Homilia de D. Anselmo Chagas de Paiva, OSB – III Domingo do Advento – Ano C

Alegrai-vos sempre no Senhor!

Lc 3,10-18

Caros irmãos e irmãs,

Neste terceiro Domingo de Advento, conhecido como domingo “Gaudete”, a Liturgia da Palavra nos convida à alegria. O Advento é um tempo de compromisso e de conversão, para preparar a vinda do Senhor, mas a Igreja nos faz antecipar o júbilo do Natal já próximo. Como de fato, o Advento é também tempo de alegria, porque desperta nos corações dos fiéis a expectativa da vinda do Salvador. Este aspecto jubiloso está presente nas leituras bíblicas deste domingo, bem como o tema da conversão em vista da manifestação do Salvador, anunciado por João Batista, como nos assinala o texto evangélico que ouvimos.

O convite do Apóstolo São Paulo completa o clima litúrgico deste domingo “Gaudete”, expressão oriunda da palavra latina com que começa o canto de entrada da Santa Missa, segundo o gradual monástico: “Gaudete in Domino semper…”, que é uma exortação feita por São Paulo aos Filipenses, mas também endereçada a cada um de nós: “Alegrai-vos sempre no Senhor…” (Fl 4,4-5).  O tema da alegria aparece ainda como uma súplica ao Senhor na oração da coleta, logo no início da Santa Missa: “…daí chegarmos às alegrias da salvação e celebrá-las sempre com intenso júbilo na solene liturgia”.

A primeira Leitura constitui um convite insistente à alegria. O trecho começa com esta expressão: “Alegra-te, filha de Sião! … Exulta e rejubila-te com todo o teu coração, filha de Jerusalém!” (Sf 3,14), que é semelhante à do anúncio do anjo a Maria: “Alegra-te, cheia de graça!” (Lc 1,26). O motivo essencial pelo qual a filha de Sião pode exultar é expresso na afirmação: “O Senhor, está no meio de ti” (Sf 3,15.17); literalmente, seria “está no teu ventre”, com uma clara referência à permanência de Deus na Arca da Aliança, colocada sempre no meio do povo de Israel. O profeta quer nos dizer que já não há qualquer motivo de desconfiança, de desânimo e de tristeza, independentemente da situação que devemos enfrentar, porque estamos certos da presença do Senhor, a única que é suficiente para tranquilizar e rejubilar os corações. Além disso, o profeta Sofonias deixa entender que esta alegria é recíproca: somos convidados a alegrar-nos, mas também o Senhor se rejubila pela sua relação conosco; com efeito, o profeta escreve: “Ele rejubila-se por causa de ti, e renova-te o seu amor. Exulta de alegria por ti” (v. 17). A alegria que é prometida neste texto profético encontra o seu cumprimento em Jesus, que se encontra no seio de Maria, a “Filha de Sião”, e assim estabelece a sua morada no meio de nós (cf. Jo 1,14). Com efeito, vindo ao mundo Ele doa-nos a sua alegria, como Ele mesmo confia aos seus discípulos: “Disse-vos essas coisas para que a minha alegria esteja em vós, e a vossa alegria seja completa” (Jo 15,11). Jesus traz aos homens a salvação, uma nova relação com Deus que vence o mal e a morte, e traz a verdadeira alegria mediante esta presença do Senhor que vem iluminar o nosso caminho. E nós temos que ser portadores desta presença de Deus (cf. BENTO PP XVI, Homilia 16 de dezembro de 2012).

Com efeito, a alegria é um elemento central da experiência cristã. A Igreja tem a vocação de levar ao mundo a alegria. No difícil contexto atual em que vivemos, diante das dificuldades impostas pela pandemia, criou-se um clima de medo e incertezas, com isto temos uma imensa necessidade de esperança e de alegria. A aspiração pela alegria está impressa no íntimo do ser humano. Além das satisfações imediatas e passageiras, o nosso coração procura a alegria profunda, total e duradoura, que possa dar “sabor” à nossa existência. 

No Evangelho vemos como os acontecimentos que marcam o início da vida de Jesus se caracterizam pela alegria. Quando o anjo Gabriel anuncia à Virgem Maria que ela será mãe do Salvador, começa com esta palavra: “Alegra-te!” (Lc 1,28). A visita de Maria a Isabel fez com que João Batista salte de alegria no ventre de sua mãe (cf. Lc 1,41). E quando Jesus nasce, o Anjo do Senhor diz aos pastores: “Eis que vos anuncio uma grande alegria, que será de todo o povo: hoje, na cidade de Davi, nasceu para vós um Salvador, que é Cristo Senhor” (Lc 2,11). E os Magos que procuravam o menino, “ao ver a estrela, sentiram uma grande alegria” (Mt 2,10). Por conseguinte, o motivo desta alegria é a proximidade de Deus, que se fez um de nós. E é isto que São Paulo queria significar quando escreveu aos cristãos de Filipos: “Alegrai-vos sempre no Senhor, repito, alegrai-vos. Que a vossa mansidão seja notória a todos os homens. O Senhor está perto” (Fl 4,4-5). A primeira causa da nossa alegria é a proximidade do Senhor, que vem ao mundo para estar conosco.

De fato, do encontro com Jesus nasce sempre uma grande alegria interior. Podemos ver isto nos Evangelhos em muitos episódios. Recordemos a visita de Jesus a Zaqueu, um cobrador de impostos desonesto, um pecador público, ao qual Jesus diz: “Hoje tenho que ficar em tua casa”. E conforme sublinha o evangelista São Lucas, Zaqueu o recebeu cheio de alegria” (Lc 19,5-6). É a alegria do encontro com o Senhor; é o sentir o amor de Deus que pode transformar toda a existência e trazer salvação. E Zaqueu decidiu mudar de vida e dar metade dos seus bens aos pobres.

Na ceia com os seus discípulos, diz Jesus: “Como o Pai Me amou, também Eu vos amei. Permanecei no meu amor… Digo-vos isto para que a Minha alegria esteja em vós e a vossa alegria seja plena” (Jo 15,9.11). Ele promete aos seus discípulos: “Vós haveis de estar tristes, mas a vossa tristeza há de converter-se em alegria” (Jo 16,20). E insiste: “Eu vos verei de novo! Então, o vosso coração há de alegrar-se e ninguém vos poderá tirar a vossa alegria” (Jo 16,22). Com isto, Jesus quer nos introduzir na alegria plena. E a alegria é sinal da sua presença e da sua ação em nós. Santa Teresa do Menino Jesus escrevia: “Amar Jesus é a minha alegria!” (S. TERESA DO MENINO JESUS, Obras Completas, p. 45).

Jesus disse que “o reino do céu é semelhante a um tesouro escondido no campo; um homem encontra-o e esconde-o; depois vai, cheio de alegria, vende todos os seus bens e compra o campo” (Mt 13,44). Encontrar e conservar a alegria espiritual nasce do encontro com o Senhor, que pede para o seguir, para fazer a escolha decidida de apostar tudo nele. Procurar o Senhor, encontrá-lo na vida significa também acolher a sua Palavra, que é alegria para o coração. O profeta Jeremias escreve: “A Vossa palavra é a minha alegria, as delícias do meu coração” (Jr 15,16). 

Todos os domingos, na Eucaristia, as comunidades cristãs celebram o Mistério central da salvação: a morte e ressurreição de Cristo. É o dia no qual encontramos Cristo Ressuscitado, ouvimos a sua Palavra, nos alimentamos do seu Corpo e do seu Sangue; o que nos lembra o Salmo 118 que diz: “Este é o dia que o Senhor fez para nós, cantemos e nele alegremos” (Sl 118, 24). Com isto, percebemos que na alegria, somos chamados a viver no amor e na verdade, a viver em Deus.

Certa vez Jesus convidou um jovem rico para segui-lo, mas ele não acolheu o convite de Jesus e retirou-se entristecido (cf. Mc 10,17-22). Não soube desapegar dos bens materiais a fim de possuir o bem maior proposto por Jesus. A tristeza do jovem rico do Evangelho é aquela que nasce no coração de cada um nós, quando não temos coragem de acolher o convite de Jesus para segui-lo.

Hoje somos exortados à alegria, mas também nos exorta à conversão. Abramos o nosso espírito a este convite; corramos ao encontro do Senhor que vem, invocando e imitando a Virgem Maria que, silenciosa e orante, esperou e preparou a Natividade do Redentor, que vem ao mundo para nos proporcionar a alegria e a paz.  Ela que acolheu o Senhor dentro de si e proclamou no cântico do Magnificat: “O meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador” (Lc 1, 47).  E a ela que veneramos como “causa da nossa alegria” porque nos deu o Cristo Jesus, possa interceder sempre por nós e nos acompanhar com seu olhar materno ao longo do nosso itinerário de cada dia.  Assim seja.

Anselmo Chagas de Paiva, OSB

Mosteiro de São Bento/RJ

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