Tesouro da fé
Há poucas palavras de apenas duas letras que contenham tanta densidade como essa: Fé. Os apóstolos, ao compreender algo dessa realidade, pediram ao Senhor: “aumenta-nos a fé!” (Lc 17,5). O Catecismo da Igreja Católica diz que a fé é uma resposta a Deus (cfr. Cat. 26). Trata-se de uma resposta afirmativa: dizemos “sim” ao seu plano de salvação e começamos a viver de fé (cfr. Rm 1,17). Toda a Igreja vive de fé e o Catecismo o expressa na sua estrutura: na primeira parte trata a fé professada: o Credo; na segunda, a fé celebrada: a liturgia; na terceira, a fé vivida: a moral católica; a quarta e última, a fé interiorizada na oração cristã, cujo resumo se encontra no Pai-nosso.
Pelo menos, desde S. Agostinho, é comum falar de três aspectos da fé. O primeiro deles é o subjetivo (credere in Deum), a entrega pessoal a Deus que cada um faz ao acreditar nele e nas suas promessas. Não se trata de ter fé como se tem um carro ou uma casa. Não! A fé impregna toda a nossa existência e, a partir do encontro com Deus, nós, fiéis de Cristo, não podemos explicar a nós mesmos sem a fé. Crer em Deus marca um antes e um depois na nossa vida: as nossas relações familiares, laborais, sociais, econômicas, políticas, etc., recebem um novo sentido, uma nova visão; simplesmente, vemos à maneira de Deus. Nós, crentes em Deus, não podemos permitir uma espécie de divórcio entre a fé e a vida, entre as convicções religiosas e as científicas, entre a maneira de atuar na presença de Deus e a de atuar, por exemplo, na política. Nós, os filhos de Deus, vivemos a unidade de vida. Cremos em Deus e lutamos pelo bem da humanidade e de cada pessoa que temos ao nosso lado, conscientes de que podemos e devemos oferecer aos nossos amigos o nosso tesouro, o que mais vale: a fé em Deus, a amizade com Cristo, o sentido para a vida e… para a morte.
O segundo aspecto da fé é o objetivo (Credere Deum). Qual é o objeto da nossa fé? “Corramos com perseverança ao combate proposto, com o olhar fixo no autor e consumador de nossa fé, Jesus” (Hb 12,1). Como é importante manter o olhar fixo naquele que é fonte e meta, o único Salvador e Senhor do gênero humano: Jesus Cristo! Cremos em Deus, mas esse único Deus é três Pessoas: Pai e Filho e Espírito Santo. Cremos que Deus fez-se homem para a nossa salvação: o Filho único do Pai eterno fez-se carne, pela ação do Espírito Santo, nas entranhas puríssimas da Virgem Maria. A nova criação é a humanidade de Jesus e todos os que querem fazer parte dessa nova realidade têm que entrar em Cristo. Não podemos sequer ofuscar as verdades da nossa fé. São Paulo era tão consciente disso que deixou escrito que “ainda que alguém – nós ou um anjo baixado do céu – vos anunciasse um evangelho diferente do que vos temos anunciado, que ele seja anátema” (Gl 1,8).
Além do mais, ainda que sejamos compreensivos com aqueles que nunca creram, que são ateus, não podemos deixar de sentir um grande pesar por essas pessoas e pedir para elas o dom da fé. Em 1942 fundou-se em Inglaterra o Clube Socrático da Universidade de Oxford. Lewis, famoso literata, era o presidente do Clube. Em determinado momento um conferencista relativista terminava a sua intervenção afirmando: “O mundo não existe, Inglaterra não existe, Oxford não existe e estou seguro de que eu não existo!” Lewis, que era um mestre em respostas rápidas, disse-lhe: “E como vou dirigir-me a um homem que não está aqui?” O absurdo é ridículo! De fato, a Sagrada Escritura chega a afirmar que quem não acredita em Deus é insensato, isto é, falta-lhe o bom senso (cfr. Sl 13,1).
O terceiro aspecto é o motivo pelo qual cremos: a autoridade de Deus que se revela (Credere Deo). Não acreditamos porque estudamos muito ou temos muitos argumentos racionais, nem mesmo porque nos sentimos bem, nem muito menos porque a família sempre foi católica. Esses motivos são insuficientes. Cremos por Jesus Cristo nosso Senhor! O Amém da nossa fé está fundado em Deus que não se engana, nem pode enganar-se. A certeza da fé é mais segura que qualquer certeza científica. É interessante como algumas verdades científicas, certas noutros tempos, foram já totalmente descartadas. A ciência progride continuamente, Jesus Cristo, ao contrário, “é sempre o mesmo: ontem, hoje e por toda a eternidade” (Hb 13,8). É verdade, pode crescer a nossa compreensão do mistério de Cristo, mas ele é sempre o mesmo.
Os apóstolos realmente souberam apreciar o grande dom da fé e por isso não somente pedem-no, mas suplicam um aumento desse dom. Fé! Fé! Fé! Peçamos insistentemente ao Senhor que aumente a nossa fé e não descuidemos esse tesouro, por exemplo, lendo coisas perigosas, cheias de falácias; não nos deixemos levar da malsã curiosidade em escutar teorias de supostos teólogos que – em lugar de servir à fé e explicá-la – minam os seus fundamentos e arrancam as raízes da salvação do coração das pessoas. Atentar contra a fé dos outros, máxime quando se trata de pessoas simples, é uma impiedade tão grande que Jesus advertiu utilizando uma expressão que soa dura aos nossos ouvidos: “se alguém fizer cair em pecado um desses pequenos que crêem em mim, melhor seria que lhe atassem ao pescoço a mó de um moinho e o lançassem no fundo do mar” (Mt 18,6).
Pe. Françoá Costa