Retrospectiva – Prospectiva
Mais uma vez a liturgia da Igreja nos permite escutar o prólogo do Evangelho segundo São João. Trata-se de um texto cujas expressões são riquíssimas, o evangelista começa na eternidade de Deus e termina no mistério de Cristo, dom de Deus para a nossa salvação. Sendo hoje o último dia do ano, também eu gostaria de fazer uma reflexão que comece na eternidade e se dirija novamente à eternidade.
As Sagradas Escrituras afirmam que Deus “nos escolheu nele [em Cristo] antes da criação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis, diante de seus olhos” (Ef 1,4). Santo Hilário nos ajuda a entender melhor essa expressão quando afirma que “nada do que existe deixou de estar sempre com Deus, pois, embora todas as coisas tenham começado, no que se refere à sua criação, no que diz respeito à ciência e ao poder de Deus, não tiveram início. (…) As coisas futuras, embora ainda estejam para ser criadas do ponto de vista da criação, já estão feitas, para Deus, para quem nada há de novo nem de repentino naquilo que há de ser criado, pois o desígnio divino realizado no tempo é de que sejam criadas” (Santo Hilário de Poitiers, Tratado sobre a Santíssima Trindade, XII, 39). Nós já estávamos, portanto, nos desígnios eternos de Deus! Agradeçamos ao Pai porque nos predestinou, nos chamou desde toda a eternidade, para sermos seus filhos no Filho Jesus Cristo, que agora contemplamos pequenino e com uma simpatia que conquistou o nosso coração.
Mas também chegaram os tempos da rebeldia para com Deus: a desobediência de Adão, o fratricídio de Caim, a corrupção dos homens podem ter se refletido durante esse ano que passou na nossa desobediência e corrupção. Peçamos perdão ao Senhor! Já não será necessário outro dilúvio que purifique a humanidade, mas virá com certeza o grande e terrível dia do Juízo Final que separará a raça humana em dois grandes blocos: ovelhas e cabritos, benditos e malditos, os da direita e os da esquerda, os do Reino e os do fogo eterno, os que praticaram boas obras e os que não as praticaram (cfr. Mt 25). Assim reza a nossa fé: “espero a ressurreição dos mortos e a vida do mundo que há de vir” (Símbolo Niceno-Constantinopolitano).
2011 também foi um ano propício para que praticássemos uma virtude que se encontra no fundamento da vida cristã, a fé. De fato, neste ano o Santo Padre anunciou o Ano da Fé 2012-2013. Neste sentido, Abrahão se ergue diante da nossa visão cristã da história para mostrar-nos que somente quando confiamos em Deus as coisas vão para a frente, dão certo. A história do patriarca dos que creem em Deus é um convite constante para que fiemos nas promessas de Deus. É preciso que continuemos vivendo de fé, que “é uma certeza a respeito do que não se vê” (Hb 11,1). A fé é certeza! Abrahão foi um homem que movido pelas esperanças eternas construiu o presente – ele “tinha a esperança fixa na cidade assentada sobre os fundamentos” –; também nós, tendo os nossos olhares fixos em Deus, na eternidade, no prêmio eterno, construiremos essa cidade dos homens. A fé nos impulsionou durante esse ano a trabalhar, a trabalhar bem; no ano que vem, ela nos impulsionará a trabalhar melhor ainda por Deus e pelos homens e mulheres, nossos irmãos e irmãs.
Na história da salvação que acontece nas nossas vidas, chegaram também os tempos das ânsias de Deus, do desejo ardente de perfeição, do pedido para ver a glória de Deus. Atualiza-se, de certo modo, a história de Moisés que tem coragem de pedir a Deus: “mostrai-me vossa glória” (Ex 33,18). 2011 foi um ano de crescimento na fé e na santidade? Se a resposta é afirmativa, bendito seja Deus! É preciso que 2012 seja um ano de maior santidade. Caso a resposta seja negativa, não há motivo para entristecer-se! 2012 pode ser melhor, pode ser o ano das ânsias de Deus, do desejo ardente de contemplar o Senhor já aqui nesta terra e depois, quando ele nos chamar, eternamente no céu.
E caso desfaleçamos no caminho, não nos preocupemos, temos profetas! Os nossos irmãos de caminhada nos ajudarão a não sairmos do caminho de Deus que é Cristo; eles serão um despertador para nós através da oração, da correção fraterna e do carinho humano e cristão que sentem por nós. Graças a Deus que também durante o ano que passamos, nós pudemos experimentar essa presença fraterna e amiga que tanto nos ajudou a seguir adiante, a não escutar a voz dos lobos, a levar uma vida na presença de Deus. Peçamos ao Senhor que aumente essa bendita fraternidade entre nós, que nos ajudemos mutuamente, que sejamos para os outros verdadeiros irmãos, que sintamos a responsabilidade pela salvação dos outros.
Depois de tantos profetas passearem diante de nós e falarem para nós do Cristo, pudemos encontrar-nos com ele. Esse deve ter sido o ano de muitas conversões, de muitos encontros com Cristo. Como não alegrar-nos profundamente? Cristo nasceu para que nós também pudéssemos nascer à vida sobrenatural. O nosso caminho está feito, dorme numa manjedoura, é só segui-lo. Quem procura estar atento à voz do Bom Pastor, que é Jesus Cristo, pode esperar a bem-aventurança eterna, a felicidade, o céu. Mas não irá sozinho, chegará à Pátria celeste acompanhado de uma multidão de bem-aventurados.
Feliz ano novo!
Pe. Françoá Costa