Homilia para o II Domingo da Páscoa – Ano C
At 5,12-16
Sl 117
Ap 1,9-11a.12-13.17-19
Jo 20,19-31
Este Domingo da Oitava da Páscoa, ainda o Dia mesmo da Ressurreição, é de uma riqueza ímpar!
Recordemos, antes de tudo, que a atenção da Mãe Igreja se volta para seus filhinhos recém-nascidos na Noite Santa da Páscoa: “Como crianças recém-nascidas, desejai o puro leite espiritual para crescerdes na salvação” (1Pd 2,2). Estas são as palavras da entrada da Missa de hoje, tal como o Missal nos coloca. Mas, o cuidado não é somente com os recém-nascidos, os neófitos (recém-plantados), mas com todos os que antes já eram cristãos. Daí a exuberante oração da Missa hodierna: “Que compreendamos melhor o Batismo que nos lavou, o Espírito que nos deu nova vida e o Sangue que nos redimiu”. Tudo, aqui, recorda a Vida nova do Ressuscitado, que recebemos nos Sacramentos da Iniciação Cristã: o Batismo que nos lavou do pecado, mergulhando-nos na Morte e Ressurreição do Senhor; o Sangue da Eucaristia, na qual celebramos o mistério da nossa redenção, comungando com o Senhor na Sua Morte e Ressurreição; e o Espírito do Ressuscitado, que nos é dado nestes e em todos os Sacramentos! Em outras palavras: “Pai Santo, Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, Deus e Pai fidelíssimo, que arrancaste o Teu Filho do mar da Morte, dá-nos a graça de mergulhar, pelos Sacramentos da Tua Igreja, cada vez mais, no mistério Daquele que morreu e ressuscitou! Que o Batismo nos configure mais e mais ao Cristo morto e ressuscitado; a santa Confirmação (Sacramento do Crisma) dê-nos a força de viver nossa vocação na Comunidade cristã e testemunhar o Senhor vitorioso diante do mundo; e a Eucaristia nos faça participantes, nesta vida, da Morte e Ressurreição do Cordeiro imolado, até que nos sentemos à Sua Mesa no Reino imperecível! – Eis o tom da presente liturgia!
Quanto às leituras, oito dias após a Ressurreição, “no primeiro dia depois do sábado” dos judeus, primeiro dia da nova criação, Dia do Senhor Ressuscitado, Dia dos cristãos reunidos em Igreja, Jesus entrou onde estavam os apóstolos. As portas fechadas não impedem: Ele está ressuscitado; Seu corpo é o mesmo da Cruz, é material, concreto, mas, totalmente transfigurado pelo Espírito Santo, já não obedece às leis da química, da física, da matéria como a conhecemos; é matéria “espiritualizada”, matéria do mundo que há de vir…
Ele entra e Se coloca no meio dos discípulos, no nosso meio! Ainda hoje, é assim que Ele faz; como está aqui agora, nesta sagrada Assembleia eucarística! E Sua primeira palavra é Shalom, Paz! Depois, mostra-lhes as mãos e o lado! Dá a Paz e mostra o preço da Paz! A Paz, aqui, é a nossa reconciliação com Deus, o Pai: já não somos mais inimigos, malditos, distantes: “O castigo que havia de nos trazer a paz caiu sobre Ele; pelas Suas feridas fomos curados” (Is 53,5). Nossa paz com Deus, conosco, com os irmãos e com toda a criação custou o sangue do Senhor nosso! Depois, Ele afirma: “Como o Pai Me enviou, Eu também vos envio”. Como o Pai enviou o Filho? No Espírito Santo: no Espírito Ele Se fez homem; no Espírito, foi ressuscitado! “Como o Pai Me enviou, Eu também vos envio. Recebei o Espírito Santo!” É assim que, doravante, a Igreja dos discípulos deverá dirigir-se ao mundo: na força e na energia do Santo Espírito, que é dado como Espírito de paz, de perdão dos pecados, de reconciliação da humanidade com o Pai pelo Cristo: “A quem perdoardes os pecados, eles lhes serão perdoados; a quem os não perdoardes, eles lhes serão retidos”.
Que nunca esqueçamos: é parte essencial da missão da Igreja anunciar e realizar, em nome do Senhor Jesus, o perdão dos pecados, sobretudo no Sacramento da Reconciliação! Quem nega isso, invalida o mandato de Cristo e cai em heresia! É uma nova criação que está começando com a Ressurreição do Senhor: Ele, o Homem Novo, no primeiro dia após o sábado dos judeus, nos renova no Batismo no Espírito e nos envia em missão! Como não recordar aqui as palavras de São Paulo? “Se alguém está em Cristo é uma nova criatura. Passaram-se as coisas antigas; eis que tudo se fez uma realidade nova! Tudo isto vem de Deus, que nos reconciliou Consigo por Cristo e nos confiou o ministério da reconciliação. Pois era Deus que em Cristo reconciliava o mundo Consigo” (2Cor 5,17ss). Finalmente, o Senhor nos convida à fé, a viver nesta fé profunda, serena, constante e entusiástica: “Bem-aventurados os que creram sem terem visto!”
Mas, hoje, é necessário dizer ainda mais! Hoje é Oitava da Páscoa! Não se pode ficar calado! Quem é este Cristo ressuscitado? O Apocalipse, na segunda leitura, nos deslumbra: no Domingo, Dia do Senhor Ressuscitado, Dia de Missa, Dia de escutar a Palavra e repartir o Pão, João, nosso irmão de fé, de tribulação e de esperança, foi arrebatado num êxtase. Viu e ouviu o Ressuscitado: Sua voz era como a de trombeta; voz majestosa, divina, com todo poder no céu e na terra! Sua túnica era comprida, como a dos sacerdotes; no peito, tinha uma faixa de ouro, própria dos reis. Quem é Ele? “Eu sou o Primeiro e o Último, o Vivente. Estive morto, mas agora estou vivo para sempre. Eu tenho a chave da Morte e da região dos mortos!” – Que imagem impressionante; que palavras de nos deixarem boquiabertos!
Olhai o nosso Jesus, o nosso Senhor! Olhai em Quem pusestes a vossa esperança! Olhai a Quem saudais na Sequência de Páscoa, que cantamos antes do Evangelho: o Príncipe que estava morto e, agora, reina vivo, após um tremendo duelo com a Morte! Irmãos, Irmãs, “Não tenhais medo!” Este mesmo Senhor, tão glorioso, tão triunfante, tão potente, tão vivo, está continuamente presente na Sua Igreja, que somos nós, pequena e frágil comunidade! Hoje, a Igreja é tão humilhada, tão sacudida, interna e externamente… Hoje, nossas próprias fraquezas são colocadas aos quatro ventos, como um modo de desacreditar o Evangelho, desacreditando a Comunidade dos discípulos de Jesus… E, às vezes, nós somos culpados! Mas, não tenhais medo! O Senhor está no nosso meio: “a Pedra que os pedreiros rejeitaram tornou-Se a pedra angular” da Igreja! Cristo atua entre nós, como atuou no início, por meio dos Apóstolos! Que hoje não nos preocupemos com grandes milagres visíveis, úteis e necessários para despertar a fé nos inícios do cristianismo… Preocupemo-nos, isto sim, com os pequenos milagres, tão necessários para que o mundo creia: a nossa adesão total e absoluta a Cristo, nosso único Senhor e único Salvador de toda a humanidade, de toda a criação, a nossa coerência de cristãos, a nossa profissão integral e inegociável da santa fé católica e apostólica, a nossa união amorosa com o Cristo na oração e nos Sacramentos, o nosso esforço de uma vida santa, a nossa união fraterna no Senhor! Eis os milagres úteis para os nossos dias, muito mais que os shows de curandeirismos que se veem por aí e que de cristão nada possuem, além do nome!
Irmãos, irmãs, renovemos nosso entusiasmo, nossa adesão a Cristo, nossa esperança Nele, tão fiel, tão presente entre os Seus! Ouvimos Sua Palavra; vamos, daqui a pouco, reconhecê-Lo, ao partir o Pão! Mais uma vez é Domingo e, mais, uma vez, Ele Se coloca entre nós! Não sejamos incrédulos, mas fieis! E que o nosso coração arda, mais uma vez, como o coração daqueles nossos dois irmãos nossos no caminho de Emaús!
Irmãos, o Senhor ressuscitou verdadeiramente! Ele estará conosco até a consumação dos séculos! Aleluia!