Homilia de D. Anselmo Chagas de Paiva, OSB – I Domingo do Advento – Ano C

Meus caros amigos,

Com este domingo iniciamos o Advento, formado pelas quatro semanas que precedem o Nascimento de Jesus Cristo. Um tempo litúrgico de grande sugestão religiosa, porque está impregnado de esperança e de expectativa espiritual, tempo de preparação para o Natal do Senhor. A partir deste domingo, a Igreja se veste de roxo para esperar, em atitude de vigilância, em oração e penitência, para este grande momento: A chegada do nosso Salvador.

Com a entrada do Advento a liturgia da Igreja recomeça a sua caminhada cíclica. No mundo exterior, as lojas especializadas já vão iluminando e ornamentando os seus ambientes.  Ao lado disso, nossa consciência cristã é convidada a viver o espírito litúrgico deste tempo de preparação para o Natal.  É uma ocasião em que o povo cristão revive o duplo movimento do espírito: por um lado, eleva o olhar rumo à meta final da sua peregrinação na história, que é a vinda gloriosa do Senhor Jesus; por outro, recorda com emoção o seu nascimento em Belém. A esperança dos cristãos orienta-se para o futuro, mas permanece sempre bem arraigada num acontecimento do passado. 

A palavra “advento” significa “vinda”, “presença”. No mundo antigo indicava a visita do rei ou do imperador a uma província; na linguagem cristã refere-se à vinda de Deus, à sua presença no mundo; um mistério que envolve totalmente o cosmos e a história, mas que conhece dois momentos culminantes. São Bernardo de Claraval nos ensina que existem três dessas vindas de Jesus. A primeira ocorreu há mais de dois mil anos, na humildade de uma manjedoura, em Belém. A terceira será a vinda definitiva, no fim dos tempos, quando Jesus se assentará no trono da glória para julgar os atos da humanidade. A segunda vinda, por sua vez, é uma vinda intermediária, que pode acontecer todos os dias, por meio dos sacramentos, sobretudo pela Confissão e pela Eucaristia. E é justamente essa a vinda para a qual devemos nos preparar no tempo do Advento (cf. S. BERNARDO DE CLARAVAL, Obras completas, Madrid, 1953, p. 177).

Nada melhor para assimilarmos o verdadeiro espírito deste período de preparação para o Natal do que relembrarmos as palavras cheias de sabedoria, que aparecem no prefácio das missas das duas primeiras semanas. Referindo-se ao Divino Salvador, elas dizem: “Revestido da nossa fraqueza, Ele veio a primeira vez  para realizar seu eterno plano de amor e abrir-nos o caminho da Salvação.  Revestido da sua glória, Ele virá uma segunda vez para conceder-nos em plenitude os bens outrora prometidos e que hoje vigilantes esperamos”.

E as leituras deste primeiro domingo do advento nos permitem descobrir o que é, na sua realidade, este tempo: um misto de recordação, de presença e de expectativa, como é, aliás, toda a liturgia da Igreja.  Expectativa é também o que ecoa do texto evangélico.  Nele Jesus faz chegar até nós aquelas palavras que impregnam todo o tempo do Advento: Ficai atentos! Vigiai!  O Evangelista São Lucas já nos apresenta uma proclamação de esperança: Aproxima-se o tempo da salvação do homem. 

O Natal, de fato,  é o primeiro passo de um caminho que vai terminar na glória da segunda vinda de Cristo. Por isso, somos convidados a Vigiar.  A liturgia deste domingo nos ajuda a refletir sobre como deve ser esta atitude cristã de espera. Vigilância é a grande palavra.  Porém, não uma vigilância feita de susto e de terror, mas feita de confiança em Deus que nos ama.  Somos convidados à vigilância porque o Cristo está para chegar.

A palavra “vigiai” é hoje dirigida também a cada um de nós, porque cada um, na hora que só Deus conhece, será chamado a prestar contas da própria existência. Isto exige um justo desapego dos bens terrenos, um arrependimento sincero dos próprios erros, uma caridade laboriosa em relação ao próximo e uma entrega humilde e confiante a Deus.

No Advento, a liturgia nos repete com freqüência e nos assegura que Deus “vem”: vem para estar conosco, em cada uma de nossas situações; vem para viver entre nós, para viver conosco e em nós; vem para preencher as distâncias que nos dividem e separam; vem para nos reconciliar com Ele e entre nós. Ele vem na história da humanidade para tocar à porta de cada homem e de cada mulher de boa vontade, para oferecer aos indivíduos, às famílias e aos povos o dom da fraternidade, da concórdia e da paz.

No texto evangélico encontramos uma série de imperativos para nos aproximar do assombro desta espera: levantai-vos, erguei a cabeça, tende cuidado, estai acordados, ficai de pé (cf. Lc 21,34-36). Vale a pena escutar este grito do nosso coração que continuamente nos exige o milagre de uma novidade que não acabe. Acolher na nossa vida o Filho de Deus que vem ao mundo, eis o compromisso deste Advento.

O tempo do Advento nos leva a recordar Aquele que já chegou, e a acolher sua vinda incessantemente presente. Por último, prepara-nos para o dia da sua volta prometida. Este é o paradoxo da nossa fé: recordar quem veio, a partir da acolhida de quem nunca foi embora, para preparar-nos para receber quem voltará. O paradoxo consiste em que o sujeito é a mesma pessoa: Jesus Cristo. Este é o tempo que nos prepara para a celebração do Natal cristão.  Levantemos!  Despertemos!

O Senhor Jesus veio no passado, vem no presente e virá no futuro. Ele abraça todas as dimensões do tempo, porque morreu e ressuscitou e, compartilhando nossa precariedade humana, permanece para sempre e nos oferece a própria estabilidade de Deus.   Nesta ânsia pela vinda do Senhor, sempre podemos crescer mais, para que sua chegada seja preparada do modo mais perfeito possível.  Portanto, a liturgia deste domingo nos ensina o dinamismo do crescimento, com vistas ao reencontro definitivo com nosso Senhor. O cristão é aquele que, em cada dia, sente que há um caminho novo a fazer. É nesta atitude que somos chamados a viver este tempo de espera pelo Messias.

Os abalos e catástrofes cósmicos que expressam a vinda do Filho do Homem são vistos numa perspectiva de transformação do universo e do próprio homem.  Por isso, a reação humana em face destas realidades tremendas não é de temor, mas de confiança, de esperança.  De fato, os fiéis se erguem, levantando a cabeça em vez de se prostrarem e se curvarem, pois, reconhecem a proximidade da própria salvação (v. 28). E a vida do homem desenvolve-se no amor do Senhor, não obstante todas as dolorosas experiências da destruição e da morte, a caminho da final realização em Deus.

O Advento traz consigo o convite à paz de Deus para todos os homens. E necessário construirmos esta paz e continuamente a reconstruirmos em nós mesmos e com os outros: nas famílias, nas relações com os vizinhos, nos ambientes de trabalho e na vida da sociedade inteira.

Saibamos estar prontos a encontrar o Salvador, que vem revelar-nos o rosto do Pai celeste. Que o Senhor nos conceda a graça de iniciarmos com impulso e boa vontade o itinerário do Advento, indo com as boas obras ao encontro de Cristo, nosso Redentor.

Peçamos também à Virgem Maria, aquela que foi escolhida por Deus para ser a mãe do Salvador, que ela nos guie e nos acompanhe neste caminho do Advento.  Ela espera com grande recolhimento interior o nascimento do seu Filho, que é o Messias.  Todos os seus pensamentos se dirigem para Jesus, que nascerá em Belém.  Assim, possamos também nós, aproveitar este tempo para uma preparação adequada na espera daquele que Vem.  Assim seja. 

Anselmo Chagas de Paiva, OSB
Mosteiro de São Bento/RJ

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