Homilia do Mons. José Maria – XII Domingo do Tempo Comum – Ano B

Tempestade Acalmada

No Evangelho (Mc 4, 35-41) São Marcos narra que Jesus estava com os Apóstolos na barca e aproveitou esses momentos para descansar, depois de um dia particularmente intenso de pregação. Era noite. Jesus dormia. Quando ninguém esperava, começou uma ventania muito forte e as ondas se lançavam dentro da barca, ficando quase cheia de água. Cheios de medo, os discípulos acordaram Jesus, que com uma simples ordem acalma aquele temporal. Gritaram: Mestre, estamos perecendo e tu não te importas? E Jesus: “Silêncio! Cala-te!”. O vento cessou e houve uma grande calmaria. Jesus ameaça o vento e ordena ao mar que se acalme, interpelando-o como se ele se identificasse com o poder diabólico. Com efeito, segundo o que nos dizem o texto do Livro de Jó 38, 1. 8-11 e o Salmo 106 (107), na Bíblia o mar é considerado um elemento ameaçador, caótico e potencialmente destruidor, que somente Deus, o Criador, pode dominar, governar e acalmar.

O gesto solene de acalmar o mar tempestuoso é claramente um sinal do senhorio de Cristo sobre os poderes negativos e leva a pensar na sua divindade: “Quem é Este – interrogaram-se admirados e cheios de terror os discípulos – a Quem até o vento e o mar obedecem?” (Mc 4, 41).

Às vezes, a tempestade está em nosso coração. O mar de Tiberíades era pequeno, apenas um lago, contudo lá se armou uma grande tempestade! Tentações, desânimos, rebeliões: tudo parece abater-se sobre nós. Salvai-me, ó Deus, porque as águas me vão submergir (Sl 69, 2). É o momento de despertar a fé que o Evangelho nos propõe: Por que sois tão medrosos? Ainda não tendes fé? É o momento de despertar Jesus que dorme em nossa mesma barca e dizer-lhe: “Senhor, não te importas que esteja para afundar?”. Procurar o diálogo com Ele na oração; procura-lo a qualquer custo. Hoje, Ele também espera este grito para se levantar e agraciar-nos a nós e a sua Igreja com aquela grande bonança que não significa o fim de toda dificuldade e de toda contradição, mas antes a paz e a certeza também no meio das contradições.

O Senhor nunca nos deixará sós. Devemos aproximar-nos dele e dize-lhe a todo momento, com a confiança de quem o tomou por Mestre, de quem quer segui-lo sem nenhuma condição: Senhor, não me largues! E passaremos as tribulações junto dele, e as tempestades deixarão de inquietar-nos.

Ensina São Josemaria Escrivá: “Se tiveres presença de Deus, por cima da tempestade que ensurdece, brilhará sempre o sol no teu olhar; e por baixo das ondas tumultuosas e devastadoras, reinarão na tua alma a calma e a serenidade” (Forja, 343).

As tribulações, as tempestades…, devemos aproveitá-las para purificar a intenção, para estarmos mais unidos ao Mestre, para nos fortalecermos na fé. Recorda-nos Santo Agostinho: “Cristão, na tua nave dorme Cristo, desperta-o, que Ele admoestará a tempestade e far-se-á a calma”. Tudo é para nosso proveito e para o bem das almas. Por isso, basta-nos estar na companhia do Senhor para nos sentirmos seguros. A inquietação, o medo e a covardia nascem quando a nossa oração murcha. Deus sabe bem tudo o que se passa conosco. E se for necessário, admoestará os ventos e o mar, e far-se-á uma grande bonança. E também nós ficaremos maravilhados, como os Apóstolos.

“O episódio da tempestade acalmada, cuja recordação deve ter devolvido muitas vezes a serenidade aos Apóstolos no meio das suas lutas e das dificuldades, serve também a cada alma para nunca perder o ponto de mira sobrenatural: a vida do cristão é comparável a uma barca: Assim como a nave que atravessa o mar, comenta Santo Afonso Maria de Ligório, está sujeita a milhares de perigos, corsários, incêndios, escolhos e tempestades, assim o homem se vê assaltado na vida por milhares de perigos, de tentações, ocasiões de pecar, escândalos, ou maus conselhos dos homens, respeitos humanos e sobretudo pelas paixões desordenadas. Não por isto há que desconfiar nem desesperar-se. Pelo contrário, quando alguém se vê assaltado por uma paixão incontrolada, ponha os meios humanos para evitar as ocasiões e apoie-se em Deus: no furor da tempestade não deixa o marinheiro de olhar para a estrela cuja claridade o terá de guiar para o porto. De igual modo nesta vida temos sempre de ter os olhos fixos em Deus, que é o Único que nos há de livrar de tais perigos”.

Jesus recriminou os discípulos de terem uma fé pequena, porque não acreditavam que Ele era uma garantia suficiente em qualquer situação. E a fé espanta o medo. Os discípulos tinham alguma fé – gritaram -, mas era ainda fraca. Nós, às vezes cremos, mas não totalmente; esperamos auxílio do Alto, mas duvidamos que seja completo. Queremos soluções do nosso modo e ao nosso tempo. Confiemos: Deus não se deixa vencer em generosidade. Muitas vezes parece dormir para que seus fiéis exercitem a paciência e acudam com a oração confiante.

Busquemos mais a Deus! Não esperamos nós por Deus, é Deus quem nos espera constantemente. Espera-nos no Sacramento da Confissão. Espera-nos na Hóstia Sagrada  (Eucaristia). Espera-nos na oração.

É verdade, o Senhor pede muita fé, muita esperança, muito amor, muita confiança, muita correspondência à Graça. Ser discípulo é acompanhar Jesus, é estar sempre com Jesus e saber que Ele está conosco. Importa abandonar-se, confiar que Ele está no barco de nossa vida.  

A Santíssima Virgem não nos abandona em nenhum momento: “Se se levantarem os ventos das tentações, diz São Bernardo, olha para a estrela, chama por Maria. Não te extraviarás se a segues, não desesperarás se lhe rogas, não te perderás se nela pensas. Se ela te sustenta, não cairás; se te protege, nada terás a temer; se te guia, não te fatigarás; se te ampara, chegarás ao porto”.

 

Mons. José Maria Pereira

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