Homilia de Dom José Maria – II Domingo do Advento (Ano A)

Conversão e Preparação para o Natal!

Dom José Maria Pereira
O Advento é, por excelência, o tempo da esperança, o tempo de preparação para receber o
Salvador. É tempo de conversão! Nele, procuramos despertar nossos corações, a fim de que,
enquanto nos preparamos para celebrar o fato do Natal do Senhor, reacendamos a
expectativa de sua vinda gloriosa, no final dos tempos. Daí o convite de João Batista a todos:
“Convertei-vos, porque o Reino dos Céus está próximo” (Mt 3,2). O tempo é agora: “Preparai o
caminho do Senhor, endireitai suas veredas!” (Mt 3,3). O Senhor veio no passado, vem no
presente e virá no futuro. Ele abraça todas as dimensões do tempo. A esperança verdadeira e
segura, certa e confiável está fundamentada na fé. Sem esperança, não há nada depois da
morte, ou nada que valha a pena. Quando falta Deus, falta esperança e tudo perde sua
consistência, seu significado. Há uma meta: o encontro definitivo com o Senhor. Procuremos
preparar o coração para acolher o Salvador que virá para nos mostrar a sua misericórdia.
Preparai um caminho ao Senhor: trata-se da pregação evangélica e de uma nova consolação,
com o desejo de que a salvação de Deus chegue ao conhecimento de todos os homens.
João Batista prega a conversão, que significa colocar os passos nos passos de Jesus. E isto é um
aspecto que caracteriza a vida cristã inteira. Quando acontece erro, um extravio, cumpre
reconhecer o erro, dispondo-se a receber o dom de Deus, que perdoa sempre, que é
infinitamente misericordioso e oferece a cura espiritual no Sacramento da Confissão.
Converter-se é renascer continuamente para a vida ressuscitada com Cristo. A existência do
cristão deve ser uma conversão contínua. Não é somente purificar-se do estado de pecado,
mas também progredir sempre. Ensina São Paulo: “Nós vos pedimos e exortamos, no Senhor
Jesus, que progridais no modo de proceder para agradar a Deus. Continuai progredindo cada
vez mais” (1Ts 4,1). O cristão convertido sabe que é um peregrino, como ser que vive debaixo
da tenda em condição provisória, como pessoa que jaz sob a lei fundamental de uma
mudança, sempre mais profunda em busca de santificação pessoal.
João foi chamado o Profeta do Altíssimo, porque sua a missão foi ir à frente do Senhor para
preparar os seus caminhos, ensinando a ciência da Salvação a seu povo. João não
desempenhará essa missão à procura de uma realização pessoal, mas concentrando-se em
preparar para o Senhor um povo perfeito. Não se dedicará a ela por gosto pessoal, mas por ter
sido concebido para isso. E irá realizá-la até o fim, até dar a vida no cumprimento da sua
vocação.
Foram muitos os que conheceram Jesus graças ao trabalho apostólico do Batista. Os primeiros
discípulos seguiram Jesus por indicação expressa dele, e muitos outros se preparam
interiormente para segui-Lo graças à sua pregação.
Diz João: “Eu sou a voz que clama no deserto: Preparai os caminhos do Senhor, endireitai suas
veredas” (Mt 3,3). Ele não é mais do que a voz, a voz que anuncia Jesus. Essa é a sua missão, a
sua vida, a sua personalidade. Todo o seu ser está definido em função de Jesus, como teria que
acontecer na nossa vida, na vida de qualquer cristão. O importante da nossa vida é Jesus.
João Batista indica-nos também o caminho que devemos seguir. Na ação apostólica pessoal –
enquanto preparamos os nossos amigos para que encontrem o Senhor –, devemos procurar

não ser o centro. O importante é que Cristo seja anunciado, conhecido e amado. Uma
preocupação de singularidade, a ânsia de sermos protagonistas, não deixaria lugar para Jesus.
Sem humildade, não poderíamos aproximar os nossos amigos de Deus. E, então, a nossa vida
ficaria vazia.
São Gregório Magno comenta que João Batista “prega a fé reta e as boas obras… para que a
força da graça penetre, a luz da verdade resplandeça, os caminhos para Deus se endireitem e
surjam no ânimo pensamentos honestos, depois da escuta da Palavra que guia para o bem”.
No tempo do Advento, também nós somos chamados a ouvir a voz de Deus, que ressoa no
deserto do mundo através das Sagradas Escrituras, sobretudo quando são pregadas com a
força do Espírito Santo. De fato, quanto mais a fé se deixa iluminar pela Palavra divina, tanto
mais se fortalece, por “tudo o que – como nos recorda São Paulo – foi escrito antes de nós…
por nossa instrução, porque, em virtude da perseverança e do conforto que provêm das
Escrituras, mantemos viva a esperança” (Rm 15,4). O modelo de escuta é a Virgem Maria:
“contemplando na Mãe de Deus uma existência totalmente modelada pela Palavra,
descobrimo-nos também nós chamados a entrar no Mistério da Fé, mediante a qual vem
habitar na nossa vida. Cada cristão que crê, recorda-nos Santo Agostinho, num certo sentido
concebe e gera o Verbo de Deus” (Exort. Ap. pós-sinodal Verbum Domini,28).
Hoje, nós não podemos esquecer que somos testemunhas de Cristo. Nós somos testemunhas,
mas que tipo de testemunhas? Como é o nosso testemunho cristão entre os nossos colegas, na
família? Tem força suficiente para persuadir os que ainda não creem em Jesus, os que não o
amam, os que têm uma ideia falsa a seu respeito? São perguntas que poderiam ajudar-nos a
viver este Advento, um tempo a que não pode faltar a dimensão apostólica.
Temos que dar testemunho e, ao mesmo tempo, apontar aos outros o caminho. Diz São
Josemaria Escrivá: “Grande é a nossa responsabilidade, porque ser testemunhas de Cristo
implica, antes de mais nada, procurar comportar-se segundo a sua doutrina, lutar para que a
nossa conduta recorde Jesus e evoque a sua figura amabilíssima. Temos que conduzir-nos de
tal maneira que, ao ver-nos, os outros possam dizer: este é cristão, porque não odeia, porque
sabe compreender, porque não é fanático, porque está acima dos instintos, porque é
sacrificado, porque manifesta sentimentos de paz, porque ama” (É Cristo que passa, nº 122).
O mundo não se abriu nem converteu ainda ao Evangelho. Por isso, soa ainda hoje, e mais
atual do que nunca, a voz de João Batista que ecoa no Advento: “Arrependei-vos…” (Mt 3,2).
Olhemos em direção ao Menino Deus que está para chegar! Hoje, o mundo, muitas vezes, olha
em outra direção, donde não virá ninguém. Muitos se acham debruçados sobre os bens
materiais como se fossem o seu fim último; mas com eles jamais satisfarão seu coração. Temos
que apontar-lhes o caminho, a todos.
Não é possível acolher “Aquele que vem, “ se o nosso coração estiver cheio de egoísmo, de
orgulho, de autossuficiência, de preocupação com os bens materiais. Não bastam aparências,
apenas de que somos cristãos, porque recebemos o Batismo. A conversão deve ser
comprovada pela ação.
Quando Jesus nasce, os anjos cantam: paz na terra. Não é desejo ou conselho, mas um fato.
Jesus diz: “deixo-vos a paz, a minha paz vos dou”. A partir de Jesus, a paz, se não é uma
realidade generalizada, é uma possibilidade real e acessível aos de boa vontade. A paz que o
mundo não pode dar, tirar ou impedir.

Santo Agostinho dizia: paz é a tranquilidade da ordem. Ordem entre nós e Deus, entre nós e o
próximo, entre a razão e os instintos dentro de nós. Paz é harmonia, fruto do Espírito Santo. A
paz interior, do coração, é a única que pode favorecer a outra paz, a exterior. A paz interior é
condição e raiz da paz exterior. A paz total, interna e externa, é uma meta, somente em
plenitude, quando Jesus voltar para instaurar novos céus e nova terra. Enquanto isso, a receita
verdadeira da paz está contida no Evangelho: “Convertei-vos, porque o Reino dos Céus está
próximo”. E é necessário produzir frutos que provem a vossa conversão.
Senhor, fazei de mim um instrumento de vossa paz. Onde houver ódio, que eu leve o amor.
Onde houver ofensa, que eu leve o perdão. Onde houver discórdia, que eu leve a união. Onde
houver dúvida, que eu leve a fé. Onde houver desespero que eu leve a esperança. Onde
houver tristeza, que eu leve alegria. Onde houver trevas, que eu leve a luz. Que eu procure
mais consolar que ser consolado, compreender que ser compreendido, amar que ser amado.
Sim, Senhor, fazei de nós instrumentos da vossa paz!
“A nossa salvação baseia-se numa vinda”, escreveu Romano Guardini. E, continua Guardini: “O
Salvador veio da liberdade de Deus… Assim a decisão da fé consiste… em acolher Aquele que
se aproxima. O Redentor vem junto de cada homem: nas suas alegrias, nos seus
conhecimentos claros, nas suas perplexidades e tentações, em tudo o que constitui a sua
natureza e a sua vida”.
À Virgem Maria, em cujo seio habitou o Filho do Altíssimo, pedimos que nos ampare, neste
caminho espiritual, para acolher com fé e com amor a vinda do Salvador.
Quais os caminhos tortos que devemos endireitar? Quais os frutos de conversão que Deus está
esperando de nós, neste Advento, em preparação ao Natal?

Dom José Maria Pereira

Facebook
Twitter
LinkedIn
Pinterest
Pocket
WhatsApp

Veja Mais