, é uma pressa boa que se chama fervor, como a dos hebreus quando estavam para deixar o Egito (cf. Ex 12,11). Não temos aqui cidade permanente, mas estamos à procura da que está para vir. Nós somos cidadãos do céu… (Hb 13,14 e Fl 3,20).

O convite à conversão estende-se a todos os povos. O tema da conversão e da penitência poderia parecer um tema quaresmal, porém não é assim! Toda a nossa vida deve ser marcada pela conversão; o ano todo é tempo de conversão; a vida toda é tempo de conversão!

O testemunho de São Paulo é particularmente importante na ajuda a cada um de nós para alcançar a santidade. O Apóstolo indica-nos a atitude espiritual adequada para progredir no caminho da santidade: “Não que eu já tenha alcançado a meta – escreve aos Filipenses – ou que já seja perfeito, mas prossigo a minha carreira para ver se de algum modo a poderei alcançar, visto que já fui alcançado por Jesus Cristo” (Ef3,12). Sem dúvida, nós, cristãos, devemos buscar a santidade; porém, ainda não alcançamos a meta da santidade; contudo se deixarmo-nos converter de modo incessante pelo Senhor Jesus, certamente, alcançá-la–emos. 

Converter-se significa crer no Evangelho, ou seja, significa pautar a vida pela Boa-Nova, ou o Evangelho de Deus. Significa entrar no discipulado de Cristo. É pautar a nossa vida segundo os ensinamentos e os exemplos do próprio Cristo, em relação a Deus, como seus filhos; em relação ao próximo, como nosso irmão e irmã. Converter-se significa, para cada um de nós, acreditar que Jesus “se entregou por mim”, morrendo na Cruz (cf. Gl 2,20) e, tendo ressuscitado, vive comigo e em mim. Confiando no seu perdão, deixando-me tomar pela sua mão, posso sair das areias movediças do orgulho e do pecado, da mentira e da tristeza, do egoísmo e de toda a falsa segurança, para conhecer a riqueza do seu amor.

No Evangelho, somos chamados, como Simão e André, a aceitar o convite de Jesus: “Segui-me e eu farei de vós pescadores de homens” (Mc 1, 17). Entraremos no discipulado de Jesus se fizermos como Tiago e João: “Jesus os chamou. E eles, deixando o pai Zebedeu na barca com os empregados, o seguiram” (Mc 1, 19-20).

Esses homens deixaram tudo imediatamente e seguiram o Mestre.

Para seguirmos o Senhor, é preciso que tenhamos a alma livre de todo o apegamento; em primeiro lugar, do amor-próprio, da preocupação excessiva pela saúde, pelo futuro…, pelas riquezas e pelos bens materiais; porque, quando o coração se enche dos bens da terra, já não resta lugar para Deus. Por isso o cristão necessita de uma vigilância contínua, de um exame frequente, para que os bens criados não o impeçam de unir-se a Deus; não obstante, antes, sejam um meio de amá-Lo e servi-Lo.

Ensina o concílio Vaticano II, na Lumen Gentium: “Cuidem todos, portanto, de dirigir retamente os seus afetos, para que, por causa das coisas deste mundo e do apego às riquezas, não encontrem um obstáculo que os afaste, contra o espírito de pobreza evangélica, da busca da caridade perfeita, segundo ensinamento de S. Paulo: “Os que usam deste mundo, como se dele não usassem. Pois a figura deste mundo passa” (1 cor 7,31); (LG. 42).

Cristo continua dirigindo-nos, ainda hoje, o mesmo apelo: “Vinde após mim e eu farei de vós pescadores de homens” (Mc 1, 17).

É um chamamento para aderir à pessoa de Jesus, para fazer aprender com Ele a ser uma pessoa nova que vive no amor a Deus e aos irmãos.

Todos os batizados são chamados a serem discípulos de Jesus, a “converterem-se”, a acreditarem no Evangelho, a seguirem Jesus nesse caminho de amor e de dom da vida.

Rezemos com a Igreja, com a Oração do dia (Coleta): “Deus eterno e todo-poderoso, dirigi nossas ações segundo a vossa vontade, para que, em nome do vosso dileto Filho, mereçamos frutificar em boas obras”.

Estejamos atentos! Um dia qualquer destes será o nosso último dia. Hoje mesmo morreram milhares de pessoas nas circunstâncias mais diversas. Para elas foi o fim do mundo, terminou esse tempo que sempre foi e sempre será curto, tempo de preparação e de merecimento. Que bom se, na nossa hora, ouvirmos do Senhor, a quem procuramos conhecer, amar e servir: “Entra no gozo do teu Senhor, servo bom e fiel, porque foste fiel no pouco, Eu te darei muito”.

Que A Virgem Maria, Mãe da Igreja Una e Santa, auxilie-nos com o dom de uma verdadeira conversão, para que se realize o anseio de Cristo: “Sede perfeitos como vosso Pai celeste é perfeito” (Mt 5, 48). E São Paulo: “A vontade de Deus é que sejais santos…” (1Tess 4, 3). 

Mons. José Maria Pereira

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